zach 21/03/2022
Eu me senti genuinamente traída
Queria dizer que esse é meu primeiro rodeio com livros dark ou até lendo as coisas da Seven Rue, mas não é. O que me atraiu no conteúdo que ela escreve é essa dissecação de temas que causam espanto e como ela o usa como ferramenta para fluir a história, não como uma muleta para causar impacto. E eu senti isso nesse livro, até certo ponto.
Primeiro, a gente tem que começar pelo próprio título do livro que remete ao canibalismo (coisa que praticamente não existe dentro do livro) e a selvageria; segundo, como essa mesma selvageria é utilizada pela autora como um pretexto da liberdade das amarras sociais. O enredo é bem simples: dois irmãos vão morar na floresta, com o pai - que já morava lá previamente, porque eles acreditam que a sociedade não é para eles e eles apenas conseguem viver em um ambiente selvagem. Veja bem, é aqui que começa a história. O viver seria agir de forma fiel ao seu self mais verdadeiro e por isso que a cidade que eles moram nunca seria capaz de se adaptar a eles e, nem eles a ela. E por isso, na cabeça desses dois irmãos, caçar, comer animais crus e desejar sexualmente um ao outro faria “sentido”.
Agora o que me incomodou: a autora ficou com medo de trilhar o caminho que ela apontou. Em determinado momento do livro, você fica esperando um parricídio, mas ganha uma terapia fuleira e alguns distúrbios de humor e personalidade. Três capítulos depois e uma prescrição médica para remédios de tarja preta, nós temos um final feliz. Eu, leitora que leu trezentas páginas de fetiches absurdos, consumo de carne crua, sangue e uma voz na cabeça do Fennec que faz esquizofrenia parecer brincadeira de criança, ganhou um final com uma casinha na floresta e cachorros.
A autora faz todo um percurso abordando temas de forma crua (e algumas vezes extremamente sensual, tenho que dar crédito por isso), mas fica com medo de se comprometer com o enredo. Como leitora, eu percebi que ela ficou com medo de “passar do limite”, mas alguém esqueceu de avisar ela que o limite já estava a perder de vista no segundo capítulo. Outra coisa que me ferveu em ódio foi como ela trata esses distúrbios psicológicos que aparecem como uma “desculpa” para o comportamento dos protagonistas. A gravidade das doenças mentais apresentadas não seria resolvida de forma tão simples e precisariam de acompanhamento - psicológico, psiquiátrico e de medicação - pelo resto da vida desses indivíduos.
Minha conclusão é que esse livro não vale realmente a pena, porque vai te irritar mais do que horrorizar. Mas, a escrita da Seven Rue é envolvente, pelo menos esse crédito preciso dar.