Montenegro, J. A. 14/04/2024
A alegórica realidade de Alice
Alice ?
?Comece pelo começo? e prossiga até chegar ao fim; então pare.???frase do livro
A obra clássica de Lewis Carroll, se traduz numa profunda e intrigante viagem ao mundo repleto de fantasias, delírios e questionamentos. É a expansão de um universo completamente desconhecido aos aventureiros que, assim como Alice, precisam aceitar a lógica, ou falta dela, que os parâmetros da realidade não fazem sentido algum nos sonhos. E de fato, são neles onde tudo deverá ser naturalmente aceito, e não por isso, excluindo os questionamentos da realidade. Sendo assim, nada deveria fazer sentido para que estes eventos de fato acontecessem, pois não é um mundo de verdade absoluta, onde deveria ter explicação para tudo que nele existe.
O título original Alice's Adventures Under Ground, ou em tradução direta, Aventuras de Alice no Submundo, nos explica o quão profundo o autor pretende ir com a história. Posteriormente, tendo seu título substituído pelo sugestivo: Aventuras de Alice no País das Maravilhas.
É por uma toca de coelho a um poço muito fundo, ou talvez, com ausência de fundo, como pareceu para Alice, onde despencava ?caindo, caindo, caindo? que ela começa a sua aventura. E esta queda não termina ?nunca?. O que nos faz lembrar quando caímos da cama sem nunca ter saído dela, mas temos a sensação de queda. Assim, foi para Alice ao cair naquele poço. Durante a queda, aparentemente sem fim, a personagem não demonstra medo da morte, como sendo o primeiro pensamento que surgiria na mente de um adulto. A sua única preocupação era ter a companhia de sua gatinha Dinah, para descobrir o que haveria no fundo daquele abismo escuro.
Durante toda a aventura Alice precisa crescer e diminuir para encaixar-se em algo, seja para atravessar ou ganhar confiança. Mostrando angústia devido as mudanças constantes, pois ela nunca sabe quando deve ser grande ou pequena, se está ou não do tamanho apropriado para determinada situação. Ora é grande demais ora muito pequena. E isto nos parece comum quando estamos saindo da infância para adolescência e da adolescência para vida adulta. Esticamos e diminuímos ao longo da nossa jornada. Essas mudanças são confusas para Alice e a fazem questionar-se, durante essa sua inexplicável jornada, se por acaso continuava a mesma de antes, chegando à conclusão de que era mais provável que tenha sido trocada por alguém, pois em algum momento questiona do porquê ela não consegue mais se reconhecer. Contudo, procura certifica-se se por acaso esse ?novo eu? é alguém que ela conheça na superfície, pois, assim poderia decidir se gostava ou não dessa nova pessoa que por algum motivo se tornara. Quando a Lagarta a pergunta ?De que tamanho você quer ser?? Alice responde ?Oh, não faço questão de um tamanho certo?, e continua, ?só que ninguém gosta de ficar mudando toda hora, sabe??. São os conflitos de personalidade que Alice só deveria experimentar quando estivesse passando pela adolescência, o que é para nós mais comum, sendo sempre algo confuso, mas impossível de evitar. Ainda no diálogo com a Lagarta ela afirma ?Como gostaria que as criaturas não se ofendessem tão facilmente!?. Além da sua própria personalidade instável também precisa lidar com a personalidade sensível das criaturas quando decide perguntá-las algo. A resposta da Lagarta não poderia ser mais simples e precisa ?Com o tempo você se acostuma?.
Na sua trilha, Alice encontra-se com o Gato de Cheshire e o pergunta que caminho ele a aconselharia seguir, pois na tentativa de sair dali se deparou com uma bifurcação. Desta forma, ele a explica ?Depende bastante de para onde quer ir?. Alice o responde ?Não me importa muito para onde, (...) contanto que chegue em algum lugar?. Assim como Alice passamos por fases na vida em que não sabemos muito bem que rumo seguir, onde o futuro torna-se imprevisível e incerto, quando não temos sabedoria suficiente para tornar o caminho óbvio, só queremos chegar no final do nosso destino. Sendo a resposta do Gato a mais simples e cruel possível ?Então não importa que caminho tome? certamente vai conseguir chegar aonde desejas, ?em algum lugar?. E desta forma, Alice começa a compreender que carrega consigo um pouco da loucura daquele lugar, e se confunde com ele e com suas criaturas, pois não será possível ser mais quem ela era. Na sua própria reflexão ele afirma ?mas não adianta voltar a ontem, porque eu era uma pessoa diferente?. Não podemos voltar no tempo, e até mesmo nos nossos sonhos nos tornamos pessoas diferentes, nos tornamos loucos e um pouco diferentes do que éramos ontem.
Assim como a irmã de Alice temos a percepção que aquele relato poderia ser apenas de um sonho de uma garotinha em crescimento, e que de olhos fechados quase seriamos capazes de alcançar o País das Maravilhas, contudo ?(...) bastaria abri-los e tudo se transformaria em insípida realidade...? pois ?que mais é viver senão sonhar??. ?
As duas histórias de Lewis Carrol, desta coletânea, vão tratar-se de transformação, solidão e solitude. E é em: Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá, onde percebemos a inquietude da infância quando não se tem muito claro quais são as suas obrigações na sociedade. E como as punições podem moldar o caráter de alguém. Os castigos cruéis para as crianças são experimentos da vida adulta. Até mesmo no mundo dos sonhos existe leis, mesmo que sejam um reflexo de outro mundo.
Aventuras de Alice no País das Maravilhas
Nota: ????????
Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá
Nota: ????
Autor: Lewis Carrol (Charles Lutwidge Dodgson)
Inclui ilustrações originais de John Tenniel
Editora: Clássicos Zahar (pockets)
Tradução: Maria Luiza X. de A. Borges
Edição: 27? reimpressão