Toni 03/03/2022
Leituras de 2022 | Cortesia da editora
Revolta e protesto na poesia brasileira
André Seffrin (Org.)
Nova Fronteira, 2021, 160 pág.
De Gregório de Matos à Angélica Freitas, da crítica social à sátira política, das mãos calejadas pela seca ao enfado existencial de uma elite farsesca – a poesia brasileira assume muitas formas e assuntos nesta coletânea organizada por André Seffrin. A partir de um recorte bastante amplo (temporal e geográfico), 5 séculos de Brasil são atravessados para contar a leitoras e leitores uma história de inúmeras opressões e injustiças, de classes privilegiadas e da exploração desumanizadora de recursos e gentes. Uma poesia que não se cala e reverbera, no presente, misérias estruturais perfeitamente visíveis hoje.
Às vezes recorrendo ao humor e à ironia, às vezes desfazendo-se em dor, os poemas aqui reunidos falam de escravidão e abolicionismo, da luta pelos direitos das mulheres e da corrupção que rapina a riqueza do povo, de autoritarismos e revoluções. Há, naturalmente, espaço para contestarmos certos acréscimos e algumas omissões, como as ausências, por ex., de Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Lívia Nathália, Eliane Marques, Micheliny Verunschk, Lubi Prates… (a lista é infinita). É certo que incompletude é a sina de toda coletânea e representatividade seu eterno ponto fraco—mas considero importante apontar o óbvio. A despeito deste reclame, o livro proporciona resgates importantes e inusitados, como é o caso da poesia de Nísia Floresta Brasileira Augusta e do cordelista paraibano Francisco das Chagas Batista, entre tantos outros e tantas outras.
Para cada grupo de poemas, um verbete biográfico apresenta autoras e autores, contextualizando, quando necessário, suas produções literárias e proporcionando uma experiência de leitura mais rica. Em tempos de constante ameaça à democracia como estes em que temos vivido, reaproximarmo-nos de uma poesia de revolta e protesto é uma maneira de entrar em contato com inúmeras formas de descontentamento nacional. Não surpreende, portanto, que um grito cansado ganhe novo folêgo a cada poema lido: transformador, sim, porque vivo, nosso e em ano de eleição presidencial.