Isadora1232 04/06/2023"Sempre tive dificuldade de escrever sobre mim. Escrever sempre foi uma fuga de mim mesma, afastar-me o quanto possível de mim. Nunca entendi também por que escrevo e me interesso tanto pelas palavras. Talvez a vida estivesse leve, lenta demais até então. Talvez, eu não sei, nunca tenha tido essa sensação tão próxima de um abismo. Um abismo feliz, cheio de braços para me pegarem no ar. Braços proibidos".
Assim somos convidados a conhecer o abismo dessa personagem, que vem em forma de diário, tal como as memórias se revelam em nós - de modo desordenado, caótico, uma por uma, e nos torna quem somos.
A protagonista é uma mulher que, após ver seus três filhos criados, decide iniciar um curso de filosofia, o que de certo modo vai balançar sua vida de cabeça pra baixo. A narrativa segue um tom altamente filosófico, aplicando principalmente a teoria dos afetos do Spinoza - afinal, o que no outro nos afeta?
Até então sufocada pelo não-dito, ela vai se conhecendo, e compartilhando com o leitor reflexões sobre a vida, identidade e o amor.
Clarice Lispector, na crônica "as três experiências" - a mesma em que coloca que a palavra é seu domínio sobre o mundo - afirma que nasceu para escrever, para amar os outros e criar seus filhos. "Quando eu ficar sozinha, estarei seguindo o destino de todas as mulheres".
Foi esse texto que inspirou o livro e a influência da Clarice é notada por toda a narrativa. A escrita da Lilian é linda e me arrebatou. Espero ver muito mais do trabalho dela, que com certeza tem muito potencial!
Pra quem é fã de Clarice, e gosta de fritar o cabeção durante a leitura, com linhas cheias de metáforas e filosofia, "o destino de todas as mulheres" é um achado!
Sem falar na capa linda, assinada pela Monique Malcher, e a edição que tá impecável!