spoiler visualizarMarcos774 20/07/2024
“A Cartomante” de Machado de Assis
A Cartomante é um conto bem conhecido de Machado de Assis e está presente em Várias Histórias (1896). Alguns pontos do conto podem ser destacados. A narração é realizada em 3ª pessoa por um narrador onisciente, assim como na introdução do conto apresentam-se Rita e Camilo através de diálogo. Psicologicamente, Rita é crédula com cartomantes, ao passo que Camilo é cético, ainda que, após receber uma carta, consulte a cartomante. E há ironia na personagem cartomante no sentido de zombaria, visto que “Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo.”, porém o “nada aconteceria” revelou-se um erro no desfecho.
Outro ponto é a temática de adultério e amizade. É curioso notar que em ambas as narrativas, A Cartomante e a obra-prima Dom Casmurro, existe um triângulo amoroso: um homem casado com uma mulher que o trai com um amigo do marido. No primeiro caso, Vilela e Camilo são amigos e Rita trai Vilela com Camilo, traição essa explícita na história. No segundo caso, Bentinho faz amizade com Escobar no seminário de padres e, segundo o ponto de vista de Bentinho, Capitu, sua esposa, o trai com Escobar. Isso sugere que essa temática era significativa para o autor.
Por fim, o conto se inicia com “Hamlet observa a Horácio que há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia”. Essa frase, comumente mal traduzida com “sua vã filosofia”, estabelece intertextualidade com a frase original “There are more things in heaven and earth, Horatio, than are dreamt of in your philosophy.” (Ato 1, Cena V). Quando Camilo, após receber a carta, se sente inquieto e nervoso, o narrador diz “e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: ‘Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia...’” É interessante notar o uso da ideia shakesperiana repercutida internacionalmente na construção do cético personagem Camilo com um conflito interno em relação a mistérios entre o céu e a terra cridos por Rita. “Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita coisa misteriosa e verdadeira neste mundo.”