R...... 17/07/2017
Edição L&PM Pocket (2003)
A primeira coletânea de contos de Machado de Assis, entregue ao público em 1870 com sete histórias. A edição que li tem texto de apresentação de Maria Tereza Faria e Roger Rouffiax. Nem imagino quem sejam mas gostei das considerações. As histórias são extensas, o narrador não é tão sagaz e há influências do romantismo em situações e frases afetadas - pontos ressaltados na apresentação pela dupla. Mesmo assim, os contos pioneiros de Machado são diferenciados e estão longe do melodrama. Outro aspecto citado, coisa que não conhecia, é que o autor era gago e teria sofrido de epilepsia.
Ah, no epíteto que deram ao escritor, coisa besta de intelectuais que nem sempre engulo, acho horrível o tal "Bruxo do Cosme Velho".
Hoje dei uma conferida em "Miss Dollar". É o primeiro conto na organização do livro, mas minha motivação foi por acreditar que tinha uma adaptação em quadrinhos em meu acervo. Tenho o costume de conferir o texto integral e passar para a HQ quando possível. Me enganei e a lembrança que tinha da história era de uma animação que conheci na TV Escola (disponibilizada no YouTube também). Curioso que curti o vídeo, mas a leitura não empolgou. Mostra um desenlace romântico inusitado e forçoso, onde a conveniência e aparência selam o destino, vindo dessa aceitação a felicidade. Miss Dollar é uma história romântica sem ser romântica. Coisa do padrão machadiano, apegado ao realismo e avesso à dramas melosos em devaneios. A relevância de Miss Dollar é o fato de ter sido o elo de apresentação para as personagens. Ué! não tinha registrado que é uma belíssima cadelinha?
Em 22/07/17
"Luís Soares" é mais um dos contos de revelação da sordidez velada na sociedade. Mostra um malandro acostumado à vida de parasita, decorrente da herança do pai, mas a renda acaba e ele se põe a bajular um velho tio de olho na herança. Até começa a trabalhar, com a maior pose de homem responsável. Nesse interim uma prima se apaixona por ele, mas tem herança curta que para o malandro renderia apenas um ano. Pobre da apaixonada moça rejeitada... Reviravoltas e ela herda uma fortuna, o que provoca a cobiça do Soares. Ah, mas a moça não é Clara dos Anjos para cair em lábia interesseira e sai fora do falso amor. Voltemos ao Machado, que genialmente critica os interesses egoístas, as falsas amizades e a falta de caráter. Ah, a história não acaba por aqui. Gostei!
Em 23/07/17
"A mulher de preto" - Machado é essencialmente o narrador descritivo de outro desenlace amoroso. É uma história de amor, novamente diferenciada. O lance não é a construção amorosa, mas a desconstrução de um pretenso enlace em respeito à amizade. Foi o que entendi.
Dois amigos, com visões específicas sobre o amor, estão numa situação em que um deles se apaixona por certa viúva, mas depois descobre que é a esposa do outro, injustiçada e apaixonada pelo marido. Em nome da amizade e respeito, vemos a ajuda na reconstrução de um abalado matrimônio, rejuvenescido com nova disposição.
O conto é um pouco longo, como todos dessa coletânea. Não me empolgou devido o autor se limitar apenas à descrição. Não é aquele Machado sagaz e irônico em interessantes observações, apenas o formal narrador.
Em 24/07/17
"O segredo de Augusta" aguçou a curiosidade e a leitura prazerosamente ocorreu em um estalo. Nas entrelinhas, o autor mostra interesses egoístas comuns nos enlaces matrimoniais da época. Várias máscaras caem. Augusta é uma bela balzaquiana que rivaliza com a filha de quinze anos (Adelaide) em beleza e jovialidade. Vive na futilidade do luxo e tem uma relação fria com o esposo e filha. Na falência dos negócios familiares, Vasconcelos (o esposo) tenta "empurrar" a filha para um casamento por interesses com rico pretendente, mas tem a surpreendente oposição da esposa. Revelações curiosas em relação ao pretendente e à oposição de Augusta - relacionados à mentira, busca de um golpe do baú e apego à vaidade da jovialidade, que seria abalada pela chegada de netos no início dos trinta. Esse Machado...
"Confissões de uma viúva moça" traz uma jovem viúva (Eugênia) contando sua desventura amorosa para uma amiga. No casamento era infeliz e tem um caso extraconjugal com o sedutor Emílio, dono de muita lábia e sedução. O esposo falece e o tal "Don Juan", vendo que seu caso poderia evoluir para casamento, trata de dar no pé, restando à viúva o arrependimento da traição. É isso.
Uma pequena observação, que provavelmente não signifique nada. Quando ela começa a contar sua história (no capítulo II) usa uma frase que me soou reconhecível em algum lugar (Era no tempo de meu marido). Ah, "Memórias de um sargento de Milícias" (Era no tempo do rei). Uma não tem nada de mais com a outra, mas certamente iniciam relatos de desventuras. Caricata em Manuel Antônio de Almeida e funesta em Assis. Algo bobo que me veio na leitura e quis registrar, ainda que sem valor.
"Linha reta e linha curva" não me empolgou e é desnecessariamente extenso (o mais longo do livro). Basicamente é sobre amigos, vendo-se um casal apaixonado e outro que se conhece, afasta-se e reata, com uma caracterização inicial de vanglória no solteirismo. Por aí... Achei tão chato que não prestei muita atenção.
"Frei Simão" é o último e lembra "O seminarista" de Bernardo Guimarães. O frei morre odiando a humanidade e depois sua história é revelada em suas anotações. Veja se não tenho razão... Um amor de infância (Helena) por moça criada pelos pais; imposição para o estudo sacerdotal; casamento forçado e em segredo da moça por vontade dos pais de Simão; informação falsa de seu falecimento; resignação e entrega do jovem para o sacerdócio; reencontro com a jovem à beira da morte; desespero e raiva contra as imposições e injustiças sofridas. Ah, diz aí se não lembra "O Seminarista"... Oras, se não! Será que o Machado tinha lido recentemente...
Ah, tenho uma surpresa! "O Seminarista" é de 1872 e "Contos Fluminenses" de 1870...
Fim da leitura.