Angélica 19/03/2012Doença e Cura O vampirismo sempre foi um tema popular, mas desde o surgimento da saga Crepúsculo temos presenciado um verdadeiro “boom” dos filhos da noite ao redor do mundo, principalmente na literatura. Românticos, assustadores, sensuais ou cruéis – há vampiros de todos os tipos, e para todos os gostos. Ao vermos uma reutilização tão constante de um mesmo assunto, fica difícil não nos perguntarmos se ainda é possível criar algo de original ou inovador a partir de um tema tão batido. Mas se depender do gaúcho Fabian Balbinot, a resposta é um sonoro “sim”. Seu romance de estreia, “Doença e Cura”, coloca os todo-poderosos seres da noite em uma situação delicada: e se ao invés de caçadores, estes autoproclamados donos do mundo se tornassem a caça?
O livro é na verdade uma coletânea de contos, que se passam em um mesmo universo e giram ao redor de uma trama central: o surgimento de uma nova espécie, capaz de disseminar uma doença que faz com que todo o sangue ingerido pelos vampiros “escape” de seus corpos enquanto dormem, além de degradar pouco a pouco seus dons sobrenaturais, levando-os enfim a uma morte dolorosa e desesperada. Assim sendo, cada conto desenvolve duas linhas narrativas: A sua própria, que termina ao fim do capítulo, e a história central do livro, cujos detalhes nós vamos conhecendo pouco a pouco, de acordo com as informações que colecionamos em cada conto.
E falando em narrativa, eu não poderia deixar de elogiar a escrita do livro, que é um dos principais motivos que o tornam tão original. Cada conto é narrado de uma maneira diferente, de modo que dentro de um mesmo livro encontramos diversos estilos narrativos: há o convencional narrador em terceira pessoa, um capítulo em forma de diário (uma homenagem a “Drácula”, talvez?), um em forma de peça de teatro, um em que o narrador se dirige diretamente às personagens, nos passando a impressão de que estamos escondidos a escutar uma conversa... Enfim, a criatividade de Fabian para encontrar novas formas de contar histórias é surpreendente.
Cada capítulo é iniciado pelo trecho de uma música, sendo que as canções escolhidas pertencem a diversos estilos. É interessante ver como estes trechos ganham novos significados ao serem destacados de seu contexto original e aplicados aos contos – me lembro em especial de um trecho de uma música romântica do grupo Skank, que ganhou um sentido completamente novo no capítulo em que apareceu.
Outra coisa que me chamou a atenção foi a capacidade descritiva do autor, que ajuda – e muito – na imersão do leitor dentro da obra. A descrição das localidades, das sensações e reações das personagens é muito bem feita, de modo que em certos momentos nos sentimos como se estivéssemos realmente dentro da história, observando tudo de perto.
Li em alguns lugares opiniões de leitores que diziam ter achado o vocabulário do livro um pouco complexo. Eu, pessoalmente, não tive essa dificuldade. O autor utiliza algumas palavras mais cultas ou pouco usuais aqui e ali, mas nada que chegue a dificultar a leitura.
As personagens que permeiam estas histórias são todas muito interessantes e difíceis de esquecer. Este mérito torna-se ainda maior se levarmos em conta o fato de que, em todo o livro, não há uma personagem sequer que possua nome próprio. Os vampiros de Balbinot são predadores cruéis e poderosos, porém cheios dos mais diversos sentimentos, falhas e comportamentos contraditórios, o que facilita muito a empatia entre leitor e personagens: Por mais monstruosos que sejam, os sugadores de sangue agem de maneira extremamente humana.
Ao levarmos em conta todos estes pontos positivos, chegamos à conclusão de que a leitura de “Doença e Cura” não pode ser nada além de agradável, não é? Mas acontece que este não é bem o caso – o que, por mais contraditório que pareça, é outra qualidade deste livro, já que se trata de uma história de terror. Com o passar de cada capítulo, somos envolvidos cada vez mais por uma sensação de sufocamento e desespero, sem saber se os vampiros serão ou não capazes de resistir ao ataque desta nova forma de vida. Some a isso cenas sangrentas e cruéis, e o fato de o autor não poupar nem as personagens mais importantes ou simpáticas do sofrimento, e o resultado é uma verdadeira “leitura masoquista”: por mais mal-estar que ela cause, o leitor não resiste ao impulso de seguir em frente para descobrir o que irá acontecer.
Concluindo, recomendo sem pestanejar a leitura a todos os fãs de literatura de suspense/terror, mesmo para aqueles que não simpatizam com vampiros. E fico na torcida para que novos livros saiam da mente de Fabian Balbinot, tão ou até mais interessantes do que este, =).