spoiler visualizarSilvia Andrade 17/02/2011
“Nas tuas mãos” é uma narrativa de memória, a vida de três mulheres apresentada em forma de diário, álbum de fotografias e cartas. Jenny, Camila e Natália não estão ligadas apenas pelo laço familiar, mas também pelas características da época de cada uma delas. A primeira, em seu diário, escreve sobre sua vida de mulher casada na época da Segunda Grande Guerra; a segunda conta, através de suas fotografias, sua vida na época da ditadura Salazarista; a terceira, através de suas cartas, relata suas angústias e alegrias vivendo em Lisboa contemporânea.
Através da história íntima da avó, da mãe e da filha, a narrativa conduz o leitor à história de Portugal do século XX. Por meio das três gerações, Inês Pedrosa apresenta o relato de cada uma delas em dez capítulos. As abordagens e as preocupações correspondem, de fato, aos temas da geração a que cada uma pertence.
A primeira geração das mulheres dessa família é representada por Jenny que, nas primeiras décadas do século XX, casa-se com um homossexual. A mulher tolera uma relação de fachada, encobrindo a preferência sexual do marido. Enquanto Jenny submete-se a essa situação, protege seu marido de sofrer possível hostilização social.
Camila representa uma nova etapa. A geração dessa mulher é fruto de uma ditadura salazarista e, impressionantemente, o perfil da vida emocional da personagem é um paralelo com sua vida política. Camila representa a mulher que vive a solidão, em estado de tristeza e melancolia, assim como muitas outras pessoas em Lisboa dessa época: viúvas de soldados, mães que perderam seus filhos, crianças que perderam seus pais... tudo fruto de uma ditadura. Por isso, Camila passa a observar as pessoas e os lugares através de uma lente de máquina fotográfica, pois ,segundo ela ,o ato de fotografar tornara-se uma obsessão quando a verdade deixou de existir para além da imobilidade das imagens. Camila torna-se uma mulher dura e triste devido as torturas que sofreu, nem um sorriso é capaz de manifestar-se no seu rosto. Essa tristeza é explicada de forma bem direta em seu álbum:
“ é estranho porque não gosto de sorrisos... sorriram-me com promessas... depois irritaram-se e começaram a sorrir-me com ameaças...”
Por último há Natália, personagem que representa a terceira geração. Natália é a personificação de nossa atualidade, o mundo contemporâneo em que o dinheiro transforma-se na mola propulsora da sociedade, através de transações capitalista e tecnológicas. A sociedade da geração de Natália surge como um tempo em que as relações são mantidas à distância, em que filhos se relacionam pouco com seus pais, sociedade em que as pessoas sentem-se, apesar das várias informações e relacionamentos virtuais, vazias e solitárias.
“Nas tuas mãos” é a narrativa de três mulheres que se descobrem fortes, é uma história onde as que ainda vivem (Camila e Natália) podem reconstruir sua convivência, a partir das experiências de vida de Jenny, um elo formador e revelador entre Camila e Natália.