Quincas Borba 31/08/2024
"E assim nós prosseguimos,
Barcos contra a corrente, empurrados incessantemente de volta ao passado."
"O Grande Gatsby" é um romance publicado em 1925 escrito por Francis Scott Keys Fitzgerald. A história se passa na costa leste dos Estados Unidos durante os Roaring Twenties (os loucos anos vinte, apelidados de "Era do Jazz" pelo próprio autor do livro), onde acompanhamos o amor impossível entre o recém rico Jay Gatsby com uma mulher casada com quem ele havia se envolvido anos antes. Mais que isso, a história aprofunda as emoções humanas e o mito do "American Dream".
Esse é um dos livros mais lindos que eu já tive o prazer de ler; não apenas nos temas, mas principalmente na escolha das palavras. Fitzgerald é um mestre escrevendo prosa (por mais que a tradução que eu li tenha deixado a desejar), seja descrevendo a grande mansão vazia de Gatsby ou o seu amor efervescente por Daisy; ele junta descrições de lugares e os dá sentimentos, que se misturam aos de suas personagens. Nunca tinha lido algo tão bonito desde Flaubert! É como se fosse um poema em prosa! É algo lindo de ser experimentar, principalmente se você consegue entender inglês, mesmo que seja só um pouco. Além de uma capacidade descritiva absurda, Fitzgerald consegue criar símbolos e temas que vão se entrelaçando com o ambiente e aqueles que vivem nele: desde a icônica luz verde que hipnotiza Gatsby até o vale de chamas entre Nova York e Long Island.
Existem várias maneiras de enxergar "O Grande Gatsby", mas creio que existam algumas mais populares e que eu, pelo menos, adoro: a primeira é a relação entre personagens; principalmente entre Gatsby e Daisy. Não é uma relação linda, tal qual Cathy e Heathcliff, está fadada desde o começo a falhar. A diferença é que Cathy e Heathcliff são ruins um para o outro por serem tóxicos demais, enquanto o sentimento que temos no final da obra é que Gatsby amou mais Daisy do que ela merecia. Pode enxergar o amor de Gatsby como quiser: seja como um amor genuíno ou um simples desejo para que ele possa finalmente ascender socialmente, mas o fato é que ele a amava ardentemente e não tinha dúvidas, enquanto ela nem sabia ao certo se existia ou não. É um amor trágico de um lado só que redime todas as vicissitudes de Gatsby que o narrador nos conta.
A segunda vai além dos personagens em si e o que eles representam. É bem explícito o simbolismo de Daisy como uma representação do sonho americano; a divisão entre os Buchanan, que representam a velha aristocracia americana, no East Egg e Gatsby, sendo um novo rico sem conexões ou passado respeitáveis, no West Egg; os olhos do Dr. T. J. Eckleburg; até o próprio narrador do livro, Nick Carraway, como uma persona do autor, ainda mais nas últimas páginas. "O Grande Gatsby" é uma denúncia de Fitzgerald ao estabilishment da década de 20 nos EUA, que por mais que tivessem luxúria e dinheiro e eram cheios de bens materiais, eram vazios por dentro e buscavam desesperadamente sentir alegria sem mover-se de onde estava. A corrupção moral está em todos os personagens, incluindo o narrador que se auto intitula a pessoa mais honesta que ele conhece; conhecendo bem os outros personagens, pode ser muito bem verdade.
"Mostre-me um herói e eu escreverei uma tragédia para ti", teria dito (supostamente) F. Scott Fitzgerald. Por mais que "O Grande Gatsby" fosse esquecido em seus dias, ele estava mais que certo no que viria. Cinco anos depois, o sonho americano se revelaria ser feito de papel com a queda da bolsa de Nova York. A nação americana ficou sem chão, sem o dinheiro que antes tinham em abundância e sem virtudes que abandonaram há tempos. É uma tragédia da mais alta magnitude que afeta apenas um homem, mas que atinge o coração de milhões de pessoas até hoje. Não era um livro profético por mostrar o que aconteceria; é um livro realista porquê simplesmente mostrou o que estava acontecendo. E perceber que quase nada disso mudou, e apenas aumentou na verdade, é assombroso.
"Os trilhos fizeram uma curva e agora ele estava indo para longe do sol, que, enquanto se afundava, parecia se espalhar em benção sobre a cidade que desaparecia na qual ela respirara. Ele ergueu sua mão desesperadamente como se fosse para prender uma brisa do ar, salvar um fragmento do lugar que ela tornara tão amável para ele. Mas tudo estava indo tão rápido agora para seus olhos marejados e ele sabia que tinha perdido aquela parte de si, a mais fresca e a melhor, para sempre."
Recomendo!!