Illana2 01/03/2022
Ao malandrino Miguel de Merlim
Há muito o que dizer de Dom Quixote, de modo que peço desculpas a quem se atrever a ler esta resenha, nada singela (como às aventuras do bom fidalgo). Por mais, não posso eu ser sucinta a algo que considero de tanta estima.
Para começar, não compreendo como alguém possa dar menos que 5 estrelas para o livro. Não por ser um "clássico", mas sim pela real riqueza que o livro resguarda.
Ou seja, pouco me importam sua reputação e renome, se não me fosse atestado seu engenho (palavra essa que me apeguei após a leitura) no conteúdo do livro.
Para mais, não sei muito por onde começar para que aqui me entenda. Mas tentarei da melhor forma que posso:
Primeiramente, há de se tomar ciência que Dom Quixote possui 2 tomos (no original). O qual é o que aqui se trata minha resenha.
Deveras difícil de o ler, não por incompetência do escritor, mas sim pela distância que o lemos de quando este foi escrito, muito provável é que, além de demorar, pelo meio do caminho, pense-se muito em desistir pelos muitos fatores que se vão apresentando dificultosos à leitura. Dentre eles podemos citar os rifões, o palavreado, as citações e tudo o mais que da época eram comuns e bem sabidos.
Entretanto, te acalento aqui que perseveres na peleja desta leitura, pois breve é o momento em que você se acostumará com a escrita e logo te a tornará tão aprazível quanto todas as que teve até o momento!
Voltando, o livro possui tomos, escritos em anos diferentes, mas separados por acontecimentos na vida do autor que influenciam diretamente o segundo tomo do engenhoso fidalgo!
Por tanto, devemos analisar a narrativa do livro de forma separada entre o primeiro e segundo tomo.
O primeiro muito mais livre e "inocente", onde a narrativa de Dom Quixote encontra todo seu esplendor. Enquanto o segundo se debruça sobre um assunto pendente para Cervantes, que o escreve mais em uma tentativa de salvar seu personagem de um escritor malandrino e vilanesco que o tentara vituperar.
Portanto, basta a saber que, aquele Dom Quixote que nos entrou a todos no conhecimento coletivo, é o herói, de sua maneira, do primeiro tomo.
O interessante é observar que, quando Cervantes escreveu Dom Quixote (primeiro tomo), tinha clara e designa intenção de narrar as peripécias de um herói às avessas, que divertisse a quem lesse e amolasse a quem servisse. Visto que escolhera seu herói para galhofar uma certa classe de sua época.
Escolhera para tal um fidalgo, ex-nobre, numa Espanha em que estes títulos estavam em declínio e já não faziam sentido na conjuntura social da época. Ou seja, uma nobreza decadente.
E por herói, nosso bravo fidalgo, em profundo vitupério à realidade que o cercava, anseou e ousou rememorar os tempos onde seu título era nobre e insigne. Evocando portanto os tempos memoráveis da nobre cavalaria andante!
E assim, tomou as rédeas e decidiu sair-se ao mundo catando sua morta fidalguia.
No primeiro tomo, podemos ter por clara o tom jocoso e zomebeteiro de Cervantes. As aventuras que de tudo saíam às avessas do herói. A relação risível entre Fidalgo e Escudeiro. Aqui se encontra às claras as inicias intenções que tinham o autor.
Já no segundo livro, o feitiço vira contra o feiticeiro. É no segundo livro, segundo tomo, que para mim se torna melindrosa as intenções de Cervantes. Não entendo, pois, se o mesmo se arrependeu e decidiu dar outro rumo à história, ou se, como muitas vezes acontece, a força do herói e sua narrativa, mesmo que criado na mente de um, acabava se tornando maior e mais viva do que se pode controlar.
É no segundo livro que, para mim, Dom Quixite se torna um herói sonhador e não mais um louco anacrônico ao seu tempo.
O fim do livro, por incrível que pareça, o escritor deixa extensa sua intenção. E por isso digo que o feitiço se tornou contra ti, feiticeiro.
Pois aqui, Dom Quixote passa a ser senão a mais tenra flor da fidalguia e dos mentecaptos que tem a coragem de se atrever à desbravar o mundo com seu sonho, contra todos àqueles que a ele se escarneiam.
Pois aqui, malandrino e desleal Cervantes, é que perdes a causa. Tentando amofinar todos os livros de cavalaria, escreveu o melhor de todos os cavaleiros andantes! O mais nobre, liberal, fidalgo, justo e irresistível dos tais.
E assim, obrigada. Pois agora quero também eu pertencer à nobre casta da cavalaria andante!