Craotchky 08/03/2019Uma "não-resenha" de Dom Quixote(⚠ ATENÇÃO ⚠ Este é mais um texto no qual, sob pretexto de resenhar, acabo divagando sobre aspectos da vida de leitor sem falar quase nada do livro. Desculpe!)
Sou dessas pessoas que adoram fazer listas. Lembro que anos atrás fiz uma lista de livros que eu julgava prudente não ler num futuro próximo. O objetivo era deixar essas leituras para um eu-leitor com mais bagagem e maturidade literária. Na lista constavam grandes obras como: A divina comédia, A odisseia e a Ilíada, Ulisses, Paraíso perdido, Os miseráveis, Guerra e paz, Em busca do tempo perdido, e claro, Dom Quixote.
Minha opinião não mudou muito, ainda acho que a bagagem literária concede àquele que a detém uma espécie de capacidade mais apurada de apreensão de uma obra mais densa. Das duas uma: ou minha bagagem acumulada até aqui foi o suficiente ou Dom Quixote não é esse monstro de sete cabeças pois, embora exija maior grau de atenção, não achei tão difícil assim (imagino que a tradução tenha grande influência nestes livros canônicos).
Mudando completamente de assunto:
Sempre que vou começar uma nova leitura tenho por costume pesquisar sobre o livro que vou ler. Não obstante, inúmeras vezes leitoras(es) me expuseram a preferência por evitar qualquer informação sobre uma próxima leitura. Certa vez uma amiga me disse que não lia sequer as orelhas e contracapa dos livros. Da minha parte reconheço a validade de algumas boas razões para os leitores(as) adotarem tal postura, porém acho que o custo-benefício, por assim dizer, do meu hábito de pesquisar é mais vantajoso.
Sobretudo quando o livro em questão é um clássico mais antigo, a pesquisa prévia, a meu ver, é ainda mais indispensável. Por exemplo: imagino que ler Dom Quixote sem saber que este livro é uma paródia, uma sátira das famosas novelas de cavalaria tão em voga à época de Cervantes, significa assumir o risco de levar a história demasiadamente a sério, culminando numa apreciação deficiente.
Pois saiba: Cervantes detestava algumas características dos então populares romances de cavalaria cheios de façanhas inacreditáveis e cenas imaginativas ao extremo. Justamente estes elementos quiméricos desagradavam Cervantes,
"para quem a literatura deve despertar o interesse do leitor com uma ficção surpreendente e até maravilhosa, mas mantendo a fantasia, segundo a poética aristotélica, no terreno do razoável e verossímil." — trecho extraído de uma nota de rodapé.
Em Dom Quixote, Cervantes, coerentemente, não ultrapassa o terreno do verossímil, do sobrenatural, do logicamente inexplicável. Constrói as peripécias do seu cavaleiro andante dentro dos limites da razão ao mesmo tempo em que satiriza as novelas de cavalaria fantasiosas ao extremo.
Por fim,
a despeito das muitas peraltices quixotescas perpetuadas, o grão engenhoso fidalgo Dom Quixote da Mancha, vulgo cavaleiro da triste figura, ou ainda Alonso Quijada, logrou exito num de seus mais desvairados desejos, qual seja, eternizar seu célebre nome entre aqueles que professaram o nobre exercício da cavalaria andante e aventureira para todo o sempre.