Caroline Gurgel 18/02/2014Dilacerante e cruel, mas ainda assim, cativante...Lá estava eu, me sentindo "órfã" após o término de uma trilogia incrível e arruinada para qualquer estória que não fosse,
oh!, tão magnífica quanto aquela! Lia uns e outros e, mesmo gostando, sentia falta de algo grandioso. Um belo dia não tão belo assim, pois esse livro foi dificílimo de encontrar resolvi escutar as recomendações de umas amigas e ver o que de tão bom tinha em
Outlander. Tudo que eu sabia era que a moça caía 200 anos no tempo, mais nada.
Primeira página:
Inverness. Ponto. Ganhou-me! Se você é alucinada pela Escócia como eu, vai enlouquecer. Se não é, vai ficar.
A inglesa Claire, enfermeira durante da II Guerra Mundial, casou-se com Frank Randall, um professor universitário, pouco antes do início da Guerra, que logo os separou. Após a guerra e novamente reunidos, seguiram para Inverness - norte da Escócia. Frank era fascinado por história e por seus antepassados. Certo dia, Claire vê uma cena esdrúxula e um tanto mística em Craigh na Dun - uma espécie de Stonehenge fictícia, um círculo de pedras misterioso - e resolve retornar ao local e ver se poderia encontrar algo por lá que explicasse tal cena. E é aí que tudo começa.
Claire passa por uma pedra, como uma fenda no tempo, e surge cerca de 200 anos antes, em 1743, no mesmo local, com as mesmas roupas que usava. Os homens das Highlands que a encontram não entendem quem é aquela mulher. Uma prostituta? Uma espiã? Uma bruxa? Na dúvida, levam Claire até que descubram quem ela realmente é. Eis que surge
Jamie, e se seu coração pulsa e você precisa de ar para viver, anote minhas palavras:
você vai cair de amores por Jamie, muito! E você vai sofrer por ele, tanto, tanto...
Para os mais avessos à fantasia, asseguro-lhes que a única parte que caracterizaria essa história como tal é a "queda" no tempo e nada mais. Todos os personagens são plausíveis e suas atitudes completamente condizentes com a época e o local. A autora mistura mitos da região, contos, religião, medicina, crenças, batalhas, brigas, amor e ódio... Nos transporta para uma época em que a tortura e o abuso eram rotineiros e os homens, uma espécie de brutamontes. As mulheres que conheciam ervas e misturas que curavam eram confundidas com bruxas e queimadas em praça pública ou condenadas à forca, atraindo curiosos que aplaudiam fervorosamente.
Se eu fizer uma analogia entre o livro e um castigo, eu diria que a autora começa com uma palmadinha, passa para um tapa, um soco, uma surra, até que, no final, açoita e deixa tudo em carne viva. Então, não se enganem com o início leve e divertido dessa história, que certamente não é para os mais frágeis. Os capítulos finais são de uma dureza que eu jamais tinha experimentado em um livro. Aquilo doeu em mim, lá dentro, dilacerou meu coração, corroeu tudo que podia, esgaçou cada pedacinho do meu peito. Fechei e reabri o livro infinitas vezes, e quando parecia que a ferida ia cicatrizar, a autora vinha e botava o dedo, fazendo todo o sangue jorrar novamente. Por mais que eu tentasse - e eu tentei,
ó, como tentei - não visualizar a cena, ela estava lá, a cada fechar de olhos, a cada pulsar, na minha cabeça.
Oh, doce Jamie! O que eu faria por você?
Vi alguns poucos comentários na Amazon falando do "absurdo" de um certo castigo que ocorre lá pela metade do livro, que as pessoas não deviam admitir isso e bla-bla-bla. Que parte perderam da leitura? Certamente a de que a estória se desenrola em meados do século XVIII, em plena região das Highlands escocesas! Estive em Inverness em 2010 e é fácil imaginar como era aquilo séculos antes. Se nos dias de hoje a lenda - mesmo contada como lenda - do monstro do Lago Ness ainda sobrevive e é um dos principais atrativos da cidade, imagine o que não era aquela região em 1700?
Apesar das torturas, boa parte dessa estória é alegre e até engraçada. A maneira como os personagens principais se provocam nos mais inusitados momentos levaram algumas boas risadas minhas. Além disso, a excelente caracterização da época, dos costumes locais, da tradição dos
kilts, da relação entre pai e filho e entre marido e mulher, da arquitetura e da natureza, as brigas entre os clãs, entre ingleses e escoceses, foram um deleite e um aprendizado à parte. A escrita é outro ponto alto, sempre envolvente, elegante e formal, cativa o leitor desde as primeiríssimas páginas.
É uma
bela história de amor entre duas pessoas de épocas tão diferentes, mas que encontram um no outro tudo o que precisam. Um é a base, o outro a estrutura. É daqueles amores assim, difícil de esquecer, que marca, que permanece, que dá saudades, que te prende. É daqueles amores inquebrantáveis, sólidos, raros, que abdica...
Jamie e Claire, um herói e sua heroína, no mínimo, fascinantes.