lucasfrk 05/01/2023
A mulher sem pecado ? comentário
?Eu tenho um inferno dentro de mim. Um inferno particular. E se tivesse também um céu particular, uma eternidade minha, só minha, com tabuleta na porta proibindo a entrada de pessoas estranhas ao serviço? Não seria negócio? Um alto negócio...?
A primeira peça de Nelson Rodrigues, ?A mulher sem pecado?, escrita em 1941, já apresenta alguns elementos dramáticos e temáticos do autor. A obra gira em torno das aflições de Olegário, um ex-médico, cadeirante, que sente um ciúme patológico pela sua jovem esposa Lídia. A todo instante ele atormenta a esposa, com diversas ofensivas, e, além disso, paga a seus empregados para que investiguem a vida, o passado e todos os passos da esposa. A obsessão de Olegário, no entanto, acaba que por consumi-lo. Assim como ?Vestido de noiva? ? sua segunda peça ?, A mulher sem pecado assume um fundo psicológico. Olegário infesta a mente de Lídia com o que ele mesmo chama de ?pecado? (as fantasias sexuais, luxúria), transmitindo toda a sua insegurança à esposa.
Toda a trama ocorre num único espaço: a sala da casa de Olegário, e, além disso, não há uma unidade de tempo determinada ? de maneira que lhe confere um certo caráter universalidade, principalmente no que tange à temática. É, sobretudo, uma obra que, mesmo sendo classificada como tragédia, mesmo assim assume seu aspecto tragicômico por intermédio de quatro elementos: a presença de personagens que representam camadas populares da sociedade; uma ação que não se desenrola numa catástrofe; uma linguagem realçada e enfática (que carrega o elemento da tragédia), contrapondo uma linguagem cotidiana/vulgar (comédia); e, por fim, o aspecto da ambiguidade, e, em última instância, da ironia (o final inesperado, fruto do destino, que engole essas personagens arquetípicas).
?Ninguém é fiel a ninguém. Cada mulher esconde uma infidelidade passada, presente ou futura.?