MatheusPetris 10/04/2022
O epitalâmio é, na verdade, uma marcha fúnebre. Ou seja, A Necrópsia, seria um outro possível título para Madame Bovary. Um profundo drama burguês. Drama naquela definição de Victor Hugo, contemporâneo de Flaubert, que tendo afirmado que o drama é uma tragédia sob uma comédia, pressagiou a derrocada de Emma. Ouso sintetizar sua estrutura: uma espiral que suga Emma para dentro dela. Por essa estrutura, investiga-se uma vida em espiral de sofrimento, na qual a felicidade existe apenas em prol da ruína. Se a esperança surge, é apenas para se desvanecer. O tédio, acrescido do sofrimento (que vai e volta), é uma constante.
Flaubert alcançou seu objetivo: a despersonalização. Se afastou de seu livro em prol de um estilo sóbrio. Algo já identificado por Baudelaire pouco tempo depois de sua publicação… Não por menos, Flaubert respondeu o ensaio do poeta, afirmando que o mesmo invadiu sua mente. É claro, para nós, filhos do século XX e XXI, é muito “fácil” perceber isso quando temos em mãos as correspondências de Flaubert. É tudo sobre o estilo. Se pretende escrever, conceba um estilo antes de sequer tocar na pena, foi o que nos disse o maior prosador do século XIX. Através dele, Gustave zombou de sua própria classe. No meio dela, debochou como quis. O mais excêntrico, petulante e arrogante personagem, Homais, é o único com um final ascendente… Um perfeito representante da classe burguesa.
E não pensem que se trata de uma militância ou de objetivos (diretamente) políticos, é, única e exclusivamente, um exercício estético. Sua completa e total harmonia, lapidam cada pequeno detalhe de forma precisa e em benefício da narrativa. Eis o verdadeiro significado de unidade. Se cada capítulo tem uma força própria, uma construção visando um objetivo muito bem delineado e claro, é pela possibilidade de se concatenar cada fragmento. Cada frase — aquela que busca o caráter inviolável de um verso —, cada parágrafo, cada capítulo, cada parte, aproximam a prosa do ofício de um poeta. Flaubert, arrisco dizer, é o poeta da prosa.
Não me alongarei mais. Pretendo, em uma futura releitura, escrever um ensaio sério sobre o romance com a devida atenção e detalhamento que ele merece. Por hora, ficarei com esses comentários gerais (e genéricos num certo sentido) e atesto: pode não ser meu romance favorito, mas com certeza é o melhor que já li.