Feliky 05/12/2023
Se você é iniciante nessa coisa de mitologia grega, FUJA dessa versão
Essa resenha é da tradução do Jaa Torrano, da editora Iluminuras.
Sinceramente, não gostei dessa edição. Eu consigo entender o texto traduzido ser complicado de entender dependendo da escolha do tradutor (alguns tentam manter a complexidade da obra original quando ela é assim rebuscada, outros inserem palavras pouco utilizadas aqui e ali por questão de métrica quando se trata de poesia, tem vez que nem são as palavras em si que são complicadas e sim a estrutura por uma questão estilística literária, etc). Porém, não consigo entender os textos complementares, que possuem o objetivo de ESCLARECER e ESTUDAR o assunto em questão, serem confusos. E o que aconteceu nessa edição é que o texto em si (a Teogonia) não é assim complicada (o que não considero negativo, aliás), mas a explicação do texto é (o que eu já considero negativo). Qual é o sentido?
Não me entendam mal, o estudo tem momentos bons! Por exemplo, toda aquela parte sobre Zeus, Mnemosine e as Musas foi realmente interessante e esclarecedora como uma possível interpretação desse relacionamento. A teoria em cima das duas primeiras esposas de Zeus, relacionada às linhagens delas, também. Mas muitos aspectos são confusos, o que deixa a leitura menos proveitosa. Também fiquei com a impressão que a ordem dos assuntos tratados não foi tão bem organizada quanto poderia, pois parecia que ele ia seguindo um racíocionio e então parava pra voltar pra um conceito mais básico (os relacionados com Hesíodo e o arcaico)...por que não explicar todos os básicos de vez e só então prosseguir a usá-los todos para as interpretações?
Ainda no assunto da organização, acho que o formato com notas seria benéfico para a Teogonia. Um exemplo: em dado momento, há um Crina-Negra/Crita-Preta (não vou lembrar agora) e esse é Poseidon...ele ser descrito assim não é a parte estranha, a parte estranha é que esse trecho em específico só mostra como esse livro se beneficiaria de algumas notas de fácil localização porque seria mais fácil para as pessoas saberem que é uma referência a Poseidon. Ver lá um numerizinho, procurar no final do livro o número e encontrar lá algo como "refente a Poseidon" e pronto. Eu mesma só entendi rapidamente porque eu já sabia dessa parte da história e peguei pelo contexto, mas acho que quem não conhece se confunde. Não é como se explicar a quem se refere por meio de notas fosse algum inovador nas traduções! Afinal, quem nunca leu uma peça ou poema grego que diz "Febo" e encontrou um numerizinho indicando uma nota, que por sua vez explica que "Febo" nada mais é que outro nome pra "Apolo"?
Não posso opinar quão fiel é a tradução, pois da língua grega nada conheço. No entanto, achei a Teogonia em si até que fácil de entender e, como eu já disse, é inclusive mais fácil que as próprias explicações de Torrano. O que prejudicou o andamento da leitura para mim foi a decisão que Torrano tomou de traduzir certos nomes literalmente, decisão essa que eu entendo, porém admito que não gosto. Há momentos em que isso não é assim tão ruim, como Mnemosine sendo referida como Memória, Gaia como Terra, Nix como Noite. Mas há alguns casos que chega a ser confuso, tipo a musa Calíope sendo Belavoz, Hebe sendo Juventude, Lete (a deusa personoficada do rio, não o rio somente) sendo Esquecimento. Em dado momento, foi citado uma personagem descrita como virgem e ninfa e chamada de Víbora e eu só me toquei que se referia a Equidna quando citou com quem ela teve filhos, o que fez eu me perguntar se o "Víbora" é uma escolha particular de Torrano ou de fato é frequente em outras traduções da Teogonia. No caso de ser uma escolha específica de Torrano, achei questionável. No caso de ser comum em traduções, retomo aqui o meu comentário sobre notas serem úteis porque, mais uma vez, eu entendi pelo contexto, mas quem não sabe o contexto anteriormente não entende.
Conclusão: muitas coisas eu entendi porque já sabia antes, portanto para uma pessoa nova no assunto eu definitivamente NÃO recomendaria essa edição. E ah, outro detalhe é que a edição é bilingue, tendo tanto o texto grego quanto a tradução. Não foi útil pra mim porque não sei grego, MAS para os estudantes de grego ou aqueles que já sabem e gostam de comparar o original com a tradução tá aí pra vocês.
(Aqui vou citar alguns paralelos de linhagens que eu não considero spoiler, pois são referências básicas, e portanto não vou marcar spoiler na resenha. Mas se você acha que é, esteja avisado.)
Sobre a Teogonia, ela é bom de ler se você quer mesmo saber mais de mitologia grega, mas eu não diria que é tão interessante quanto outras leituras do tema que fiz. É bastante voltado para Zeus, sendo ele o deus principal do panteão, e o foco principal é justamente explicar as linhagens dos titãs, deuses, ninfas e outras criaturas. Por causa do objetivo da obra (ser uma árvore genealógica divina), imagino que Teogonia não fosse ser mesmo o tipo de leitura que eu ficaria super entusiasmada, mas não descarto que talvez a edição em si possa ter deixado a experiência menos satisfatória. Além disso, tendo eu lido Homero antes, achei interessante notar que de fato as origens desses seres não são fixas, pois a própria Afrodite é tida como filha de Zeus e Dione por Homero enquanto Hesíodo a coloca como tendo nascido de Urano (o que, portanto, a torna irmã de Crono e tia de Zeus ao invés de neta de Crono e filha de Zeus). Eros é outro exemplo, sendo aqui uma existência muito antiga enquanto outras versões o colocam como sendo filho de Afrodite com Ares e, portanto, uma divindade posterior aos olimpianos (um exemplo é Argonáuticas, de Apolônio de Rodes). É um texto curto, então a leitura da Teogonia em si é rápida.
Terminei com a sensação que provavelmente seria interessante eu ler Teogonia de novo em outra edição.