Caldeira Brant 12/11/2016
Une vie c’est pas assez
Mon Dieu! Santo Onofre! Esta frase que dei por título é deveras apropriada e perfeita para minha impertinente resenha que será exposta aqui. Pois se não fosse pela imensa caridade e paciência de meu “bon ami” Louis Carrieur, jamais poderia ter lido esta obra, O Bizantino. Generoso, Monsieur Carrieur, pacientemente, o digitalizou, em Paris, a partir de um original antigo e único por lá, autografado pelo autor, que ele encontrou em prestigiosa biblioteca parisiense. Para começar, devo ressaltar, ao observar a resenha sobre o livro inserida aqui, neste clube de leitores, que ela está muito aquém da originalidade e grandiloquência que permeia o romance de Miguel M. Abrahão. Obra esta, humildemente eu devo confessar, que me dá muito orgulho por ser conterrânea deste enigmático e recluso autor.
Uma aula de História? É pouco para definir O Bizantino! Um delírio? Seria piegas e frugal se eu definisse o romance assim! Uma fabulosa e saborosa aventura pela mágica Bizâncio e pelo decadente Império Romano do Ocidente do século VI, de Justiniano e Teodora, por um lado, de São Bento de Nursia aos papas, pelo outro...? Não! Isso também não faria jus ao O Bizantino. Em verdade, trata-se de uma obra que trás para qualquer tipo de leitor um grande e complicado mistério, envolvente e cativante, escrito de uma maneira arrebatadora. Ao mesmo tempo, é um tratado sobre a Teoria Gnóstica e povoado de Aeons, temperados pelo Mito de Sofia e com acordes sobre a chamada “Luz Verdadeira”. “Uma batalha do bem contra o mal, ou uma batalha daquele, que, por ignorância, imagina ser o mal”... Não quero fazer um Spoiler! Também não diria que se trata de um romance apenas diletante! É muito mais! É pura filosofia mesclada ao entretenimento mais alucinante que se pode obter com uma leitura!
Deveras, já havia lido outras obras de Miguel M. Abrahão (a quem chamei por aqui de o nosso Umberto Eco brasileiro). Mas esta... Esta obra me deixou estupefata ao ponto de me fazer pensar sobre ela o tempo todo desde que fechei o visor do meu tablet após a última página. E ainda, nestes últimos dias, retomo a leitura. Volto a ler e reler, ler e reler, ler e reler, mesmo com essa claridade abrasadora da tela do tablet, que “modernosos” dizem ser o futuro do livro (infelizmente só pude ler este romance em anexo PDF). E a cada releitura, uma descoberta nova! Desperto intelectualmente, atenta e embevecida, para frases espirituosas e para a desconstrução de pensamentos arraigados em nossa cultura ocidental. Na verdade, verdade verdadeira, afirmo que O Bizantino é um livro que deveria ser leitura obrigatória em todas as Universidades deste meu Brasil pouco varonil. Afinal, Universidades por aqui, dizem os mais ingênuos, “trabalham frementes com o pensar, exercitando sinapses”... Não é?
E o que dizer das nuances psicológicas e da construção da psique de Teia e seus coadjuvantes? Como doutora em Psicologia nunca me deparei com uma obra que fosse, ao mesmo tempo, tão acadêmica e tão imprescindível. Excetuando-se nossos autores clássicos, por certo...
Hoje, por sinal, pululam autores! A mídia nos apresenta um novo a cada hora, saudando-os como gênios, visionários, renovadores da essência literária primordial... Mas este Miguel M. Abrahão é um dos poucos no cenário literário brasileiro que poderia ser descrito por todos esses adjetivos. Confesso que esta é a quarta obra dele que li. Com dificuldades, por certo. Dificuldades comuns de encontrar no mercado obras disponíveis do Abrahão; é a reclamação generalizada quando se referem a esse autor. Por sinal, onde estão as editoras deste país? Porque, santo Onofre, não republicam os romances deste autor? Porque nos obrigar a ler O Bizantino sem atualização gramatical e por meio de cópias? Absurdo dos absurdos! Mas, diz o ditado, “não se deve dar pérolas a porcos”. Creio que os editores “brasiltupiniquins”, assim o pensam quando estão por editar para nós. Como se diz aqui em BH, “mete porcaria que a porcada regurgita” La vèrité nous rend libres! E verdade seja dita: O mercado editorial por nossas terras está precaríssimo, não há dúvidas! No caso de O Bizantino, se não fosse por uma biblioteca francesa e pela bondade de um cortês amigo, eu jamais poderia ter lido esta obra-prima: uma produção de nível excepcional e, quiçá, arguciosa. Um romance que faz uma fusão perfeita da história, filosofia, misticismo, regado por elementos comuns aos clássicos policiais noir. Concluindo, não sou exagerada quando comparo o romance de Abrahão ao de Eco, principalmente ao O Nome da Rosa. Ler O Bizantino, un livre qui vous rend heureux., gera o mesmo prazer que tive ao ler e reler o romance do saudoso italiano mestre.