Ariadne 21/05/2023
Sou uma mulher simples. Comecei a ler Borges porque queria ter assunto com outra mulher. A gente se coloca em algumas posições - submissas demais - às vezes. Ela nunca soube que eu havia comprado o livro e lido o bendito de cabo a rabo, claro: o destino não funciona assim. Seria simples demais, e o nosso mundo é complicado demais.
Borges resmungaria alguma coisa sobre movimentos cíclicos, traria inúmeras referências as quais eu teria que pesquisar a fundo para entender, diria que essa resenha é um labirinto e que provavelmente a autora é covarde.
Demorei-me nestes textos, confesso. O esforço inicial em decifrar a escrita complexa para impressionar passou a ser prazer, e impressionei-me. Entendi o porquê de ler Borges. Investiguei quase todos os detalhes e tentei entender algumas das referências infinitas. (nunca acabam, juro). Tenho certeza de que entrei em um esquema de pirâmide e que terei que devorar, chutando baixo, uns vinte outros textos só pra compreender um pouco mais disso tudo (o mundo?), pra não ficar por isso mesmo, pra não jogar tudo no vácuo, pela vontade.
Todos os contos deste livro são difíceis (ao menos pra mim). Aqui, a linguagem é acessível, mas o conteúdo é complexo, quase cifrado. O escritor traz referências inúmeras, mencionando pensadores gregos, textos ocidentais bíblicos, alguns escritos árabes, como "As mil e uma noites", de Antoine Galland, e várias mitologias.
Pude perceber certa insistência (e obsessão) em temas gerais, como o tempo, o universo, a identidade, a eternidade, a (i)mortalidade etc. Certos temas específicos também me chamaram atenção pela frequência com que apareceram: os movimentos cíclicos, os labirintos, a crítica sutil às instituições religiosas, os movimentos pendulares, a transformação abrupta do caráter, o fantástico, o onírico etc.
Anotei em lápis, na última página, uma experiência que tive durante a leitura de um dos contos (não me lembro em qual estava, me desculpem): "Quando te leio, sou levada, como que em plena despersonalização, a assuntos metafísicos. Não ignoro mais o mundo e a passagem do tempo. Teus segredos estão seguros entre os meus". Acho que foi uma espécie de anedota a Borges. Gosto de fingir que converso com o autor, quando o texto me marca muito.
Para concluir, estudei muito e saí dessas páginas um tiquinho maluca. Ainda bem que a gente se coloca em algumas posições -submissas demais - às vezes.