Diego Rodrigues 24/05/2023
"O passado é uma roupa que não nos serve mais"
Para muitos, a obra prima do escritor japonês, e vencedor do Nobel, Yasunari Kawabata. "O País das Neves" foi publicado em sua primeira versão em 1937 e teve sua versão definitiva finalizada após a Segunda Guerra Mundial. O breve romance gira em torno do excêntrico professor Shimamura, que visita uma região montanhosa do Japão em busca de uma gueixa que conheceu anos atrás. A montanha, a neve e a beleza da jovem Komako exercem certo fascínio no nosso protagonista, que de tempos em tempos deixa a conturbada capital e a monotonia do lar para visitar a região conhecida como País das Neves. Envolta em mistério, melancolia, sensualidade e elementos da natureza, a estadia de Shimamura acaba se revelando uma constante busca pelo "eu".
Kawabata é dono de uma das escritas mais bonitas com que já me deparei. Marcada por lirismo e um sensorialismo exacerbado, sua narrativa consegue nos transportar facilmente para outras paragens. No caso, para um pequeno vilarejo coberto de neve em meio as montanhas japonesas. Nem preciso dizer o quanto esse livro é aconchegante na companhia de uma xícara de café, né? (em especial, para aqueles que gostam de um friozinho). A obra também nos apresenta vários elementos da cultura japonesa, como as gueixas, o som do shamisen (instrumento musical típico), a tecelagem do chijimi (tecido produzido no Japão) e alguns costumes populares. Como resultado, temos uma leitura sensível e contemplativa, desprovida de grandes acontecimentos, mas rica em significação.
É um livro que trata, de forma muito delicada, da passagem do tempo e da efemeridade das nossas relações, como amamos e deixamos de amar, desejamos e deixamos de desejar, e a dificuldade em deixar pra trás aquilo que deve ser deixado. Um sentimento de nostalgia permeia toda a obra, não por acaso repleta de flashbacks e alusões a espelhos e imagens sobrepostas. Shimamura é o tipo de personagem que olha muito pra trás e se perde facilmente em seus devaneios, parece sempre retornar a montanha em busca de algo que já não existe. Mas, como dizia Belchior, "o passado é uma roupa que não nos serve mais". Talvez todos nós tenhamos uma "montanha" para a qual gostaríamos de retornar nos momentos difíceis. Afinal, o passado sempre deixa marcas. Mas é importante aprender com o mesmo e superá-lo, ou corremos o risco de viver eternamente em um País das Neves.
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