SamellaFonseca 22/05/2016Resenha exclusiva para o blog SammySacional
Quando li O Pássaro, ainda em janeiro de 2016, fazia exatamente dois anos que havia tido o primeiro contato com os livros da autora, em janeiro de 2014, através daquela que viera a ser uma das leituras mais marcantes, não apenas daquele ano, mas da minha vida como leitora, Quero Ser Beth Levitt. Desde então, a vontade de continuar a ler suas obras era imensa, e a oportunidade de adquiri-las enfim surgiu e eu pude conhecer, nesse caso, o livro que fora a estreia de Samanta Holtz na literatura, o romance que definitivamente a consagrou e abriu as portas para uma carreira que, assim desejo à autora, seja de muito sucesso, inspiração e lindas emoções, porque, da mesma forma, é disso que suas histórias são feitas, de muitas emoções e mensagens inspiradoras que podem fazer uma grande diferença na nossa vida.
Em pleno século XIII, como filha de um dos mais poderosos barões da região, Caroline Mondevieu tem tudo que uma garota poderia desejar nessa sociedade, desde os vestidos mais incríveis e luxuosos até mesmo a garantia de um ótimo pretendente com quem se casar. Ela, por outro lado, não dá muita atenção à nada disso, uma vez plantado em seu coração o desejo por liberdade e independência, após tantos conflitos com o próprio pai, então ditador do destino da jovem. Não muito longe dela, em uma humilde cabana em sua propriedade, Bernardo, um jovem e por vezes arredio domador de cavalos almeja sua própria liberdade dos campos de trabalho do Barão de Mondevieu. O primeiro encontro entre eles não é nada agradável, e nem mesmo os seguintes, mas uma vez que ninguém mais compartilha dos mesmos desejos que eles, ambos sabem que são os únicos capazes de se unirem e livrar à ambos da prisão em que se sentem. Mas nada será tão simples como eles imaginam, e à medida que uma série de segredos passados ameaçam vir a tona após sua fuga, eles não sabem, mas suas vidas irão mudar para sempre.
“— Ser cavalheiro? — explodiu. — Isso lá é coisa pra gente pobre como nós?
— A educação é sempre o mais importante — insistiu. — Ela não tem a ver com a riqueza, mas com sua honra de ser humano.
— Sei! — zombou. — Você não pensou nisso sozinho, pensou? Quem foi o idiota que colocou isso na sua cabeça?
— O idiota foi sua mãe. [...] — Ela também me ensinou que, acima de qualquer dificuldade, está o amor.”
O início de O Pássaro já é introdutório por si só, apresentando ao leitor a história e prestígio social da família Mondevieu, mérito do Barão e então pai de Caroline e Elizabeth, sua irmã dois anos mais velha. Em meio a uma cena da infância da personagem, acompanhamos os traços da curiosidade latente da personagem e sua postura em não abaixar a cabeça tão facilmente como era de costume às mulheres da época, ganhando uma certa marcação por parte do pai, que quer controlá-la da mesma forma que já faz à esposa e filha mais velha, mas uma vez sendo Caroline muito ousada, a relação de pai e filha tenderá sempre a ficar cada vez mais abalada e frágil. Ela é uma protagonista cativante e ativa, sem dúvida alguma, e por mais que vez ou outra queiramos dar-lhe um puxão de orelha por alguma atitude ou fala impulsiva, a verdade é que, apesar da narrativa em terceira pessoa, nos envolvemos com a história e, principalmente, com a personagem, de tal forma que compreendemos e até mesmo sentimos sua aflição e anseio constante por liberdade, principalmente à medida em que as máscaras da alta sociedade caem e enxergamos tamanha inferioridade a qual as mulheres da época eram subjugadas. Com seus eventuais equívocos e atitudes um tanto quanto mimadas logo no início, ainda assim, apesar da pouca idade de dezessete anos, Caroline era uma garota a frente de seu tempo, um pássaro preso na gaiola das convenções sociais da época, e que só almejava ser liberto e alçar um voo por conta própria.
“— Milady, eu...
— Conte-me, Bernardo: quantas damas você viu entrarem na floresta, para longe do conforto e da riqueza, sem qualquer ultimato? Renunciar a tudo em busca de algo que ouro nenhum poderia comprar? Sentir formigas picando suas canelas, enquanto podiam estar descansando em seu quarto limpo e seguro?
Ele apenas ouvia, perdido na dimensão dos pensamentos dela.
— E você ainda vem me falar de coragem!”
Ainda assim, com uma protagonista tão forte e determinada, Bernardo, da mesma forma, rouba a cena quando aparece e vai conquistando o leitor mesmo por entre seu jeito meio marrento e teimoso que, logo mais, se mostram apenas como traços que escondem toda uma sensibilidade e romantismo inerentes, inclusive, a quem almeja não apenas alçar seu próprio voo, mas, também realizar o tão antigo sonho de tornar-se corredor. Com o plano de Caroline, de repente esse sonho nunca esteve tão próximo de virar realidade, ao ganhar desta, como uma recompensa, um dos cavalos mais fortes dos Mondevieu, o "quase tão corredor quanto ele" Apolo. Mas ao passo que ambos permanecem em teimosia e orgulho, Caroline e Bernardo terão uma grande aventura por viver para só então reconhecer sentimentos que antes eles não estavam preparados para encarar e mesmo até vivenciar. E nesse ponto, por mais romântica que eu seja, gostei que a autora não tratou do romance como um foco; ele estava ali, mas desenvolvia-se de uma forma tão leve e natural, com certa lentidão que, no entanto, fez toda a diferença nos capítulos finais.
“— Elizabeth, qualquer esposa deve obedecer ao marido. Você não é a única.
Ela amenizou o tom da voz, reflexiva:
— Desde quando a obediência anula o amor?”
Assim, com dois personagens tão cativantes e que se destacam de uma forma tão forte e altiva no enredo, é natural que, de certa forma, esqueçamos um pouco dos demais personagens. No entanto, foi por driblar esse enfoque que a autora se superou mais ainda, pois, com o desenvolver da história e apresentar de cada um dos demais personagens, de repente me vi ansiando por saber o que aconteceria a seguir não apenas com a Caroline e o Bernardo, mas também à sua irmã Elizabeth, então recém-casada mas visivelmente decepcionada com a distância do marido a quem tanto ama, à mãe das duas, Antonelle, que apesar de inicialmente mostrar-se tão unicamente submissa ao marido e suas vontades, logo mais começou a agir por conta própria e a lutar mais pelo bem das filhas, bem como, por fim, à Filip, doce como um príncipe que, no entanto, tem seus sentimentos por Caroline não correspondidos, mas ainda assim mantendo a amizade tão delicada e pura iniciada ainda na infância. Outros personagens também se fazem presentes de forma igualmente importante no enredo, mas cuja apresentação só se dará na hora certa, então só lendo para conhecê-los. Por outro lado, de destaque negativo citemos o pai de Caroline, o barão Enézio Mondevieu, que se sobressai por tamanha frieza e ambição, que me fez torcer o nariz e desejar que ele desaparecesse da história a cada vez que ele se intrometia em algo e ditava ordens desmedidas às filhas e à esposa.
No fim das contas, O Pássaro conclui-se como mais do que um simples romance, mas como uma representação do grito por liberdade proferido, de certa forma, pela jovem protagonista. É como se sua jornada, enfim, não dissesse respeito apenas à ela mesma, mas também na influência que acabou tendo sobre a mãe e a irmã, dando-lhes o gatilho para buscar a real felicidade, a vida de verdade, que tanto Caroline defendi e até então elas não entendiam. Uma história tocante, com personagens fortes e marcantes que, mesmo após a conclusão da leitura, deixam saudades e permanecem na nossa memória.
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