Claraboia

Claraboia José Saramago




Resenhas - Claraboia


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claracoutorosa 21/02/2024

Esse livro é para quem gosta de fofocar sobre a vida alheia
Neste romance, acompanhamos os dramas cotidianos dos moradores (fofoca) de um prédio de seis apartamentos numa rua modesta de Lisboa. As janelas, paredes e corredores do velho edifício são testemunhas privilegiadas das pequenas tragédias e comédias representadas pelos personagens.
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Eric Vinicius 12/05/2024

Uma claraboia no universo de Saramago
Se fosse qualquer outro autor, seria um livro muito bom. Domínio do espaço narrativo, formidável construção psicológica das personagens, escrita concomitante em diversos núcleos. Nesse último aspecto, o romance me fez lembrar bastante de "O Cortiço" (Aluísio Azevedo) e, em alguma medida, até mesmo de "Anna Kariênina" (Liev Tolstói) - dois dos meus livros favoritos.
Mas não estamos falando de qualquer autor. E é justamente pela forma como a obra se apresenta que (ignorando, a princípio, a época em que foi escrita) "Claraboia" me surpreendeu, ao tomá-la como um romance de Saramago.
Para quem está acostumado ao estilo insólito do português, causa estranheza a observância fiel à cartilha dos textos ordinários, com o uso regular de sinais de pontuação, a identificação nominal de praticamente todas as personagens e a evolução linear da narrativa. Tudo bem encaixadinho, como num edifício de apartamentos - local, por sinal, onde a história se desenvolve.
É, porém, um dos primeiros romances do autor. E, nesse sentido, não dá para se fazer uma leitura descontextualizada e anacrônica (apesar da atemporalidade que, como esta, marca as grandes obras). Vejo, no romance, um Saramago incipiente, dando os primeiros passos na criação de sua (hoje, velha conhecida) identidade, tentando ouvir sua voz interior. Ainda assim, já é um escritor maduro, que se utiliza virtuosamente. Um pouco experimentado em alguns de seus temas, percebi sinais (embora ainda tímidos, é verdade) de sua conhecida análise cética e pessimista da realidade, como no desfecho do embate entre os amigos Silvestre e Abel (quem tem a palavra final quase sempre sai vencendo).
Esse prisma foi o que mais me interessou no livro. Eu o recomendaria a quem deseja conhecer um pouco do início da produção do autor, ou que não tenha se adaptado ao seu estilo, mas ainda assim deseja degustar pílulas de sua visão sobre o mundo. Algumas construções de efeito, regaladas no texto (ainda estamos falando de um Saramago, afinal), devem colaborar na satisfação desse interesse.
Mas, para quem esperava um pouco mais, como os abundantes fluxos de consciência, em um matiz sarcástico que tanta polêmica já causou, ao enfrentar tabus em suas inovadoras produções subsequentes, o romance deixa razoavelmente a desejar.
"Há palavras que se retraem, que se recusam - porque significam de mais para os nossos ouvidos cansados de palavras". Entendo, nem sempre o deslumbramento é possível, com as palavras. Mas é que eu me acostumei mal com você, meu caro!
Longe de ser ruim, "Claraboia" é "apenas" um livro muito bom. Uma "claraboia", no universo escuro de Saramago.
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Renato 18/01/2012

Um velho novo Saramago (publicada no Coletivo Amálgama)
Leia também esta resenha em:
http://www.amalgama.blog.br/01/2012/um-velho-novo-saramago/

por Renato Tardivo
renatotardivo.blogspot.com

Foi publicado recentemente o que talvez sejam os últimos originais deixados pelo escritor português – vencedor do prêmio Nobel em 1998 – José Saramago, falecido em junho de 2010, aos 87 anos. Curiosamente o livro em questão, Claraboia, foi o segundo romance escrito por ele, no início dos anos 1950, quando utilizava o pseudônimo “Honorato”.

Saramago já havia publicado um romance em 1947 – Terra do pecado. O livro de estreia não tivera boa acolhida, nem do público nem da crítica. Também como “Honorato”, o ex-serralheiro e jovem funcionário da previdência social (contava por volta de 30 anos) possuía alguns contos publicados em jornais e revistas. Nessa época, incentivado por um amigo artista plástico, o escritor submeteu Claraboia a uma editora de Lisboa, mas não obteve retorno e os originais sequer foram devolvidos. Veio o silêncio: José Saramago só publicaria outro livro, Manual de pintura e caligrafia, cerca de 24 anos mais tarde.

Na década de 1980, quando o escritor português já era mundialmente consagrado, a editora que o ignorara 30 anos antes propôs a publicação de Claraboia. Não se sabe ao certo se magoado ou ocupado com a produção de outros livros – o autor escreveu inúmeras obras entre a década de 1980 e o seu falecimento, em 2010 –, ou provavelmente devido aos dois motivos, Saramago decidiu não publicá-lo em vida, deixando a decisão para os seus herdeiros.

Bem, se já não bastasse a novela de 60 anos em torno do livro, vale dizer que sua leitura é válida. No entanto, isso não se deve, ao menos não primordialmente, à qualidade do romance. A propósito, aliás, o comumente lúcido José Saramago disse que o livro era “ingênuo”, mas que não se tratava de um romance “mal construído” e que possuía “coisas que já têm que ver com o meu modo de ser”. Tendo a concordar.

Claraboia tem mais de 350 páginas distribuídas em exatos 35 capítulos. Os longos períodos e parágrafos, a pontuação própria, a prosa que por vezes demanda algumas páginas até que o leitor se acostume, enfim, a marca própria que Saramago consolidou a partir de livros como Memorial do convento e Levantado do chão e com a qual se notabilizou em O Evangelho segundo Jesus Cristo e Ensaio sobre a cegueira, não figura ainda em Claraboia. Neste velho novo Saramago, as frases são curtas, a prosa é ágil e a leitura flui – da primeira à última página.

A epígrafe, de Raul Brandão, diz o seguinte: “Em todas as almas, como em todas as casas, além da fachada, há um interior escondido”. É este “interior” que o romance procura habitar. No primeiro capítulo, a partir da casa de Silvestre, um velho sapateiro, e sua esposa Mariana, tomamos contato com os habitantes dos demais apartamentos de um prédio. Nos demais capítulos, salvo raras exceções, as histórias dos vizinhos praticamente não se cruzam – cada capítulo é dedicado a um “interior escondido”.

Um casal infeliz, cuja filha morrera ainda nova, quatro mulheres solteiras – duas velhas, duas irmãs mais jovens (filhas de uma, sobrinhas da outra); um casal que (aparentemente) não se gosta mas cuja relação se transforma pelos olhos do filho; uma jovem e bela senhorita que sustenta a mãe com os ganhos do corpo; uma família que vislumbra o potencial da filha subir de vida; o velho sapateiro e sua esposa que, para equilibrar os gastos, alugam um dos quartos do apartamento para o jovem aventureiro Abel. Um verdadeiro microcosmo que, nessa medida, lembra o clássico O cortiço, de Aluísio Azevedo.

É interessante vislumbrar passagens (já) dignas de nota: “Duas mulheres velhas e duas que já voltavam costas à mocidade. O passado para recordar, o presente para viver, o futuro para recear”; “Vivia dentro de si mesma, como se estivesse sonhando um sonho sem princípio nem fim, um sonho sem assunto de que não queria acordar, um sonho todo feito de nuvens que passavam silenciosas encobrindo um céu de que já se esquecera”; “Ninguém sabe se esquece antes de esquecer”; “Não gosto de ser agarrado e a vida é um polvo de muitos tentáculos. Um só basta para prender um homem”; “Ter não é possuir. Pode ter-se até aquilo que não se deseja. A posse é o ter e o desfrutar o que se tem”; “Mas entre o ser e o parecer há sempre um ponto de entendimento, como se ser e parecer fossem dois planos inclinados que convergem e se unem”; e ainda haveria outras.

Em outros momentos, fica nítida a busca de Saramago pela própria linguagem – com a qual, felizmente, viria a se encontrar anos mais tarde. Shakespeare, Eça de Queirós, Dostoiévski, algumas vezes utiliza-se o recurso da intertextualidade. Seja como for, lampejos do Saramago maduro comparecem neste livro, e não apenas enquanto potencialidade senão enquanto realidade: “Abel pensou, tornou a pensar e, no fim, tinha diante de si apenas a pergunta”. Não seriam estas – as perguntas – o motor da prosa de José Saramago? É provável, vale dizer, que se escrevesse o romance em sua fase madura o autor mergulharia de forma ainda mais radical em apenas um daqueles interiores escondidos. Silvestre, Mariana e Abel? Possivelmente.

O jovem Abel, o estranho/familiar, disparador do início e do desfecho do romance, trava com o velho Silvestre belos diálogos – os diálogos envolvendo também as demais personagens são bem construídos. Temas como liberdade, desejo, união e desunião entre os homens – impossível não localizar os germes de Ensaio sobre a cegueira, A caverna, O Evangelho segundo Jesus Cristo – dão a tônica do embate entre o novo e o velho e – por que não dizer? – do próprio romance Claraboia – ele mesmo emblema do embate entre o novo e o velho José Saramago.

No entanto, se por um lado os múltiplos enredos são emblema da procura de Saramago por uma terra mais segura, por outro, vale destacar a sutileza com que o escritor maneja a luz que atravessa as diferentes janelas mas passa pela mesma claraboia: “O sol entrava pelos vidros da marquise e projetava no chão a sombra da armação de ferro como se fossem grades”. Mas, sobretudo, fazendo um exercício metonímico, Claraboia sobe de escala quando colocado em perspectiva com os livros que o velho Saramago ainda escreveria. Porque, em si mesmo, não é mais que um bom romance. E de (apenas) bons romances, para o bem ou para o mal, o mundo está cheio.

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Jessica1248 28/01/2012

Um outro Saramago, muito menos político, muito menos militante. Uma leitura suave, diferente daquele abismo que são seus outros livros. Um livro tão simples, que fala da busca de Liberdade, são tantas e tão diferentes e tão iguais, as prisões.
Gabriel 30/01/2012minha estante
Concordo. Mas em algumas passagens do livro já é possível perceber como o autor está a formar sua opinião. Cito aqui quando ele condena as automutilações, numa crítica, pela minha interpretação, ao sofrimento auto-infringido de alguns membros da Igreja Católica, sabida inimiga de Saramago.
O sapateiro Silvestre é possível de ser comparado com o próprio autor, pois ambos tem uma profissão simples, e pensamentos fortes. E ambos são ateus convictos.
Uma ótima e, com dito por Jel, leve leitura.


Jessica1248 03/02/2012minha estante
Uma boa comparação, Gabriel. Mas a verdade é que Saramago, diferente do Silvestre, teve uma velhice bastante ativa e engajada, até os últimos minutos, ele falou e 'lutou' pelo que acreditava. Mudando o foco, é engraçado como não é possível perceber nenhum traço do seu futuro estilo gramatical, não é? Parece mesmo um outro escritor.




dramosn 21/01/2018

Amei!
?Que tinham elas a dizer todo o santo dia, que não estivesse já dito mil vezes??
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O livro mostra a história dos residentes de um prédio em Lisboa e conta a partir daí, o contidiano desses vizinhos um pouco peculiares. Cada família com seus problemas, segredos e atitudes, fazem o enredo ser equilibrado e coerente no que transmite ao leitor. Os personagens são muito bem desenvolvidos e interessantes, cada qual, com seu valor e profundidade.

A história começa com a conversa do inquilino Silvestre com sua esposa Mariana, sobre como eles conseguiriam uma renda extra. E o resultado foi a escolha de alugar o quarto que estava vago em sua casa. Com esse início, o livro se desenrola sobre as perspectivas dos outros vizinhos, cada um monstrando ao leitor seu íntimo mais profundo e pensamentos. A cada capítulo, ficamos curiosos e ansiosos para desvendar o desfecho de cada família e como eles conseguiram ultrapassar cada obstáculo que apareceu em suas vidas.

A escrita de José Saramago é incrível, e com essa segunda experiência com o autor, começo a me apaixonar pela sua forma de enxergar as coisas e como consegue com tão pouco esforço, expressar em palavras o que pensa sobre moralidade, sociedade e frustações daquela época. E devo até admitir, que com esse segundo livro, José Saramago realmente é um escritor autêntico e único, que mesmo com o passar dos anos, continua com uma escrita transcedendo gerações.
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?Há palavras que se retraem, que se recusam ? porque significam de mais para os nossos ouvidos cansados de palavras.?
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Estou super animada com esse projeto e afirmo que jamais esperaria gostar tanto da escrita e história como estou. As opiniões sobre seus livros são bem relativas (uns amam demais, outros odeiam demais), mas em relação à mim, estou a amar!
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Karla Lima 10/04/2017

Fissura
Fissura
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Em construção civil, claraboia é uma abertura no teto pela qual entram luz, ventilação ou ambos. Neste romance passado em um edifício, é a fresta por onde espiamos a vida íntima dos moradores. Na história escrita em 1953 e inédita até o ano seguinte à morte do autor, é o orifício que nos permite enxergar dentro dos personagens. Sim, dentro, pois este é um romance em que, por mais que os personagens falem, ajam, mudem e se mudem, a ação dá-se principalmente em seus sonhos, pensamentos e sentimentos. É essa matéria-prima (melhor seria dizer imatéria-prima) que engolfa o leitor em cenas familiares, nas quais facilmente se reconhecem episódios vividos ou testemunhados, e surpreendentes, nos quais provavelmente poucos de nós alguma vez pensaram.
O primeiro livro do autor, “Terra do pecado”, foi escrito e publicado em 1947. Seis anos depois, o original de “Claraboia” foi recusado pelo editor. Só em 1977 Saramago voltaria a escrever romances, e que romance é este. Parece que, enquanto escrevia poemas e crônicas, acumulou ideias e forças para criar este livro notável. Não endosso a negativa do editor, mas compreendo que, em plena ditadura salazarista (1932-1968), fosse arriscado publicar uma obra em que cada capítulo transpira uma tensão sexual impossível.
A linguagem toda particular de Saramago já aqui se faz presente (já é inconfundível em “Terra do pecado”, aliás), bem como a ironia, o senso agudo de observação, a crítica à opressão do homem pelo homem e à anulação que cada um impõe a si mesmo em nome de uma sobrevivência social que só muito raramente se equipara aos sacrifícios feitos no esforço de sua obtenção.
Landcaster 18/06/2018minha estante
Resenha muito bem escrita! Parabéns!


Karla Lima 27/06/2018minha estante
ora essa, muito obrigada! :)




L&S 01/07/2018

Primeiramente, devo começar dizendo que Claraboia, apesar de ter sido escrito na década de 50, ficou perdido por décadas após a recusa de um editor e por isso Saramago não deixou o exemplar ser publicado enquanto estivesse vivo.

Ambientado em um prédio na cidade de Lisboa, Claraboia apresenta o dia a dia e os dramas familiares dos diversos personagens que estão presentes, sem dar muito enfoque nos deveres da vida lá fora. Com isso, ele explora as atitudes e o psicológico dos personagens, nos fazendo refletir sobre a importância dessas ideologias e rotinas, além das críticas sociais demonstradas na época, como tabus sexuais, preconceitos e conservadorismo.

"- Não tenha medo. Só quero dizer que aquilo que cada um de nós tiver de ser na vida, não o será pelas palavras que ouve nem pelos conselhos que recebe. Teremos de receber na própria carne a cicatriz que nos transforma em verdadeiros homens. Depois, é agir...

Página 259.

Como todo ótimo livro de Saramago, mensagens internas e filosóficas são tragas entre as conversas de Silvestre e Abel, como o questionamento sobre a forma em que se deve levar e aproveitar a vida, para que não fique à deriva (Claraboia).

site: livroseriados.com.br
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Mauricélia 15/09/2018

Saramago do início
Livro muito bom, mas para quem já leu Saramago na sua fase áurea, fica a desejar um pouco, mas também é importante notar como suas qualidades narrativas já aparecem no início. Profundidade psicológica, análise social, detalhes comportamentais da época, o ser humano a e seus sentimentos são ênfases já notadas aqui.
Ainda não aparece sua pontuação peculiar e também tem formato particular, por ter diversas narrativas em uma só, mais ou menos entrelaçadas, por se passarem no mesmo "cortiço", podemos assim chamar.
Ficou-me aparente a situação da mulher na época, porque por diversas vezes a análise do comportamento feminino vem a tona, as diferenças entre homem e mulher e a posição subalterna em relação a ele e a toda a sociedade, ainda pior se for uma mulher casada. Há diversas comparações negativas em que a mulher é a aba ruim da comparação. O leitor pode entender como um Saramago crítico a isso ou um Saramago machista.
Para mim, algumas histórias não tiveram o final que o autor levou o leitor a imaginar, ou pareceram incompletas. Ficou a decepção de querer saber mais sobre algumas situações não esclarecidas.
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Ricardo 16/01/2019

Vidas Simples Tornam-se uma bela História.
Saramago é o mestre da narração e do romance! Nesta obra ele trás o cotidiano de famílias simples de Portugal, vai contando essas vidas e entrelaçando pequenos acontecimentos e torna o que parecia uma história monótona em um grande livro que a gente não consegue largar até saber o próximo acontecimento no pequeno universo dos personagens! Saramago mostra que nos pequenos acontecimentos do cotidiano há muito história pra contar! E faz isso de forma majestosa! Se você ainda não leu nenhuma obra deste romancista Prêmio Nobel não perca seu tempo, escolha uma e apaixone-se por Saramago!
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Bruna 03/02/2019

Jovem Saramago...
Livro encantador. São claras as diferenças do jovem que o Saramago um dia foi e do escritor que se tornou ao fim de sua vida. No entanto, isso não diminui de forma alguma a qualidade do livro. A mim, na verdade, a engrandece.

1. Silvestre diz a Abel: "[...] o que eu queria é que a sua preocupação de fugir a prisões não o levasse a ficar prisioneiro de si mesmo, do seu ceticismo..."
2. "[...] a experiência, não sendo aplicada, é como o ouro imobilizado: não produz, não rende, é inútil. E de nada vale a um homem acumular experiência como se colecionasse selos."
3. Silvestre: " - [...] Cortar tentáculos não basta. O Abel vai-se embora amanhã. Desaparece, cortou o tentáculo. Mas o tentáculo ficará aqui, na minha amizade por si, na transformação da vida da dona Lídia.
- É o que eu lhe dizia há pouco. O simples facto de existirmos pode ser um mal.
- Para mim foi um bem. Conheci-o e fiquei seu amigo.
- E que ganhou com isso?
- A amizade. Acha pouco?
- Não, decerto..."
4. Silvestre: "- Vivemos entre os homens, ajudemos os homens.
- E que faz o senhor para isso?
- Conserto-lhes os sapatos, já que nada mais posso fazer agora. O Abel é novo, é inteligente, tem uma cabeça sobre os ombros... Abra os olhos e veja, e se depois disto ainda não tiver compreendido, feche-se em casa e não saia, até que o mundo lhe desabe em cima!"
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Andreia Santana 09/05/2017

Um Saramago iniciante e atual
Claraboia é um livro póstumo, mas foi escrito no começo da carreira literária de José Saramago. Concluído em 1953, é o segundo romance do autor, escrito logo após o lançamento da sua obra de estreia, Terra do Pecado (1947). O livro ficou perdido por décadas, após um editor recusar publicá-lo e sequer responder ao autor ou devolver-lhe os originais. Quando Saramago consagrou-se, nos anos 1980, com os romances Levantado do Chão e Memorial do Convento (este último, na minha modesta opinião, sua obra-prima), foi procurado para a publicação de Claraboia, mas respondeu que enquanto vivesse, o livro não seria publicado. O lançamento aconteceu em 2011, um ano após a morte dele, em junho de 2010.

Claraboia é um Saramago atípico para quem conhece a produção da maturidade do autor. O estilo inconfundível de narrativa, com longas digressões filosóficas e o sistema de pontuação peculiar, privilegiando vírgulas ao invés de pontos, não existe aqui. Mas há um vislumbre, uma semente de vir a ser. São os primeiros passos do autor que ele se tornaria no futuro. É lindo! Porque se em Alabardas, Alabardas…, outra obra póstuma e a última que ele escreveu e deixou inconclusa, vemos detalhes do seu processo criativo após décadas de experiência; nesse quase recém-nascido Saramago de Claraboia, percebemos o florescer de um grande talento não só da escrita, mas do humanismo.

Ambientado em um prédio de apartamentos de classe média baixa, na Lisboa de 1952, Claraboia apresenta diversos dramas pessoais e familiares. O edifício é o fio que une as histórias particulares e coletivas de seus moradores. Tudo de interessante se passa nesse microcosmo. Para fora do edifício existe a cidade e as rotinas de cada morador, como ir ao trabalho, à escola, à mercearia; mas elas são apresentadas de forma difusa, de propósito, porque o que interessa é mostrar-lhes a vidinha cotidiana e as mesquinharias guardadas entre as quatro paredes de casa.

As digressões filosóficas aqui aparecem em forma de diálogos entre os personagens Silvestre e Abel, moço misterioso que aluga um quarto no apartamento onde o velho sapateiro vive com a mulher Mariana. As longas conversas dos dois revelam um Saramago já familiarizado com as lutas operárias e com a rotina dos trabalhadores pobres. O próprio autor foi serralheiro mecânico, não cursou o ensino superior, apenas escola técnica, mas era leitor ávido e frequentava diversas bibliotecas, onde formou seu pensamento crítico e as convicções políticas e sociais.

Silvestre é uma espécie de alter-ego mais velho do autor (Saramago estava com 31 anos quando concluiu Claraboia), que coloca na boca do sapateiro as suas ideias sobre a humanidade. Mas é também uma das muitas recriações do avô Jerônimo, figura icônica na vida e na formação do jovem José. Quando o escritor recebeu o Nobel de Literatura, em 1998, iniciou seu discurso de agradecimento louvando o avô. Ficou célebre o trecho inicial, em que ele diz que o homem mais sábio que conheceu, ‘não sabia ler nem escrever’, referindo-se a Jerônimo.

Os outros moradores do edifício são: a bela e sedutora Lídia, que por seu estilo de vida livre e por ser sustentada pelo amante Paulino Morais, enfrenta os julgamentos velados da vizinhança; as costureiras Adriana e Isaura, as sonhadoras irmãs solteiras que vivem com a mãe Cândida e a severa tia Amélia; o caixeiro viajante Emílio e a esposa Cármen, espanhola da Galícia, junto com o filho deles de seis anos, Henriquinho; o linotipista Caetano e a mulher Justina, em luto fechado após a morte da única filha; e, por fim, o empregado do comércio Anselmo, com a mulher Rosália e a filha Claudinha, que é fascinada pelo glamour da vida da vizinha do andar de cima, Lídia.

As mágoas e ressentimentos dos personagens entre si e pelos vizinhos, o que faz com que alguns deles tenham atitudes eticamente condenáveis, demonstram a crítica social incutida nas páginas de Claraboia. Os anos 1950 e seus muitos tabus sexuais e sociais, são representados nesse microcosmo do edifício, com seus moradores cheios de preconceitos e do conservadorismo típico da cultura do período, seja na histórica Lisboa, no Brasil colonizado pelos portugueses ou nos Estados Unidos do american way of life.

Ler Claraboia é como transpor para a Europa do pós-II Guerra aquele cenário das donas de casa entediadas e fofoqueiras, com seus maridos hipócritas e metidos a baluartes da moral e dos bons costumes, que vemos tão bem representados nos filmes de época. No entanto, embora seja a crônica de uma geração, muito do que o livro mostra, principalmente sobre o provincianismo da classe média mundo afora, persiste nesse avançar do século XXI.

Como as demais obras de José Saramago, Claraboia, com seus 64 anos, não envelhecerá enquanto a humanidade, lamentavelmente, for do jeito que é!

site: https://mardehistorias.wordpress.com/
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HonorLu 29/10/2019

Literatura é processo
Aqui temos Samarago em seus primeiros passos como escritor. Ainda uma semente. O livro é bom, mas lento. Demorei para ler.
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Biblioteca Álvaro Guerra 17/01/2020

Um romance com inquestionáveis qualidades, preciso e escrito com perfeito domínio do espaço narrativo. O leitor habituado ao estilo tardio de Saramago tem a oportunidade de reconhecer nesta obra de juventude as origens de numerosos procedimentos ficcionais consolidados em outros de seus livros.

Empreste esse livro na biblioteca pública.

Livro disponível para empréstimo nas Bibliotecas Municipais de São Paulo. Basta reservar! De graça!

site: http://bibliotecacircula.prefeitura.sp.gov.br/pesquisa/isbn/9788535919837
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Cintia F. Leite 29/01/2020

Belo E Poético Sem Deixar De Fora A Realidade
Claraboia não é o livro mais conhecido de Saramago, no entanto, se eu puder aconselhar alguém que queria conhecer a vasta obra literária desse escritor, indico Claraboia, um dos primeiros livros escritos por ele e surpreendentemente, foi um dos últimos a serem publicados. O motivo da minha indicação, se dá pelo único fato, Claraboia quando foi escrito, ainda não continha o estilo tão característico de Saramago, isto é, não possui uma narrativa com longos parágrafos e pouca pontuação. Portanto, essa leitura será mais tranquila e ideal para quem pretende assim como eu, ler mais livros desse grande autor.

José Saramago diz muito através de objetos inanimados das casas e dos fenômenos naturais que cercam todo o cenário, utilizando uma linguagem poética e bonita, é claro. Além disso, o silêncio sempre paira pelos cômodos das casas e entre os personagens, por falta de sintonia, desprezo, raiva contida ou por uma simples discordância num começo de briga que cresce dentro do silêncio para calar opiniões divergentes.

Entrou para minha lista de livros favoritos, para ler a RESENHA COMPLETA, acesse MELKBERG.COM :)
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do subsolo 21/04/2017

No livro a sensação é essa, que você é um observador.
Na verdade parecem mais cronicas misturadas em capítulos.
Os moradores que mais me agradaram foram o Abel e o Anselmo. De resto achei vulgar.
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