Bru 13/08/2020A Utopia- Thomas MoreA Utopia é um clássico do filósofo moderno Thomas More que narra a ilha de Utopo, onde prevalece a riqueza espiritual, o sentimento de comunidade e a extinção da propriedade privada, características totalmente distintas da individualista e desigual Londres onde o filósofo vive. O livro 1 introduz bem a descrição de Utopia que será apresentada no livro 2. É interessante a forma como somos expostos a divergências de opiniões em forma de um diálogo respeitoso entre Morus e Rafael, pois podemos ver em Morus um pouco de nós leitores, incrédulos com um lugar tão diferente do nosso, mas que está interessado em saber mais sobre esse país exótico, por mais que saibamos que ele não existe. Ao longo da descrição sobre Utopia vamos ficando cada vez mais encantados com aquele lugar tão, como diz seu nome, utópico. Mas o que torna o livro interessante não são suas partes utópicas, mas sim as que podemos extrair de úteis e de aplicáveis na realidade.
A sua visão sobre as mulheres é bem abordada, trazendo muitas vezes estas no mesmo patamar que os homens, seja com as mulheres lutando na guerra ou se tornando intelectuais ou sacerdotisas. Por mais que tenha marcas do pensamento patriarcal da época, o que se destaca nele é essa visão a frente de seu tempo.
Como eles lidam com o luto é outro aspecto que torna aquele lugar especial.
A conexão deles com a natureza, a empatia com o próximo, a "tolerância" religiosa (entre aspas, visto que, ateus não são bem vindos), o humanismo, a solidariedade, a humildade, entre outros, são questões que ainda que possam ser questionadas sobre sua eficácia no mundo real e sobre algumas hipocrisias de pensamento dos habitantes , trazem reflexões muito importantes, como a que se pode retirar da seguinte citação: "Também ficam perplexos que o ouro, o qual em si é de todo inútil, seja em toda parte valorizado a tal ponto que o homem, que lhe atribuiu valor para seus próprios fins, recebe ele mesmo um valor menor".
O modo como eles vêem o ouro e a prata é genial, usando-os como penicos e pertences de escravos para trazer uma nova visão que vai de encontro com a supervalorização das coisas materiais. Quando os habitantes de utopia encontram com habitantes de outra nação e esses querem se exibir com seus colares de ouro e roupas requintadas, fracassam na sua intenção de mostrarem superioridade diante daquele povo "antiquado".
Porém, mesmo que o livro exiba um lugar que pode nos fornecer muitos aprendizados e que apresente de forma criativa um local totalmente estranho ao nosso, em que mesmo sem propriedade privada, funciona perfeitamente, existem críticas que podemos fazer à Utopia, mas vou me fixar em somente uma delas: a questão da falta de privacidade. Está é posta à prova em diversos momentos e me sinto muitas vezes diante de uma falta de livre arbítrio acobertado por uma aura de país livre. Por mais que tragam liberdade a seus cidadãos, será que está não é limitada? E existe liberdade se existem limitações? A proibição de jogos de azar, de bordéis, do adultério, de ter relações sexuais antes do casamento sufoca os leitores contemporâneos e traz um questionamento: -será que devemos abrir mão da nossa liberdade individual em prol de viver em uma sociedade igualitária e sem pobreza?
Por fim, A Utopia é um livro muito bom para o que promete, a descrição de um mundo visto como ideal. Em poucas páginas apresenta muito bem esse universo, de forma fluida e bem escrita. E se filtrarmos o impraticável, conseguiremos discussões que podem ser pertinentes até os dias atuais.