Ana Ferreira 17/07/2012
Meigo, mas pouco impressionante
É o inverno de 1946 numa França abalada pelas terríveis consequências da 2ª Grande Guerra. No vilarejo de Selonsville, as pessoas não riem como antes, não sonham, nem tampouco se divertem... Há pouca perspectiva de futuro com uma realidade tão negra: a maioria só tenta sobreviver ao presente e alguns, em contrapartida, ficam esquecidos no passado ao lado daqueles que a guerra, trajada de seu manto de ódio e sangue, levou para longe. É Michel então, um jovem órfão sem qualquer motivo para ser feliz, que mostrará ao povo daquele lugar frio o poder de cura e esperança de um amor puro.
Secretamente apaixonado por sua melhor amiga, Erin, o menino fica apavorado quando num dia, sem qualquer razão aparente, a garota não desperta de seu sono e entra em coma profundo, podendo nunca mais acordar. Desolado, correndo o risco de perder a única pessoa que ama no mundo e sua primeira paixão, Michel sai pelas ruas em busca de ajuda médica, farmacêutica ou qualquer outro milagre que possa fazê-la recobrar a consciência, encontrando sem querer com uma senhora na rua que, misteriosamente, promete ajudá-lo a salvar Erin se o jovem lhe levar, dentro do prazo de uma semana, nove tipos distintos de amor, representados por retalhos em formato de estrelas retirados das roupas dos amantes em questão para que, ao fim, um coração seja tecido com a união de todos eles.
"Porém aquelas estrelas de retalho tinham um sentido. Eram o firmamento que iluminava a noite de alguém muito triste. Alguém que tinha fechado os olhos à vida e resistia a abri-los."
p. 17
Com uma temática cândida, em poucas páginas e numa linguagem simples, Alex Rovira e Francesc Miralles escreveram em Um Coração Cheio de Estrelas uma fábula dos vários significados do amor e, especialmente, de como esse sentimento tão nobre está ligado à esperança em nossas vidas. Desde o começo, nota-se uma antítese entre o comportamento dos cidadãos de Selonsville e o de Michel, todos fadados a uma desgraça nacional, mas ele tão ingênuo e contente com o pouco que tem, com cada momento ao lado de Erin. Também, num inverno muito longo, a ideia fria de tristeza, contrariada pelo calor de quem ainda é capaz de amar e sorrir.
De caráter figurado, a história conta com alguns elementos que se limitam à imaginação, milagrosos, sempre fortalecendo a ideia da crença naquilo que se sonha em alcançar, podendo até mesmo ser interessante ao público infantil, apesar de não fazer parte do catálogo para os mais novos. Não faz parte, aliás, de nenhum catálogo etário, pois a mensagem que carrega consigo é universal, interessante para qualquer idade. Sem uma grande problemática e previsível, no geral, duas partes de Um Coração Cheio de Estrelas que chamaram minha atenção, entretanto, foram a introdução, que conta um caso verídico sobre um desafio vivido por Alex Rovira, impulsionador da criação do livro e emocionante de todas as formas possíveis, e o final, ao qual foram acrescidos trechos de outros autores segmentados entre os nove tipos de amor descobertos por Michel que, por razões óbvias, não compartilharei aqui.
"Perdoar é a única maneira de permitir que os outros possam ser outra coisa, isso é algo que aprendi com meu pai. Se matar um ladrão, você o condena a ser isso para sempre."
p. 73
Trata-se, acima de tudo, de uma leitura simples, daquelas que se fazem numa hora intermediária entre o descanso e o trabalho, deixando, sem grandes dificuldades, um sorriso sincero no rosto de seu leitor ao final.
"Chegará o dia em que, depois de dominar o espaço, os ventos, as marés e a gravidade, dominaremos as energias do amor. E, nesse dia, pela segunda vez na história do mundo, teremos descoberto o fogo."
Telhard de Chardin