gmarquez 29/10/2023
Malo periculosam libertatem quam quietum servitium.
A obra descreve o ideal de Estado e organização de sociedade segundo a visão de Rousseau. Livro essencial para a construção do conhecimento político e um convite para reflexão filosófica da existência e manutenção do Estado e sua relação com o povo. Leitura bem densa, mas para os entusiastas do assunto acaba se tornando agradável.
Trechos marcados:
"O mais forte nunca é forte demais para ser sempre o senhor, se não transformar a força em direito, e a obediência em dever."
"Ceder à força é um ato de necessidade, não de vontade; é no máximo um ato de prudência."
"Convenhamos, então, que a força não constitui o direito, e que somente se está obrigado a obedecer às potências legítimas."
"[...] os homens, vivendo em sua primitiva independência, não mantêm entre si nenhuma relação tão constante para constituir nem o estado de paz nem o estado de guerra; não são, de forma alguma, inimigos naturais. É a relação das coisas, e não dos homens, que constitui a guerra, e o estado de guerra não pode nascer de simples relações pessoais, mas apenas das relações reais."
"[...] entre coisas de naturezas diferentes, não se pode estabelecer nenhuma relação verdadeira.”
“Só então a voz do dever sucede ao impulso físico, e o direito, ao apetite, e o homem, que até então não consideraria senão a si mesmo, se vê forçado a agir sob outros princípios e a consultar sua razão antes de ouvir suas inclinações.”
“O que o homem perde pelo contrato social é a liberdade natural e um direito ilimitado a tudo que o tenta e que ele pode alcançar; o que ele ganha é a liberdade civil e a propriedade de tudo que possui.”
“[…] a liberdade moral, que apenas torna o homem verdadeiramente senhor de si; pois o impulso do mero apetite é escravidão, e a obediência à lei que se prescreve é liberdade.”
“Por si mesmo, o povo sempre quer o bem, mas por si mesmo nem sempre o vê. A vontade geral é sempre reta, mas o juízo que a guia nem sempre é esclarecido.”
“[…] é necessário que ele prive o homem das forças próprias para oferecer-lhe algumas que lhe são alheias e das quais não possa fazer uso sem o auxílio de outrem. Quanto mais estas forças naturais estão mortas e arruinadas, mais as adquiridas são grandiosas e duráveis, mais também a instituição é sólida e perfeita.”
“pode-se adquirir a liberdade; mas jamais recuperá-la”
“Os usurpadores sempre criam ou escolhem essas épocas de distúrbio para fazer aprovar, encobertos pela agitação pública, leis destrutivas que o povo jamais adotaria com o sangue frio. A escolha do momento para a instituição é um dos caracteres mais seguros pelos quais se pode distinguir a obra do legislador da do tirano.”
“[…] e quanto à riqueza, que nenhum cidadão seja tão opulento para poder comprar outro e nenhum tão pobre para ser obrigado a se vender. O que pressupõe, da parte dos grandes, moderação dos bens e de crédito e, da parte dos pequenos, moderação da avareza e de cobiça.*
*Esses dois estados, naturalmente inseparáveis são igualmente funestos para o bem comum; de um saem os tiranos e, do outro, os defensores dos tiranos; é sempre entre eles que se faz o tráfico da liberdade pública: um adquire e o outro vende.”
“O que é então o governo? Um corpo intermediário estabelecido entre os súditos e o soberano para a mútua correspondência, responsável pela execução das leis e manutenção da liberdade civil e política.”
“Mas, como mil eventos podem modificar as relações de um povo, não somente diferentes governos podem ser bons para diversos povos, mas para o mesmo povo em tempos distintos.”
“Assim, a vontade dominante do príncipe não é ou não deve ser senão a vontade geral ou a lei, sua força não é senão a força pública concentrada nele; desde que ele queira realizar por si mesmo qualquer absoluto e independente, a ligação de tudo começa a se afrouxar. Se enfim o príncipe tivesse uma vontade particular mais ativa que a do soberano, e a usasse para obedecer a essa vontade particular da força pública que está em suas mãos, de sorte que se tivesse, por assim dizer, dois soberanos, um de direito e outro de fato, imediatamente a união social desapareceria, e o corpo político seria dissolvido.”
“Assim, a vontade geral é sempre a mais frágil, a vontade de corpo ocupa o segundo lugar, e a vontade particular, a primeira de todos: de modo que, no governo, cada membro é, em primeiro lugar, ele mesmo, em seguida, magistrado e, finalmente, cidadão. Gradação diretamente oposta à que exige a ordem social.”
“Malo periculosam libertatem quam quietum servitium.
Prefiro a liberdade com perigo à paz com escravidão”
“Não é sobre a quantidade de imposições que se deve medir essa carga, mas sobre o caminho que elas devem fazer para retornar às mãos das quais saíram; quando essa circulação é imediata e bem estabelecida, quer se pague pouco ou muito, não importa; o povo é sempre rico e as finanças sempre vão bem. Ao contrário, qualquer pouco que o povo dê, quando esse pouco não retorna para ele, dando sempre, ele rapidamente se esgota; o Estado jamais é rico, e o povo é sempre miserável.”
“As almas vis não creem de forma alguma nos grandes homens: escravos vis sorriem com ar de troça à palavra liberdade.”
“Quando o nó social começa a se afrouxar e o Estado a se enfraquecer, quando os interesses particulares começam a se fazer sentir e as pequenas sociedades a influenciar a grande, o interesse comum se modifica e encontra opostos, a unanimidade não reina mais nas vozes, a vontade geral não é mais vontade de todos, sobrevêm contradições, debates e a melhor opinião não é aceita sem disputas.”
“Reforme as opiniões dos homens e seus costumes se purificarão por si mesmos. Ama-se sempre o que é belo ou o que se considera como tal, é sobre o juízo que surge o engano; de modo que é tal o juízo que se deve regular. Quem julga os costumes, julga a honra, e quem julga a honra toma sua lei de opinião.”
“Dessa forma, das divisões nacionais resultou o politeísmo, e daí resultou a intolerância teológica e civil, que naturalmente é a mesma.”
“Onde a intolerância teológica é admitida, é impossível que ela não tenha efeito civil; e desde que o tenha, o soberano não é mais soberano, mesmo em negócios seculares: a partir desse momento, os sacerdotes são os verdadeiros senhores; os reis são apenas suas autoridades.”