179 17/04/2024
Solaris - Stanislaw Lem (Aleph, 2017)
Quando o psicólogo Kris Kelvin chega ao planeta Solaris para ajudar os cientistas que lá se encontravam a estudar o oceano que envolve o planeta - seu único ser vivo -, encontra a Estação em um estado caótico. Logo descobre que um dos outros habitantes morreu recentemente e que nesse local estranhas aparições adotam a aparência de sujeitos intimamente ligados aos humanos residentes na Estação. Para Kelvin, o espectro que surge e o atormenta assume a forma de sua falecida ex-namorada. Em meio a essa situação conturbada, surgem dilemas que assolam os três cientistas, especialmente no que se trata da natureza desses espectros e da possibilidade de, pela primeira vez desde a sua descoberta há mais de 100 anos, estabelecer contato com o oceano.
No cerne da obra podem ser encontrados dois problemas: os limites cognitivos do homem e a sua visão antropocêntrica. O autor nos apresenta, com certo ceticismo, a ideia da impossibilidade do homem apreender aquilo que extrapola sua capacidade intelectual ou que, para ele, é estranho por completo. Assim, existem dois mitos: primeiro, de que nós seríamos, algum dia, capazes de adquirir todo e qualquer conhecimento; e, também, de que necessitamos de algo que não seja nós mesmos, ou ainda, de que buscamos genuinamente o outro, o estranho. Se frequentemente temos problemas em nos comunicar e dificilmente conseguimos nos entender por completo, quanto mais poderíamos o fazer com formas de vida que se afastam da nossa compreensão. Tudo que resta aos pesquisadores é atribuir ao oceano de Solaris características antropomórficas, tentando, de maneira inevitavelmente infrutífera, compreendê-lo a partir deles mesmos.
É, portanto, uma obra muito instigante e que suscita muitas questões tanto de ordem epistemológica quanto existencial. Kelvin passa por verdadeiras provações e, frente aos seus confrontos, se depara com uma angústia que a muitos de nós é familiar: qual é o seu lugar no mundo? O que fazer frente ao absurdo da vida? Mas o autor vai além, e questiona, a seu modo, sobre o lugar do ser humano no cosmos.
As imagens construídas pelo autor (especialmente o oceano e seus fenômenos, assim como os astros que circundam o planeta e contribuem para alterar as cores e a atmosfera da história) também são muito memoráveis.
O único porém, a meu ver, são os excessos da "solarística", a ciência que tem como objeto de estudo o planeta e o seu habitante. Independentemente se esse aspecto talvez vise criticar o processo acadêmico-científico e suas redundâncias, há longas descrições que martelam (eis o problema) o leitor com a ideia da futilidade de todo o trabalho. Entretanto, ainda é engajante e há algo de interessante e até mesmo poético nesse campo, por vezes...
Enfim, é uma leitura muito recomendada para todos aqueles que se interessam por esses temas, bem como, de forma geral, por romances de ideias.