LT 20/07/2016
"O acaso é uma armadilha do destino."
"Os Demônios de Deus", é o primeiro volume de uma série que a nossa editora parceira Madras lança através do Selo Madras Teen. O selo é voltado para a literatura fantástica e acreditem, esse livro tem na medida exata ingredientes que mexem com os leitores independente de idade. Seja qual for a sua faixa etária, ele vai te deixar desconfortável e mesmo assim, você vai querer lê-lo para saber o que de fato, o autor está fazendo, o que ele pretende? Rá, com toda a certeza a maior proposta desse primeiro volume é o desafio de fazer com que você consiga seguir a leitura, mesmo diante das barreiras naturais que o seu subconsciente vai impor.
“...As pessoas preferem apenas uma imagem construída ou idealizada de si. Viver de realidade pura e fundamental não é tarefa para raça humana.”
É um livro contraditório, que vai fazer a sua mente fervilhar, que mexe com suas convicções e que, ainda que seja uma ficção, mexe com seu eu. A leitura digladia com o que você acredita, com as suas bases, com você. Sim, você sabe que é mera ficção, mas a sua mente involuntariamente se questiona: "Será?"
"Amar não é querer possuir o outro para si. Amar é 'amar apesar de'. Amar apesar das diferenças, dos choques e das decisões contrárias."
O nome da obra chama a atenção, "Os Demônios de Deus", é o título perfeito para o enredo criado por Alexandre Mackenzie, professor de filosofia. O autor e estudioso, utilizou-se de seu conhecimento acadêmico para enriquecer essa obra e deu super certo!
A premissa basicamente gira ao entorno da eterna guerra entre o bem e o mal, o certo e o errado. O que é de fato e ou que não é. Quem realmente pode determinar as respostas corretas para estas questões? Mas quem pode ter certeza que a guerra é deles mesmo? A maior batalha, em verdade, está no nosso interior, nos nossos medos pessoais e na forma com que os transformamos em nossos demônios e monstros reais, os quais, temos de encarar ao decorrer de nossas vidas. Mas, a forma com que Alexandre nos apresenta essa "guerra", essa batalha, é inusitada e diferente. Será que Lúcifer é quem pensamos ser? E Deus, quem ele realmente é? E nós, humanos, o que fazemos de fato na terra e o que realmente somos? Essas e outras questões são levantadas e abordadas pelo autor com maestria, ainda que de forma fictícia. A divagação pós leitura é inevitável, os seus questionamentos sobre o que virá no próximo título dessa saga é natural e você se vê diante de vários dilemas para aceitar e seguir a leitura. A leitura desse livro é um desafio como já disse anteriormente.
"Ainda que o gosto do fel seja amargo, proporciona experiência e conhecimento. Apesar de o mel ter mais valor pelo doce sabor, aprender pela dor é sempre a melhor escolha! - complementou Deus."
Os personagens são diferentes, não é o tipo de leitura que você vá se apegar a algum personagem e ou que vai te fazer querer mais e mais. Na verdade, é uma leitura que bate de frente com todos os seus conceitos de religião, do que você acredita e se você não ler de mente realmente aberta, é possível que não vá apreciar e ou, chegar ao final da leitura. Ainda assim, posso afirmar que o livro é ótimo e a leitura de fácil compreensão.
Acompanhamos em maior parte, o livro sobre o ponto de vista do Dr. Rodrigo Mazal. Um psicólogo e escritor extremamente bem sucedido, suas obras são best-sellers. O Dr., tem um dom natural e incrível para decifrar a alma e comportamentos humanos fazendo facilmente com que, seus pacientes se encarem sem máscaras, que realmente sejam capazes de vê-los como verdadeiramente são e trabalhar a aceitação do ser neles mesmos. Bom filho, bom neto, esposo fiel, pai "adotivo" dedicado, um profissional extremamente bem sucedido, renomado/reconhecido por onde passa e um homem dos mais desejados dentre as mulheres; com um casamento falido, Rodrigo, recebe a visita de Deus e na terapia onde não se sabe quem é o paciente e quem é o Doutor, é onde tudo começa; e Lúcifer, recebe o mesmo direito, o tempo que passou com um, ele passará com o outro e isso, não é um alivio, é na verdade, parte do grande pesadelo em que se transformará a vida do Dr. Mazal. Com Deus e o Diabo em seu "divã", o que esperar disto? Em quem acreditar? E porque Rodrigo? Anjo, humano ou demônio? O que realmente há por trás disso tudo?
"Temem a fantasia criada e acreditam, ainda que parcialmente. Vivemos a irrealidade, de fato. O cérebro não sabe diferenciar o que é real do que é ficção!"
Bom, o livro me tirou totalmente da minha zona de conforto.
Primeiro: porque ele aborda de forma fictícia a religião e apresenta um material real dentre a ficção - com uma visão diferente.
Segundo: porque o autor passeia e brinca lindamente com todas as suas crenças; a imaginação do Alexandre é extraordinária!
Terceiro: porque a relação pai/filha é algo que para mim é sagrado, primordial e no que não se pode tocar (sim, sou a filhinha do Papai e a relação Pai e Filha é sagrada para mim, intocável, indiscutível e é incabível - para mim - que seja vista de forma distorcida, não importa se os laços são de sangue ou não) e o autor brinca até mesmo com esses laços, ainda que Rodrigo seja pai "adotivo" e não biológico de Jane - a filha-, ele é pai dela e confesso que me incomodou um pouco a visão tanto do Pai, quanto da filha em determinados momentos um sobre o outro. Me incomodou o interesse sexual apresentado (que para mim, Pai algum e filha alguma que tenha bases reais de família e a concepção de Pai e filhos amorosos teria um pelo outro - ou de mães para com filhos) entre os dois personagens e principalmente alguns detalhes do fim do livro. É surreal demais para mim! Ainda que tenha criado Jane a partir de certa idade da vida dela, Rodrigo, não é Pai biológico da menina e sim seu padrasto, mas, ele a trata como se fosse sua filha de verdade e por isso, senti-me ainda mais incomodada.
Tirando isso, o livro é sensacional!
"Toda pessoa carece de um padrão, um modelo. É necessário um referencial anterior para que se siga ou rompa com ele. Sem isso um ser humano sente-se isolado. Preso em um outro lugar que não sabe quem é e qual sua função. A existência de algo diferente é a base do pensamento humano. Só assim cria-se o vínculo de aproximação ou repulsa."
A proposta é bem trabalhada e se você mantiver a sua mente aberta e lembrar-se o tempo todo de que, o que você está lendo é um conto ficcional, você vai gostar da leitura!
Como um excelente filósofo, Alexandre, passeia dentre as linhas que escreve, nos leva a refletir, levanta questionamentos que não são confortáveis, porém, feitos de forma natural e quando você nota, está tão envolvido na leitura e nas reflexões dos personagens que não consegue largar o livro.
"Eu tive coragem de ousar e arriscar-me. Minha queda foi circunstancial. Toda decisão é uma escolha. Toda escolha, uma renúncia... Uma perda."
É engraçado, porque, o livro te desafia e ao mesmo tempo, deixa uma sensação de que você está rodando em círculos e que, tudo que é apresentado não te levará a uma conclusão plausível. O autor tenta e em alguns momentos ele realmente consegue dar um nó na sua cabeça. É como se você não quisesse esperar nada do livro porque ele te dá essa sensação e no fim, você espera que ele te surpreenda e Alexandre surpreende com um belo: Continua... Eu classificaria Os Demônio de Deus como um belo thriller, ainda que simples e fácil, a leitura torna-se pesada pelas reflexões que causa. Mexe com seu cérebro revirando sua massa cinzenta em 360 graus diversas vezes.
"Rodrigo sentia que nem sempre seguir em frente representava avanço. Em alguns momentos, não avançar é crescer. Fixar-se nem sempre é estagnar-se, mas ascender com raízes mais profundas, sem a necessidade fatídica de mudar."
Indico o livro por ser uma leitura que desafia seus conceitos e crenças, uma leitura intensa e instigante. É isso. E não esqueça, se optar por lê-lo, leia de mente aberta!
Resenhista: Ana Luz.
site: http://livrosetalgroup.blogspot.com.br/