Luiza 27/06/2021
Um tijolão bom pra quem tem fôlego.
O livro, com certeza, não é fácil de ler. Não por apresentar uma narrativa rebuscada e difícil, mas por ser detalhado ao extremo - é preciso ter paciência e fôlego. De minha parte, como sou fã de Walter Elias Disney, esse estilo minucioso me agradou na maior parte do tempo.
Partes chatas? Sim, há muitas. Foram entediantes os trechos que se demoraram em questões financeiras, na logística desinteressante de suas empresas, nas negociações contratuais ou em detalhes técnicos muito apurados...
Em compensação, outros detalhamentos foram, pra mim, muito envolventes: .sua vida familiar, sua infância, o casamento com Lilian, o período da Guerra, o sucesso ou fracasso das animações, as elucubrações de sua mente genial, sua obstinação, sua personalidade perfeccionista e muitas vezes intimidadora, curiosidades sobre os parques, sobre a criação de Mickey, Donald, Branca de Neve e outros personagens, sua doença no fim da vida etc. Esses trechos eram tão envolventes que eu sempre achava que acabavam depressa demais.
Porém... fica uma pergunta: que Disney era workaholic e visionário, ok, sabemos... Um exemplo de perseverança e dedicação, um sujeito apaixonado por sua arte e convicções. Mas, para além disso, e para além do vício em cigarro (coisa quase que obrigatória naquelas décadas), será que não há passagens picantes e certas "imoralidades" ou bizarrices em sua vida?
Confesso: adoro biografias que mostram o lado sombra desses ícones da nossa história (não importa de que época). Não me atrai apenas conhecer o legado positivo e o lado fascinante dessas personalidades... Saber do lado mais frágil, amargo, escondido, imoral e pervertido desses sujeitos é igualmente (ou mais) saboroso. E esse lado, o lado sombra do Tio Walt, quase não vi. Praticamente zero. Por que será? Tio Walt não tinha tempo pra bizarrices? Ou o autor infelizmente nos poupa disso?
Disney não tinha amantes, não era homossexual, não era violento, não tinha vícios (o do cigarro não conta), nunca cometeu um crime ou contravenção (a não ser falsificar sua idade para servir o exército, nada de mais), não era de fato antissemita, não era racista, não era satanista (segundo muitos teóricos da conspiração)... não era nada fora da curva a não ser um visionário genial perseverante e perfeccionista? Nenhuma fofoquinha bizarra?
Amigos, o livro é muito bom, é uma viagem fantástica na vida e obra de uma dos maiores ícones do século XX... mas creio que Gabler escondeu o lado mais feio do Tio Walt.
Não posso afirmar com 100% de certeza, é uma especulação, mas acho possível que isso tenha ocorrido. Folheando uma biografia sobre James Dean ("James Dean: Tomorrow Never Comes", livro por Darwin Porter, sem publicação no idioma português), o autor escreve que Disney recorria a jovens viris para lhe proporcionarem prazer sexual. Porter diz que ele era homossexual e pagava (o ainda desconhecido) James Dean por favores sexuais. Dean, um sujeito obscuro, emocionalmente conturbado e usuário de drogas, era bissexual e muitas vezes atuava como garoto de programa em seus dias de obscuridade. Será que as histórias sobre Walt, nesta biografia, são verdade? Livros bombásticos como esse não costumam ser publicados no Brasil, uma pena.
Lamentei também que o autor passou muito sucintamente (pra não dizer que c@g0u absolutamente) em relação à experiência de Disney na América Latina. A criação do Zé Carioca não mereceu mais do que uma linha. ☹☹☹
A história do estereotipado papagaio malandro é muito interessante. O que li sobre isso está nos livros dos brasileiríssimos Ruy Castro ("Carmem, uma Biografia") e Ricardo Amaral ("Anos 40: Quando o mundo, enfim, descobriu o Brasil"). Recomendo ambos 💙
Enfim, no cômputo geral, o livro é bom, vale a pena, aprendi muito sobre a obra de Disney e um pouco mais sobre sua vida pessoal, infância, início de carreira, casamento e morte. Sobre podres de verdade, praticamente nada - se é que eles existiram. Mas, baseada na minha experiência literária, invariavelmente existem.
No fim, me emocionei um pouco, mas juro que já li biografias que me fizeram rir pelos cotovelos e também me levaram a lágrimas abundantes. Não foi o caso dessa obra.