Paulo Silas 11/06/2019Uma obra maravilhosa em vários sentidos. O enredo, os diálogos, os personagens, a ambientalização do romance e tudo o cerca tornam o livro algo primoroso e digno de ser lido. Yalom fornece ao leitor muito mais do que um romance no qual cria situações e eventos que ligam personalidades notórias em constante interação, imaginando (com provável acerto) de que modo se dariam caso realmente tivessem acontecido, pois traz também uma síntese bastante séria e robusta do pensamento, das propostas e das ideias do personagens ficto-reais presentes na história. Mesclando ficção e realidade, o autor acerta em cheio na produção de um livro de qualidade que prende a atenção do leitor do início ao fim.
"Quando Nietzsche Chorou" conta a história de uma imaginada relação entre o filósofo Friedrich Nietzsche e o médico Josef Breuer, cuja interação entre esses dois personagens é a responsável pela condução de toda a obra. Preocupada com o estado de saúde de Nietzsche, a cativante Lou Salomé busca ajuda em Josef Breuer, propondo uma espécie de intervenção clínica para salvar o filósofo do martelo. Com o receio de que Nietzsche cometa suicídio, Lou pede a Breuer, médico de renome no qual deposita suas últimas esperanças, para que trate do filósofo a fim de salvá-lo. O problema é que a relação de Lou com Nietzsche não anda bem, de modo que a intervenção clínica deve se dar de maneira secreta com relação à motivação: Nietzsche jamais aceitaria o tratamento caso soubesse que foi proposto por Lou. A dificuldade se estabelece antes mesmo de o tratamento iniciar, o qual mesmo assim prossegue com êxito, na medida do possível em que Lou e Breuer contribuem para o plano posto em prática. Dessa relação entre médico e paciente, Breuer se dá conta que também precisa ser curado de algo. A filosofia de Nietzsche pode lhe ajudar a tratar algumas feridas, sendo o caso oportuno de também se situar na qualidade de paciente. E é dessa forma, alternando-se os papeis de paciente, que Breuer e Nietzsche conduzem sua interessantíssima relação de mútuo aprendizado.
A história encanta. A escrita cativa. Os diálogos são muito bem construídos. Enfim, o livro todo é excelente. A proposta de Yalom em misturar ficção com realidade a partir da interação entre personalidades notórias é uma fórmula que deu muito certo. Breuer, Nietzsche, Lou Salomé e Sigmund Freud estão entre os personagens ficcionalmente reais presentes na obra, cada qual trazendo em seus diálogos muito dos seus pensamentos que os fizeram ser quem foram e ainda são. Reflexões sobre a medicina, filosofia e psicanálise fervilham em cada página do livro, de modo que o leitor além de se deleitar com a própria história em si, acaba ainda tendo contato com muito pensar. Certamente o livro flui melhor para quem já conhece previamente a produção dos personagens presentes na história, não sendo, porém, impeditivo para a leitura por aqueles que desconhecem, até mesmo pelo fato de que "Quando Nietzsche Chorou", para esses, pode servir como um convite ou porta de entrada para conhecer melhor os pensadores para além da obra.
Um livro significativo que vale cada página lida!