Vitoria.Milliole 29/08/2022
Quando Nietzsche Chorou é um romance que mescla ficção e realidade de uma forma que nunca vi antes. A história começa quando Josef Breuer, o maior médico diagnosticador de Viena e mentor de Sigmund Freud, recebe Lou Salomé, uma mulher intrigante que busca ajuda para seu amigo, o professor e filósofo Friedrich Nietzsche, que está doente física e mentalmente. Nietzsche não deve saber que foi a mulher quem providenciou seu encontro com Breuer, mas o maior desafio do médico não é esse. É convencer Nietzsche, o orgulhoso e cabeça dura Nietzsche, aceitar seu tratamento e se abrir com ele.
Ele finalmente tem êxito quando faz uma proposta ao professor: durante um mês, ele ficaria sob observação de Breuer em sua clínica para ter sua saúde física acompanhada e, enquanto isso, usaria seu conhecimento filosófico para curar as angústias do doutor. Uma cura pela outra. A ideia de Breuer era começar dando a Nietzsche o que ele queria ? um paciente ? e então, aos poucos, inverter os papéis e retomar o controle sem que o filósofo percebesse. O que ele não esperava era que, além da recusa de Nietzsche em se abrir, ele próprio acabaria gostando do papel de paciente e o tomando como seu, ignorando seu propósito de curar a mente de Nietzsche. E é ignorando que ele acaba curando: Nietzsche se abre quanto menos Breuer pergunta, e os questionamentos internos de Breuer, muitas vezes, também são os seus.
Agora vamos às observações: eu fiquei boquiaberta conforme ia me dando conta de quantos fatos reais o livro traz. Os personagens centrais, é claro, eu sabia serem figuras reais, assim como Sigmund Freud. Mas me surpreendeu aprender, por exemplo, que Bertha, a paciente por quem Breuer ficou obcecado, também existiu e que realmente foi a primeira a experimentar a terapia pela conversa. Também me surpreendeu que Lou Salomé não só tenha sido uma pessoa real, como o grande amor e desilusão de Nietzsche (será que vem daí a amargura do filósofo para com as mulheres?)
É claro que o encontro entre Breuer e Nietzsche nunca ocorreu. Eles sequer chegaram a se conhecer, até onde se sabe. O autor deixa tudo isso bem claro nas notas ao fim do livro. Da mesma forma que deixa claro que as personalidades e angústias retratadas são reais, baseadas em muita pesquisa.
As conversas entre Nietzsche e Breuer são esclarecedoras. São brilhantes. Ver a forma como ele, tão cabeça dura e amante da solidão, vai aceitando a amizade do doutor aos poucos; ver quando o livro finalmente faz jus ao livro e o filósofo chora; ver cada conselho dado por ele a Breuer: tudo isso é fascinante.
Como uma obra de ficção, é importante saber que, apesar de todos os fatos e nomes reais, é possível que o livro acabe romantizando a imagem do filósofo. No entanto, se sua intenção ao ler é aprender um pouco mais sobre Nietzsche ou até mesmo sobre a história da psicanálise, o livro, junto ao bom e velho Google, é uma excelente porta de entrada.
Quando Nietzsche Chorou é uma verdadeira aula de filosofia, de psicologia e, sobretudo, uma verdadeira lição sobre vida e sentimentos.