Lucas, Bibliotecário 18/07/2024
O desespero diante da morte anunciada
Victor Hugo nos apresenta uma narrativa que se aproxima do formato epistolar. O destinatário, no primeiro momento, indefinido. Ao adentrar o espectro do enredo, entendemos que se trata de bilhetes escritos em meio à insalubridade da masmorra dos apenados, destinados a todos que compõem o complexo e frágil sistema truncado que coexistimos.
Há um personagem sem nome, sem idade, sem profissão cuja história pré-existente nos é desconhecida. Há tão somente o fato dele estar condenado e fincado na antessala de sua execução que será em praça pública através da guilhotina. Assim nos é apresentado o condenado.
No decorrer do livro, o desespero e a perplexidade em relação ao homicídio celebrado pelo Estado crescem exponencialmente O personagem definha ao longo da curta existência que lhe resta absorto em pensamentos e críticas ao que lhe ocorre: desde a recepção da sentença em meio ao tribunal abarrotado de pessoas ao cadafalso que lhe espera cercado por uma multidão ávida por sangue e espetáculo.
O espetáculo do grotesco define essa situação. Victor Hugo sutilmente destila críticas à pena capital, aplicada à esmo numa França pós-revolucionária, não muito tempo após Robespierre e Luis XVI, ambos guilhotinados pela lâmina impiedosa.
A pena de morte é cínica, cruel e desumana. Brutaliza e sistematiza o mal como fonte de entretenimento e de engodo. Disfuncional, não freia a criminalidade, pois sempre haverá candidatos à degola, aos montes. Aquele que outrora aplaudia efusivamente a guilhotina, torna-se o próximo a conhecê-la intimamente.
Portanto, a guilhotina (ou qualquer outro método mortal) mostra-se ineficaz, não obstrui a criminalidade, serve tão somente para o déspota vender a imagem de que a Lei é imperiosa e impiedosa, relegando suas responsabilidades à guilhotina como método de justiça, servindo como palco circense aos que assistem ao subjugo alheio, enquanto a "iuris" de fato é escanteada.
Nenhum agente que compõe o Estado está de fato interessado em fazer justiça, mas em tão somente fazer com que o espetáculo aconteça, não importa o crime, não importa a quem.
Esse livro me lembra outras obras de outros autores: Crime e Castigo e O Idiota do Dostoievski. O cupom falso de Tólstoi. É isto um homem do Primo Levi. Obras que trabalham a morte como consequência de uma sociedade déspota e inconsequente em seus atos.
Recomendo a leitura!