Sô 19/02/2016Quando li pela primeira vez a trilogia Fronteiras do Universo há sete anos, o volume que eu mais tinha gostado era este, embora depois desta releitura tenha percebido o quanto não me lembrava de nada, a não ser aquele final medonhamente triste e da terra dos mortos (provavelmente por causa da capa). Desta vez eu diria que gostei mais do segundo do que deste. O segundo é mais rápido, mais cheio de revelações e infinitamente mais intrigante. No entanto, este aqui consegue ser mais denso. Tão denso que chega a ser chato em certas partes. Dá uma sensação de muita coisa acontecendo e nada ao mesmo tempo.
Surgem anjos (Balthamos e Baruch, puro amor!); a terra dos mortos (interessantíssimo o trajeto até lá e ao mesmo tempo levemente assustador); mais informação a respeito do Pó e de sua função nos vários universos paralelos; a história de Deus; os Mulefas (um dos personagens mais chatos de todos os tempos!) e muitos outros detalhes, uns essenciais e outros nem tanto.
O que mais gostei nesse livro é o background que o autor cria para Deus, a Autoridade. De que Deus seria um anjo, que por ter surgido primeiro, falou para os anjos seguintes que ELE era o criador. Depois de um tempo Ele começa a enfraquecer e por esse motivo transfere a liderança para outro anjo, o Metatron, que tá longe de ser bonzinho. Só que acabei encontrando alguns problemas nessa parte de Deus enfraquecer. Seria porque todos os anjos enfraquecem uma hora? É uma etapa natural? Os anjos morrem também?
Aí a ideia é de que justamente por Ele não ter todo esse poder que nós imaginamos, não temos porque servi-lo. Eu gosto dessa ideia apresentada na história, só queria entender melhor os argumentos para que fizesse sentido dentro do contexto.
E a Autoridade vai aparecer sim mais pra frente, mas tá tão fraco e assustado, coitado, que dá até pena. Passagens assim fazem você pensar o quanto esse autor é ousado. Ele retrata Deus como um impostor, fraco e gagá. Fico imaginando o tanto de hate mail que ele deve ter recebido após a publicação desta obra. Cutucar religião assim requer bolas.
Algumas coisas que me pareceram invenções de última hora e pura enrolação acabaram me incomodando um pouco. Como aquele lance de tentarem matar a Lyra à distância através do fio de cabelo dela. Ou a mudança de lado da Mrs. Coulter o TEMPO TODO. Uma hora ela parece querer proteger a filha, na outra parece querer atacar. No fim acabou acontecendo algo que deveria ser impactante, mas você lê com frieza porque em nenhum momento ficam claras as intenções dela.
Tem outras coisas que não entendi muito bem também, mas aí não sei se é porque escapou da minha atenção ou realmente não fez sentido. Exemplos: a necessidade de fechamento de todas as aberturas dos universos para não escapar Pó. Se tem Pó em todos os universos, qual o problema de vazar entre eles? Ou por que devemos deixar nossos daemons para trás quando ingressamos no mundo dos mortos? O papel da Mary era de ser a cobra para a Lyra, mas quando isso aconteceu? No que ajuda os dois pombinhos apaixonados a concentrar Pó em um determinado local?
Mas apesar disso tudo, a grande proposta da obra é fazer o leitor pensar, a engajar em debates de sabedoria contra a estupidez. De entender que não existe um poder maléfico ou benéfico que age por conta própria. De sair das garras daqueles que querem te manter ignorantes. E isso não é maravilhoso?