spoiler visualizar@leocorreagx 12/06/2024
Esclarecimento como itinerário para autonomia da razão do sujeito
Immanuel Kant, importante filósofo da Idade Moderna, nasceu em 1724, em Königsberg, na antiga Prússia Oriental. Filho de uma família modesta de artesãos e de segmento religioso do protestantismo, foi matriculado ainda criança em uma escola que tinha o pietismo luterano como base. Doutorou-se em filosofia na Universidade de Königsberg e depois passou a lecionar no mesmo local, destacando-se por sua capacidade intelectual e simpatia com os alunos. É conhecido pela elaboração de una filosofia criticista e idealista transcendental, teoria que sistematizou o racionalismo e o empirismo. Em 1804, faleceu na cidade natal, com sinais de demência.
Entre suas vastas obras, o autor publicou o texto Resposta à pergunta: O que é o esclarecimento? para a revista Berlinische Monatsschrift, em 30 de setembro de 1784, respondendo a dúvida de um dos assinantes do periódico. Essa obra realizou um grande marco para a filosofia, de tal modo que o seu conceito de esclarecimento se tornou sinônimo do movimento iluminista que vigorava na Europa.
O filósofo prussiano afirma que o esclarecimento corresponde à capacidade do sujeito servir-se do próprio entendimento, enquanto a menoridade acontece quando o indivíduo, movido pela preguiça e covardia, prefere ser tutorado por outrem, fazendo-se ovelha de um pastor. O homem somente alcançará o esclarecimento quando ousar saber. Assim afirma Kant em sua célebre frase “Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento” (p. 9). Portanto, o homem deve sempre buscar a autonomia da razão, rompendo com os grilhões da escravidão que lhe impedem de expandir o conhecimento.
Kant outorga que o esclarecimento deve caminhar junto da liberdade, constituindo duas asas essenciais que permitem um voo seguro do itinerante por longos caminhos. Quando o sujeito é forçado a obedecer a ordens sem ao menos poder questionar, já está impossibilitado de alcançar o esclarecimento. Portanto, o autor afirma que, para se chegar à maioridade, é necessário que o sujeito faça o uso público e privado da razão. O uso público da razão corresponde à liberdade do homem de expor todas as suas opiniões sobre os fatos em ambiente público, em vista do bem de todos, assim, contribuindo para o progresso da sociedade. O uso privado da razão ocorre quando o sujeito discorda do serviço imposto por seu patrão, mas, ainda assim, deverá cumprir a função do seu cargo.
O filósofo prussiano conclui seu texto questionando se ele e os leitores já viviam em uma época esclarecida, e ele mesmo responde que não, mas em uma era do esclarecimento, pois muitos ainda estavam sobre a tutela de outrem e, por isso, esse caminho deveria ser feito lentamente. Somente assim todos gozariam de seus direitos e já não mais seriam obrigados a viverem como máquinas programadas para obedecer.
Passados quase três séculos, a leitura do texto de Kant se faz necessária, pois, além de ser fruto de sua profunda vida intelectual e de seu conhecimento filosófico, possui aspectos fundamentais que podem contribuir efetivamente na sociedade hodierna. Os avanços tecnológicos, tem sido responsáveis por tornar as pessoas dependentes, condicionando-as a viver na menoridade, impossibilitadas de exercitar o pensamento crítico e criativo.
Todavia, os teóricos da segunda geração da Escola de Frankfurt e o filósofo Michel Foucault questionaram a autonomia da razão proposta por Kant. Até onde, de fato, o exercício autônomo da razão pode contribuir para o desenvolvimento da sociedade, tendo em vista que essa mesma razão é responsável por desenvolver bombas nucleares utilizadas em guerras e que podem dizimar milhões de pessoas em segundos? Será que a autonomia da razão, assim como no mito de Ícaro, poderia fazer o homem voar a lugares distantes, mas de repente fazê-lo também despencar de suas asas da ilusão e do poder? Tudo isso não seria os frutos da própria menoridade combatida por Kant?
Essas críticas em nada diminuem a importância dessa obra kantiana. A sua profunda reflexão sobre a importância do esclarecimento, tão importante para a contemporaneidade, constitui esse texto como leitura obrigatória para todas as pessoas, sobretudo nas escolas, a fim de auxiliar na superação da escassez de pensamentos críticos entre os brasileiros.