Samantha @degraudeletras 12/01/2014PEREIRA, Antônio Olavo. Marcoré. 1 ED. São Paulo. Arqueiro, 2013.
Ainda estou meio incerta de como falar de um livro que me cativou por sua simplicidade. Num misto de enfado e prazer. Enfado do cotidiano tão característico de antigas cidades pequenas e prazer de acompanhar tudo de pertinho através de um observador digno de compaixão.
Pois bem, o tal livro que fez a leitora, a que vos fala (ou escreve), se emocionar foi este que após duas décadas fora do mercado a Editora Arqueiro resolveu relançá-lo e com louvor, não erraram na escolha. Escrito em 1957, Marcoré entrou para a lista dos títulos brasileiros aclamados por sua linguagem enxuta e caricata de cidade interiorana, pois bem, tornou-se uma leitura essencial para quem quer conhecer a literatura brasileira (e com razão).
Quem nos conta a estória é o oficial maior do cartório da cidade, que conhece a vida de todos por causa do seu emprego, quem nasceu ou se separou, todos os documentos passam por suas mãos para serem validados. Com observações minuciosas a respeito da vida daqueles que o rodeia, nosso protagonista, que tem uma vida pacata, é surpreendido com uma notícia que há muito ele já nem esperava ouvir, sua mulher, Silvia, está grávida e agora é para valer. Depois de 10 anos de alarmes falsos, Dr. Leandro (o médico querido da cidade) diz que não restam dúvidas, dessa vez é de verdade.
Com receio do pensamento dos outros, do que iriam achar os machões da cidade... depois de 10 anos de tentativa e só agora a mulher engravidou, talvez pensem que seja filho de outro. E nesse fluxo de consciência (estilo que ficou famoso por meio dos escritos de Clarice Lispector e Virgínia Woolf), Antônio Olavo Pereira nos transporta para o meio de todo aquele mar de incertezas e emoções.
Após o nascimento do filho, o oficial vê-se transformado. Os olhos que antes via a vida dos outros e a cabeça que professava pensamentos sobre tais agora voltam-se para o pequeno menino Marco Aurélio, ou Marcoré. Aos poucos o protagonista se transforma, criando coragem até para enfrentar a sogra, que desde sempre meteu o dedo em seu relacionamento com Sílvia, principalmente por ele ter ido morar com os sogros após o casamento. Depois de todas as lições que o filho pôde lhe proporcionar, o oficial maior, enfim deixa as análises sobre o mundo que o rodeia e passa a olhar para si, acompanhado de uma solidão tamanha que meche com o leitor.
Esse clássico meio matuto é uma indicação formidável para quem tem interesse pela boa literatura, aquela que enriquece e transforma o leitor. Como diz Fabrício Carpinejar, 'a literatura provoca silêncio' e foi assim que Marcoré me roubou as palavras por mais de 15 dias, não sabia bem ao certo o que dizer de um livro que no início me surpreendeu e me fez achar que eu não iria gostar muito da leitura por causa da linguagem nada comum para nossa época, mas que aos poucos me conquistou e ao final entrou em minha alma e fez um reboliço só. Este é Marcoré, a obra que te provoca silêncio.
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