Jesnner 20/02/2023
Só um pouco mais
O período vitoriano, marcado por inúmeras transformações sociais na Inglaterra do século XIX, é caracterizado na literatura por diversas obras consideradas clássicas. Autores como Robert Louis Stevenson, Lewis Carroll, Sir Arthur Conan Doyle, Charlotte, Anne e Emily, destrincharam o cenário urbano conturbado vivido no país, assolado pela desigualdade e pela fumaça das cidades industriais.
Assim como esses autores, Charles Dickens apresenta em Oliver Twist, um retrato da Inglaterra efervescente após a Revolução Industrial. Adultos e crianças trabalhavam muitas horas por dia, em condições insalubres, buscando um salário, ainda que baixíssimo, que pudesse trazer as mínimas condições de vida para a classe operária. Aqueles que não se sujeitavam ao trabalho nas fábricas, estavam condenados à morte ou ao crime, prática que tomou conta das grandes cidades inglesas.
É nesse espaço que ganha vida o personagem principal. Oliver é um garoto pobre, órfão, que não conhece os pais e sofre com o estigma de ser uma criança miserável em um orfanato superlotado. Longe de qualquer carinho e cuidado, decide fugir antes que tivesse fim ainda mais triste. Em Londres, o garoto é presa fácil nas garras do velho Fagin e do bandido Sikes, dois exploradores infantis que mantêm uma verdadeira gangue de crianças sem-teto.
Os acontecimentos, muitas vezes incrivelmente tristes, expõem o jovem Oliver à crueldade da natureza humana, dialogando com todo o sofrimento inerente à época. Oliver é massacrado de várias formas, mas sem perder a pureza juvenil e a bondade, quase como uma exceção à regra dos meninos miseráveis à sua volta. Como se o meio não pudesse corromper a inocência quase angelical do jovem rapaz.
Entre as reviravoltas de sua jornada, Oliver Twist, cujo nome é dado de forma aleatória, sempre vive entre o bem e o mal, sendo muitas vezes acolhido por "estranhos" e voltando à casa de Fagin, convivendo novamente com o maltrato.
A obra de Dickens, que muitas vezes parece apenas infantil, conversa, principalmente nos últimos capítulos, com retratos crus da sociedade inglesa da época. Temas como a morte, a violência, até mesmo a barbárie, são colocados de forma dura e surpreendente.
Não se pode negar que Dickens retrata um ponto de vista estereotipado da sociedade inglesa. É uma visão que parte de um país repleto de dogmas e contribui para uma construção puritana e patriota. Ainda assim, Oliver Twist também não deixa de tocar temas sensíveis e apresentar ironicamente algumas camadas populares inglesas: a hipocrisia, o falso moralismo, a corrupção de instituições. Está tudo ali, coexistindo no mesmo ambiente, o que faz do livro muito prazeroso de descobrir e desvendar.