Kleyton0 26/10/2013Expectativa abalada, mas continuo gostando dela. Patrícia Highsmith traz novamente o manipulador e inescrupuloso Tom Ripley, contudo, preocupou-se mais com o esmero e eficiência na escrita no decorrer da trama do que em desenvolver uma dinâmica de suspense ágil e eletrizante envolvendo vários assassinatos, inúmeras fraudes, dissimulação de caráter e mentiras contadas em excesso pelo protagonista e tendo sempre uma investigação policial e jornalistas sensacionalistas no encalço de seus crimes (meio que retardados e que não assistiam CSI na TV da década de 70), fatores fortes da narrativa do volume anterior.
A linguagem foi simples ao explorar um assunto por vezes chato, falsificação e venda de pinturas, permeada por descrições falhas sobre o conteúdo pincelado nas telas meticulosamente batizadas com nomes sugestivos: “As cadeiras Vermelhas”, “A Banheira” ou “O Relógio”... muito tosco.
Retratou um perfil psicológico superficial para todos os personagens, Ripley é um psicopata do tipo ambicioso que teve poucas reflexões e conflitos sobre a natureza e consequências do próprio comportamento doentio constantemente premeditado e artificial, ou seja, consciente ao extremo, também houve momentos escassos onde ele se auto admira pelas desonestas conquistas materiais que já tem no currículo, ocasiões que provocam no leitor empatia, cumplicidade ou aversão a conduta do anti-herói.
No primeiro livro, O Sol por Testemunha, Marge, a namorada de Dickie, faz um retrato preciso sobre Tom Ripley: "Está bem, ele pode não ser bicha. É um nada, pior ainda. Não é normal o suficiente para ter qualquer tipo de vida sexual". Ou é certo pensar que ele é um ser assexuado em função da personalidade antissocial e palpáveis frustrações amorosas da autora... rsrsr. Porém, nesta segunda estória Tom aparece contando com mais de 30 de idade e de supetão casado há 3 anos com uma francesa fútil e mimada numa cerimônia sem convidados. Acompanhe as páginas 184 e 185: [Heloise existia. Era estranho para Tom. Ele não conseguia entender os objetivos dela na vida. Ela era como um quadro na parede. Ela lhe dissera que talvez quisesse filho algum dia. Nesse meio tempo, ela existia. Não que pudesse se vangloriar de ter objetivos, especialmente agora que havia alcançado o tipo de vida que levava, mas Tom de certa forma deleitava-se ao alcançar os prazeres que conseguia alcançar, e esse tipo de deleite parecia faltar a Heloisa talvez porque ela sempre tivesse tido tudo o que quis, desde que nascera. Às vezes Tom se sentia estranho fazendo amor com ela, porque se sentia parcialmente distante, e era como se ele tirasse prazer de alguma coisa inanimada, irreal, de um corpo sem uma identidade.
Ou será que isso era vergonha ou puritanismo de sua parte? Ou algum temor de se entregar (mentalmente) completo, o que seria dizer a si próprio: "Se eu não a tivesse, se eu perdesse Heloise, não poderia mais viver". Tom sabia que era capaz de acreditar naquilo, mesmo em relação a Heloise, mas não gostava de admiti-lo para si próprio, nem permiti-lo, e certamente nunca havia dito isso para Heloise, porque (da maneira como as coisas estavam agora) seria uma mentira. A condição de absoluta dependência dela, ele sentia apenas como uma possibilidade. Tinha pouco a ver com sexo, pensou Tom, com qualquer dependência disso. Geralmente Heloise era amoral e desrespeitava as mesmas coisas que ele. De certa forma, ela era uma parceira, ainda que passiva. Com um rapaz ou homem, Tom teria rido muito mais — talvez essa fosse a principal diferença.] É patética a impotência e até mesmo necessidade que Ripley manifestou ao relatar suas práticas proibidas quase que para todos os personagens secundários da trama. E a dúvida que ainda permanece: Tom é um gay enrustido poderosamente ávido por amor ? Hum... Seria este o motivo que fez com que sentisse remorso ao explorar o talento do depressivo e surtado Bernard a ponto de suportar um comportamento tão desequilibrado.
Por último, Patrícia subestima a inteligência do leitor num desfecho que é uma violência as leis da lógica construídas no desenrolar do livro lido deixando no final inúmeras pontas soltas e inacabadas.
Descontadas as imperfeições somou pouco a sequência literária protagonizada por Ripley e prefiro acreditar que o próximo volume será melhor. Recomendo ver o filme: "Ripley no Limite" com Barry Pepper e ouvir a atriz que interpreta a Heloise falar inglês com sotaque francês por demais bonitinho.
O verdadeiro infortúnio fica por conta das editoras que publicaram obras com o mesmo conteúdo, porém títulos diferentes.