Antonio 10/01/2015
RIO NOIR
Para quem gosta de suspense, investigação e crimes, essa coletânea é um prato cheio. Cheio de temperos variados, já que os autores dos contos não podiam ser mais diferentes entre si: de MV Bill a Adriana Lisboa, numa soma que conseguiu (isso é raro) manter o nível e criar unidade.
Eu já estava pronto para dizer ao começar a leitura: uma coletânea desigual, como são todas as coletâneas. Mas ou o projeto foi muito bem encaminhado por Tony Bellotto, ou todos os autores têm mesmo uma veia para o suspense. A ideia de escrever sobre um bairro específico deu certo — de alguma forma, a cidade vai se encaixando como peças de um quebra-cabeça. (A proposta original veio dos EUA, o projeto NOIR é uma parceria com a Akashic Books).
O melhor de todos os contos é Fim de Semana em São Conrado, de Luiz Eduardo Soares. Curiosamente, ele é um especialista em segurança pública, teve cargos públicos no governo federal e no estado do Rio. Ou seja, não é um escritor de carreira, mas conhece a fundo o tema — reforçando a tese de que é preciso conhecer bem um assunto para escrever sobre ele (o que é por sinal a base do conto do jovem Raphael Montes). Além de desenvolver uma investigação policial (a base para o Noir), Soares casa perfeitamente a história com a geografia do bairro São Conrado.
Divertido é RJ-171, que aposta no humor, além do mistério. Mas fica difícil não pensar que o autor Guilherme Fiúza se inspirou em Narcisa Tamborindeguy (sua namorada na vida real) para compor a socialite Laura Guimarães Furtado, um ‘furação’, como ele define. As duas são exageradas, irreais e incontroláveis. Diversão na certa.
A criatividade explode em O Enigma da Vitrola, de Arnaldo Bloch. Sem se preocupar em criar um suspense policial, ele conta a sua relação com Jacarepaguá, abusando das assonâncias, aliterações e rimas, além de citar letras de músicas (gente, muito bom!), e provando que a linguagem pode, sim, ser trabalhada artisticamente sem que isso seja uma barreira para se contar a história. A linguagem, nesse caso, é personagem.
Os contos abusam das paródias e dos estereótipos, com uma quedinha para as prostitutas e prostitutos. Isso não impede que a literatura seja boa... agora, que a paródia nunca vai ser tão boa quanto a criação original, isso é inegável. Em certo momento, um personagem diz que o policial brasileiro ‘precisa desempacar’ — o que é verdade. Talvez esse livro seja um passo nessa direção, embora alguns contos tenham passagens inverossímeis, o que é um pecado nesse gênero (nesse caso, se sustentam pelo humor).
Outros contos de destaque: A História de Georges Fullar, de Raphael Montes, O Enforcado, de Adriana Lisboa, Táxi Argentino, de Arthur Dapieve. Valeria a pena citar outros, mas também vale a pena ler o livro e descobrir como cada um se desincumbiu da tarefa. As histórias fisgam. Os finais, por serem vários os autores, são muitas vezes imprevisíveis...
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