Naty__ 13/05/2015O lado mais sombrio de um crápula. Imperdível! “Seria preciso ter um coração tão puro
Nesta lama ver escondido o sol
Seria preciso amar de verdade
Não ter medo” (p.135).
Para ser sincera, quando finalizei a leitura, fiquei sem saber exatamente o que dizer na resenha. Afinal, a obra é diferente de tudo o que li e até mesmo tudo o que já assisti. Como falar de um livro que trata a visão de um crápula? Como argumentar sobre a mente de um canalha que, em muitos momentos, nos faz cometer o maior de nossos erros ao torcer por sua vitória?
É difícil explicar a sensação que senti ao embarcar nesse livro, mas de uma coisa eu tinha certeza: não queria parar. Carlotto nos faz ter uma visão de um verdadeiro crápula da forma mais cruel, ardilosa e deliciosa, se isso for possível. É algo diferente para todos nós, acredito. Parece-me algo intangível, porém, no decorrer da leitura percebi que era apenas questão de adaptação. No entanto, desde o início já me vi viciada nesse diferencial exposto pelo autor.
Você não vai querer torcer pelo bonzinho e muito menos desejará que o vilão seja lançado no inferno. O que Carlotto nos faz sentir é um verdadeiro pecado: desejamos que o malvado Giorgio Pellegrini se dê bem e, muito, por sinal. Nosso querido vilão é um ex-militante de extrema-esquerda; ele traiu a todos os seus antigos camaradas para fugir da prisão. Como se isso fosse o bastante, o protagonista nos revela seu lado sedutor para conquistar as mulheres e roubá-las. Sentindo-se o centro das atenções, ele pega gosto pelo crime ao tentar forjar um recomeço político que lhe permite entrar na alta sociedade. Todavia, nem tudo são flores e Pellegrini passará por bons bocados para enxergar as inúmeras coisas que ele fez errado; mas isso não quer dizer que ele irá parar...
“Quando alguém está na prisão, sempre pensa em qual será a primeira coisa que fará em liberdade. O meu desejo se chamava Dufour. Entrei na primeira confeitaria e comprei uma caixa inteira. Mas assim que abri, me dei conta de que havia algo errado” (p.25).
O leitor se vê preso à realidade de um vilão e não a uma rotina de descobertas criminosas. Estamos acostumados, em um romance policial, a ver o detetive em busca do verdadeiro culpado e em busca da justiça. Aqui, a coisa é diferente; esse livro nos faz enxergar como as pessoas são capazes de influenciar as outras e como isso pode prejudicar tanto essas quanto aquelas, podendo levar muitos inocentes à morte.
É difícil imaginar que, em um livro de 144 páginas, o autor conseguiria desenvolver tanto suas habilidades e prender o leitor. A escrita de Carlotto é bem simples e alguns termos usados são bem pesados, mas acredito que isso seja um elemento característico e essencial, por abordar o diário de um crápula.
Enquanto escrevo esta resenha, impossível não ouvir “Insieme a te non ci sto più” (Com você, nunca mais), de Caterina Caselli, música citada no livro e que embalava a tolice de ambos amantes, fazendo-nos enxergar a essência de nosso vilão. Então, ele declama: “Arrivederci amore, ciao, le nubi sono già più (Até à vista, amor, tchau, as nuvens já vão longe).
“Eu me sentira seguro demais. E foi um erro imperdoável. Só pode se sentir seguro na vida quem nunca fez nada fora das regras. Alguém como eu só podia confiar nas probabilidades” (p.117).
Mais do que uma revelação, essa obra nos faz enxergar as piores pessoas que existem em nós. Muitos acobertam tantas coisas, enquanto esse crápula age de forma fria, calculada e sequer se importa com o que os outros pensam. Essa é a diferença, gritante, daqueles que desejam fazer o mal e daqueles que realmente fazem. Existe uma linha tênue entre querer e fazer; mas existe uma grande distância entre agir por egoísmo, visando a vontade ardente e evitar fazê-la em virtude das consequências. Encontre o seu lado, mas, antes, leia esse livro e descubra o de Pellegrini. Delicie-se!