Anna Christina 12/05/2016
Quantos anos você tem?
A pergunta acima pode determinar como você vai se sentir ao ler este livro. Se você for um adolescente, ou for muito identificada com este período da sua vida, vai enxergar uma coisa. Já se, como eu, você já viu muitas crianças virarem adolescentes e adolescentes virarem adultos, o seu ponto de vista vai ser outro.
Jenny é uma médica, clínica geral, que trabalha numa clínica popular. É casada com um neurocirurgião do tipo estelar, bonito e bem sucedido. Eles tem três filhos, os gêmeos Theo e Ed, prestes a terminar o colégio, e Naomi, de 15 anos. É Naomi "A Filha" do título.
Atriz principal na peça da escola, Naomi desaparece sem deixar rastros. Os dias que antecedem seu desaparecimento e os dias seguintes são contados, alternadamente, com os dias atuais da vida de Jenny, um ano depois. As mudanças de capítulos tornam este livro difícil de ser deixado de lado, sempre há um gancho irresistível que faz com que a gente queira saber o que houve um ano atrás.
Antes do desaparecimento, Jenny se sentia sortuda. Mas tão sortuda que, aparentemente, não podia reclamar de nada: qualquer queixa seria ingratidão. A culpa que ela sente o tempo todo é a única coisa que não muda com o sumiço da filha. Culpa por ter uma casa tão bonita, culpa por ter dinheiro, culpa por não ter diagnosticado uma jovem paciente corretamente, culpa por enxergar o comportamento dos filhos se deteriorando, mas não ser capaz de refreá-los, culpa por acreditar que enxergar as imperfeições dos filhos é um defeito dela, e não deles.
E aqui volto a dizer que, talvez, a sua idade vá te fazer ter uma opinião ou outra sobre Jenny, sobre Naomi, sobre o que aconteceu. Você pode enxergar uma mãe muito protetora ou pode enxergar uma filha muito rebelde. Pode enxergar uma mãe ausente ou uma filha que simplesmente não se importa com nada.
Linha a linha, acompanhamos as pequenas descobertas de Jenny: Naomi estava fumando. Estava bebendo. Naomi tinha sorrisos misteriosos. Mesmo assim, esses pequenos sinais não são suficientes para dar uma pista de tudo o que ela vai descobrir depois do desaparecimento. Toda uma vida que ela simplesmente não conseguia ou não queria ver por conta da sua culpa eterna.
Algumas pessoas vão enxergar uma mãe negligente, que prefere deixar as coisas de lado sem se aprofundar nos problemas dos filhos. Já eu enxerguei uma mãe que, por trabalhar muito, tentava ter apenas bons momentos com os filhos quando estava por perto, tentava permitir a eles que tivessem liberdade e que não se sentissem pressionados por ela. O que é muito triste, porque revela uma dinâmica familiar tão comum hoje em dia, em que os pais se sentem impotentes perante os desejos e atitudes dos filhos.
Ao longo de toda a investigação, Jenny descobre que todo mundo, em algum momento, mentiu para ela. E que todas essas mentiras, quando reveladas, permitiriam que o destino de Naomi fosse descoberto. Ainda assim, as mesmas pessoas que escondiam segredos, contavam mentiras, não se sentiam culpadas: a culpa era de Jenny. Quando a gente se coloca neste papel, todo mundo em volta enxerga o mesmo....
O que mais gostei na personalidade de Jenny é que ela nunca se vitimiza, mesmo quando atacada. Ela sofre, luta, não desiste. Ela mastiga as verdades e se revolta com elas, e é isso que a faz seguir até descobrir.
A prosa é boa, o ritmo é atraente e o final, se não é o que eu gostaria mais, não compromete. Para quem gosta de um bom thriller, vale a leitura.