spoiler visualizarBia 01/01/2023
Deixarei aqui a resenha que fiz em dezembro de 2017:
A leitura do Les Misérables, do Victor Hugo, escrita em 1862, é fruto dos meus impulsos repentinos que mal começam e já terminam: projeto de leitura dos grandes cânones da literatura. Porém, confesso que o que me fez ter folego para nadar nessas mais de 1500 páginas foi, sobretudo, o centro de discussão abordada por todas as resenhas vistas previamente a leitura, o que, segundo essas fontes, seria a desigualdade social. Sem sobra de dúvidas, Victor Hugo espreita os becos de Paris colocando sobre holofotes personagem que sempre estiveram – vale ressaltar que ainda estão – a margem da sociedade: prisioneiros, prostitutas, crianças de rua, homens e mulheres pobres, miseráveis. Foi isto o que mais me cativou. Após a leitura, estou, portanto, satisfeita? Em parte. Mas antes de entrar nesse mérito, convém dizer ainda algumas palavras. O romance que aqui se discute tem como cenário histórico um momento efervescente em Paris, principalmente com o fim da batalha de Walterloo, logo, a queda de Napoleão e a pose de um novo rei que, no fim, acabou sendo mais do mesmo, isto é, a monarquia ainda continuava sendo uma monarquia. Nisso, as discussões entre o povo se afloram, as perspectivas se ampliam e abre-se horizontes que por ora parece dizer somente sobre sonhos e utopias, mas se solidificam sobre a promessa de uma palavra: revolução. É na pronuncia dessa palavra que, para mim, se resume os momentos mais bonitos desse livro. Note que digo momentos, no plural, pois não me refiro somente ao ato da barricada, apesar de ser uma construção narrativa sublime, mas reviro-me também a revolução da consciência dos personagens, cito o Jean Valjean e Javert. Para Jean Valjean um ato do Monsenhor Bienvenu serviu-lhe para mudar-lhe, para ressurgir-se. Para Javert, bastou um ato de Jean Valjean para repensar a si mesmo. Foi uma revolução interna, tão violenta como qualquer outra, que quando não se sai morto, se sai ferido, com a convicta esperança de se fazer do velho o novo. E Jean Valjean fez-se novo, sem em momento algum esquecer-se do que era. Cobiçável essa grande força. Força essa que não diz respeito aos músculos, mas a alma. Jean Valjean é um personagem admirável, mas nem de longe o meu personagem favorito. Gosto mesmo é da astúcia do moleque que é Gravoche; ele que não possuía nada, mas possuía tudo: vida. E até isso o foi tirado! E o que dizer então de Éponine? Esperta e independente. Sabia ser-se. Não deixava que nenhuma figura masculina dominasse o seu ímpeto. Seja o seu pai, como figura de autoridade, seja Marius com sua paixão. Já que expus os meus grandes personagens, sinto-me no dever de falar sobre a minha decepção com a Cosette. Ouvi em algum lugar que ela seria a central personagem, já que ela é a figura que liga a teia dos principais personagens do livro. Contudo, apesar da sua importante função no enredo, Cosette para mim é uma das mulheres mais rasas que já li a respeito. Muito me incomoda o fato dela não se preocupar em nenhum momento com seu passado; não se interrogar quem é o homem que passou a chamar de pai. Cosette só pensava e via Marius. Dizem que o amor é cego. No entanto, nesse caso, digo que ele cega.