Apologia de Sócrates

Apologia de Sócrates Platão
Platão




Resenhas - Apologia de Sócrates


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Gustavo.Querino 14/04/2022

O homem que seguia seu daímôn
A apologia de Sócrates é, em última instância, um relato das consequências últimas de Sócrates viver sua vida seguindo, lealmente, sua consciência.
Esclarecendo melhor os acontecimentos narrados no livro por Platão, discípulo de Sócrates, temos diante de nós o grande filósofo sentado no banco dos réus. Sócrates era acusado de recusar o culto devido aos deus do Estado, introduzindo entidades demoníacas (que nada tem a ver com os demônios da modernidade), com isso pervertendo a mocidade e levando-a a cometer os mesmos crimes de ateísmo contra os deuses oficiais, pois só assim ficaria o crime sob a jurisdição do rei, a quem competia a defesa da religião.
Não cabe a mim colocar todos os argumentos de Sócrates para sua defesa, basta ressaltar que ele não era somente um bom expositor, dom que também era compartilhado pelos sofistas, mas ele realmente cria em suas próprias palavras (ao menos afirmava isso), o colocando como alguém que colocou as verdades contidas em suas palavras e a justiça acima de sua própria vida.

"...mas obedecerei aos deuses em vez de obedecer a vós, e enquanto eu respirar e estiver na posse de minhas faculdades, não deixarei de filosofar e de vos exortar ou de instruir cada um."

"Ouço uma voz, e toda vez que isso acontece ela me desvia do que estou a pique de fazer, mas nunca me leva à ação...quem combate verdadeiramente pelo que é justo, se quer ser salvo por algum tempo, deve viver a vida privada, nunca meter-se nos negócios públicos...não há ninguém a quem eu tenha feito concessões com desprezo da justiça e por medo da morte, e que, ao mesmo tempo, por essa recusa de toda concessão, deverei morrer."

O homem ouviu e seguiu sua consciência.
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Clara3322 13/04/2022

O sábio que nada sabe
Um camarada foi acusado de corromper a juventude e reconhecer outros deuses. E o livro, escrito por seu discípulo, se trata da sua defesa.

Apesar de gostar de filosofia, só li porque era preciso no estudo e fui sem expectativas altas. Mas então Platão (ou seria Sócrates?) me surpreendeu.

Eu tinha decidido apenas estudar sobre o livro pra não precisar lê-lo, mas no final acabei lendo. E é bem bacana quando você conhece o "por trás" sabe, o contexto em que foi escrito.

Foi um prazer conhecer o tão famoso Sócrates, apesar da história de que o Platão talvez não tenha sido lá muito fiel à realidade.
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Heloyse 09/04/2022

Muito bom
Esse foi meu primeiro livro de filosofia lido.
É um assunto que sempre me interessou bastante, mas nunca fui atrás de conhecer mais.
Espero que esse seja o primeiro de muitos.
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Alek 07/04/2022

Esclarecedor e pertinente.
A linguagem do livro é, de certa forma, rebuscada. Porém, os tradutores fizeram um serviço sensacional não só em escolher boas palavras para manter a coesão do discurso como também em explicar o porque de suas escolhas e o conteúdo do discurso. Dos 3 diálogos apresentados, o Críton foi o que mais me pareceu importante, pois como estudante de Direito valorizei muito a visão de Sócrates sobre a aplicação de leis, a cidadania e o dever como membro voluntário da sociedade. Recomendo muito a quem gostar de filosofia.
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Khatatau 27/03/2022

O discípulo escrevendo sobre seu mestre
Sempre ouvi falar desse livro, mas nunca parei realmente para ler. Sempre gostei de filosofia e mitologias da Grécia antiga. Esse livro de longe é uma boa porta de entrada para esse esses temas.
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Rodrigo.Monteiro 27/03/2022

Apologia de Sócrates.
Pra estudar filosofia nada melhor do que começar com Platão, as máximas de Sócrates: "só sei que nada sei" e " conhece-te a ti mesmo" podem ser explicada de outra forma como: não dizer o que não sabe e buscar a verdade dentro de si mesmo, respectivamente. É o começo da filosofia.
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Vitoria.Milliole 27/03/2022

Desde que comecei a me interessar por filosofia, Sócrates sempre me encantou. Sua recusa em aceitar o que é ortodoxo, sua maneira de questionar tudo e todos, a forma como defende o conhecimento acima de qualquer coisa... tudo isso me chamou a atenção. Infelizmente, para nós, não deixou nada escrito, então é difícil saber o quanto dele está presente nas obras de seus discípulos, como nessa, escrita por Platão. É difícil negar que Sócrates pode ter sido um personagem inventado não apenas por Platão, mas por todos os seus discípulos. Não porque ele não existiu, mas porque cada um acrescentou a ele um pouco de suas próprias personalidades. De qualquer forma, parece unânime que sua essência era questionar.

Em Apologia de Sócrates, temos, do ponto de vista de Platão, a defesa de Sócrates perante o júri, ao ser acusado de impiedade e corrupção à juventude.

Vez alguma Sócrates parece temer a morte. Do contrário: uma vida sem exame, ou seja, sem investigar, sem questionar, não vale a pena ser vivida. É o que ele diz perante as acusações. E, se tivesse de morrer por isso, ele preferia a mudar sua essência e viver de outra forma que não questionando.

Ao ser questionado à pitonisa de Delfos se havia alguém mais sábio que Sócrates, a resposta foi que não; Sócrates era o mais sábio. Então, ele resolveu questionar os mais sábios dentre os atenienses para comprovar se, de fato, ele era mais sábio que eles. E assim chegou à conclusão de que era mais sábio, não por saber, mas por ter consciência de sua própria ignorância. Todos os demais diziam saber aquilo o que não sabiam.

"Assim, eu ia interrogando a mim mesmo, a respeito do que disse o oráculo, se devia mesmo permanecer como sou, nem sábio da sua sabedoria, nem ignorante da sua ignorância, ou ter ambas as coisas, como eles têm. Em verdade, respondo a mim e ao oráculo que me convém ficar como sou."

É curioso eu ler Platão pra entender não Platão, mas seu mestre, Sócrates. Estou começando meus estudos sobre filosofia, talvez um dia eu retorne a este livro na intenção de estudar o discípulo.
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xablau 16/03/2022

imprescindível
Apesar de descorda de algumas ideias do Platão é inegável que ele é um brilhante escritor, tem momentos que não da para saber se era o Sócrates dizendo ou se era Platão usando o seu mestre para expor suas ideias.
Essa é a principal obra sobre o julgamento de Sócrates e imprescindível para a historia e a filosofia.
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Carol 10/03/2022

Apologia de Sócrates e Críton
São 4 os diálogos de Platão que abordam o julgamento de Sócrates: Eutífron, Apologia de Sócrates, Críton e Fédon. Sendo cada diálogo responsável por abordar uma etapa do processo.

Em apologia de Sócrates, ocorre a Defesa de Sócrates perante o Júri ateniense. Nesse texto ele se defende das duas acusações dirigidas a ele: impiedade e corrupção da juventude. Para se defender da impiedade, Sócrates argumenta que nunca foi um filósofo das coisas naturais, tendo sim interesse pelas coisas humanas: "não obtive esse nome - sábio - por nenhuma outra razão a não ser por causa de uma certa sabedoria. Que tipo de sabedoria é essa? A sabedoria que é humana, talvez. Na realidade, nessa corro o risco de ser sábio". Da outra acusação, ele argumenta que nunca cobrou para ensinar nada (se separando aqui dos sofistas) e todos os que o seguiram fizeram-no por vontade própria "os jovens que seguem comigo gostam de ouvir os homens sendo "inspecionados", e eles mesmos muitas vezes me imitam, ou seja, tentam "inspecionar" outros...".

Em sua defesa, Sócrates também narra sua jornada de inspeção se era de fato o "mais sábio dos atenienses" como foi afirmado pela Pítia de Delfos, comparando sua jornada algumas vezes aos trabalhos de Héracles. Nessa busca, dialogou com homens que eram referências em seus ofícios com a intenção de provar que eles eram mais sábios do que ele e chegando a seguinte conclusão: "Sou sim mais sábio que esse homem; pois corremos o risco de não saber, nenhum dos dois, nada de belo nem de bom, mas enquanto ele pensa saber algo, não sabendo, eu, assim como não sei mesmo, também não penso saber... É provável, portanto, que eu seja mais sábio que ele numa pequena coisa, precisamente nesta: porque aquilo que não sei, também não penso saber."

Sócrates em nenhum momento abaixa a cabeça e conduz sua apologia de maneira altiva, afirmando algumas vezes: "não poderei agir de outro modo nem mesmo se estiver prester a morrer incontáveis vezes", ?a vida sem inspeção não vale a pena ser vivida pelo homem?, inclusive afirmando não temer a morte e atribuindo seu ofício ao divino: "Por isso, então, ainda agora circulando, investigo e interrogo em conformidade com o Deus - se penso que alguém, seja dos cidadãos, seja dos estrangeiros, é sábio. E sempre que me parece que não, prestando um auxílio ao deus, mostro-lhe que não é sábio".

Ao fim, Sócrates foi condenado a morte e começa o Diálogo com Críton, amigo de Sócrates que vai a prisão para auxiliá-lo em sua fuga. Esse diálogo aborda os temas: leis injustas devem ser seguidas? Devo seguir a lei quando não concordo com ela? Vale a pena viver a vida sendo um exilado? Aqui Sócrates se mostra veemente e irredutível em suas ideias, afirmando categoricamente que não se deve fazer o mal de volta e que, após usufruir durante toda a vida das Leis, não tem o direito de recusar-se a cumpri-las.

?Você é tão sábio que esqueceu que do que a mãe, do que o pai e todos os demais antepassados, a pátria é mais mais valiosa, e mais venerável, e mais sagrada, e mais respeitada junto a deuses e homens que têm bom-senso.?

Ambos os diálogos são essenciais para entender mais sobre o modo de vida, de pensar e de agir de Sócrates. Além de uma reflexão interessante sobre temas como justiça ou da importância das leis.
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Rafabrangel 07/03/2022

Um discurso exemplar
O conteúdo em si é impecável. Sócrates dá uma aula não de retórica, mas de virtude e de coragem. O livro é o discurso de um homem que, confrontado com a possibilidade da morte, decide defender a verdade até o fim e funda a filosofia ocidental no processo. Me sinto impedido de dar 5 estrelas por causa do prefácio escrito pelo tradutor, que traz alguns anacronismos que não refletem a natureza do texto.
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Déa 05/03/2022

Ensinamentos deixados por Sócrates na apologia, que apresenta seu julgamento por ser acusado de corromper jovens e desacreditar nos deuses, no qual apresenta sua defesa. Também traz diálogo com Êutifron, sobre piedade e com Críton, no qual Sócrates expõe brilhantemente os motivos de não fugir de sua penalidade. Leitura para admirar e se inspirar.
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Milena12 05/03/2022

Apologia de Sócrates
Estou me aventurando em filosofia, eu relutei para ler esse livro, não seria uma primeira opção de leitura, mas de acordo com as aulas de literatura, ele é o mês de fevereiro - terminado em março.

Eu, particularmente, não gostei do início, me senti um pouco burra sem conseguir acompanhar os diálogos, mas em algumas das partes consegui compreender o pensamento do diálogo.
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ArthurAlves 28/02/2022

Sócrates
O livro se passa inteiramente por diálogo, mas diferente dos diálogos costumeiros, aqui tem falar de uma a três páginas, além disso, nessas falas estão contidos pensamentos filosóficos que infelizmente não consegui acompanhar. Consegui assimilar a ideia principal do livro e suas reflexões, mas não profundamente, o que me leva a pensar que no futuro, com um pouco mais de bagagem, eu retorne a essa obra.
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Sunkey 26/02/2022

APOLOGIA DE SÓCRATES - RESENHA
O objetivo deste texto é apresentar uma resenha da defesa de Sócrates na Apologia. No diálogo nos deparamos com a seguinte pergunta “Não te envergonhas, Sócrates, de te aplicardes a tais ocupações, pelas quais agora está arriscado a morrer?” (28b) Estamos diante de um homem do qual se ouve que é um ateu, alguém que nega os deuses do povo, tão importantes para a manutenção da harmonia social. Esse homem, não só nega os deuses, como corrompe os jovens com suas ideias, disseminando seu ateísmo na mocidade. Suas artimanhas, dizem, é fazer prevalecer a razão mais fraca por meio de uma engenhosa oratória. Não parece, pois que um homem assim deve se envergonhar de sua atividade? Como pode, ainda, ser tão tolo, ao que parece, em fazer tudo isso sabendo que assim se arrisca à morte? Que bem tão grande é esse pelo qual vive que o faz assumir tamanho risco?

O que dizer do processo político que condena tal homem à morte? Está agindo a aristocracia da Polis para proteger os interesses do povo contra um homem ateu que se empenha em corromper os mancebos desse povo? O que dizer dos políticos, dos poetas e dos artífices que juntos se unem para dizer que esse homem, esse velho homem, merece a pena capital? Mas, como veremos, esse homem fez uma das mais lindas defesas que se pode ler, mostrou que aquela aristocracia política estava cometendo uma grave injustiça, que os poetas, políticos e artífices não eram realmente sábios e que toda a acusação contra ele não passava de calúnias. Esse homem, diante de um momento em que esperavam dele que se envergonhasse da atividade filosófica, demonstrou serenidade e provou a todos que, como filósofo, viveu sua vida pela verdade e para se manter fiel à missão que os deuses lhe confiaram.

É, pois, essa defesa da atividade do filósofo, uma apologia que subverte o significado da vergonha, que rompe com os valores aristocráticos e exalta a verdade como o bem maior a ser perseguido, ainda que isso custe a vida, que iremos acompanhar neste trabalho. Para tanto, este trabalho será composto das seguintes partes: (i) questões preliminares da defesa; (ii) investigação da origem das calúnias a Sócrates; (iii) respostas às acusações de Meleto; (iv) a serenidade de Sócrates diante da morte.



I. QUESTÕES PRELIMINARES DA DEFESA



Sócrates inicia o diálogo observando que não usará um discurso aprimorado. Com isso, ele deixa claro que ele não pretende fazer como os sofistas que intentavam persuadir pela oratória sem se preocuparem com a verdade do conteúdo de suas falas. O que importa, na visão socrática, é a verdade e não discursos floridos. Apesar dessa declaração inicial, é possível ver que a Apologia é um dos mais belos discursos já produzidos, as palavras escolhidas revelam uma mente genial e percebe-se que, apesar da modéstia que inicia o discurso e o compromisso pela verdade, essa verdade pode ser expressa sem se abrir mão da beleza das palavras.

Em seguida, Sócrates faz referência a acusações que foram levantadas contra ele. A primeira acusação consiste naqueles que dizem que Sócrates, tendo estudado vários assuntos, intencionalmente faz prevalecer a razão mais fraca por meio de suas artimanhas dialógicas. Outra acusação é a de que Sócrates negava a existência dos deuses. Uma terceira acusação é a de que Sócrates corrompia os mais jovens. Todas essas acusações eram falsas e escondiam o real propósito pelo qual o filósofo viveu. O ponto é que toda acusação falsa, isto é, toda calúnia não surge do nada. Alguma razão há, que foi distorcida, pela qual os inimigos de Sócrates inventaram tais mentiras. A razão desse falatório era a de que Sócrates realmente fazia algo incomum, algo que gerava falatório: ele possuía uma ocupação que gerava incômodo. Se uma pessoa calunia alguém é porque o indivíduo caluniado de alguma forma incomoda o caluniador. Caberia, pois, investigar a origem de tais acusações.



II. INVESTIGAÇÃO DA ORIGEM DAS CALÚNIAS A SÓCRATES



O que na ocupação de Sócrates tanto incomodava? Bem, ao ler o diálogo parece que a resposta está na missão que foi confiada ao filósofo e como ela feria o orgulho dos ditos sábios. Sócrates havia ouvido do oráculo do deus de Delfos que ele era o homem mais sábio. Aqui já temos algumas questões importantes a serem observadas: Sócrates acreditava na declaração proferida por uma revelação divina. Portanto, não se pode acusá-lo de ateísmo. Em segundo lugar, é comum que alguns digam que a filosofia grega surgiu por meio de um rompimento com o mito e com o teológico. Aqui vemos que essa interpretação é um engano, o mito e o divino não foram banidos pela filosofia, pelo contrário, a filosofia platônica recorre em muito a princípios extraídos da mitologia, bem como recorre a analogias míticas para exemplificar suas ideias. Ademais, o aspecto místico e divino continua no interior do pensamento platônico.

De todo modo, Sócrates creu na fala do oráculo como uma verdade, uma verdade que se autojustificava em certo sentido, uma verdade que estava acima de qualquer questionamento mesmo quando os fatos da experiência poderiam parecer contradizê-la. Esse era o caso, aquele que havia sido declarado o mais sábio não conseguia encontrar em si a razão que justificava tal afirmação divina. Como poderia ele ser mais sábio do que todos os sofistas, os poetas, os oradores e todos aqueles que compunham uma certa elite intelectual quando ele mesmo não se via de posse de nenhum conhecimento especial até então? No entanto, o oráculo não se engana. A fé de Sócrates na declaração divina era de que era uma impossibilidade categorial de que ela fosse falsa. E é confiando no caráter absoluto dessa verdade, dessa revelação, que o filósofo, mesmo diante de muitas razões para duvidar de sua sabedoria, decide assumir como sua missão compreender a significação do oráculo.

Sócrates, então, inicia uma missão que lembra a ideia de “falseamento”. Ele sai em busca, não de razões que confirmem a fala do oráculo, mas justamente que possam rebatê-la. Não o faz, no entanto, porque duvidava da declaração do deus de Delfos, mas porque acreditava que confrontando tal afirmação com os dados que poderiam contradizê-la, poderia permitir que seu real significado se desvelasse: “Fui ter com um dos que passam por sábios, porquanto, se havia lugar, era ali que, para rebater o oráculo, mostraria ao deus” (21c). Foi assim que o nosso grande filósofo iniciou uma jornada que feriria o ego dos ditos sábios, fazendo surgir inimigos que fizeram uso da calúnia para lidar com uma ferida narcísica.

Sócrates foi ao encontro dos políticos. Ali declarou a eles que foi chamado de sábio quando não julgava ser enquanto aqueles políticos que se julgavam sábios, se a declaração do oráculo estivesse correta, deveriam não o ser. Os resultados disso foram dois. Para os políticos, tal fala se apresentou como uma afronta a seus egos, despertando neles ódio contra o filósofo. Para o filósofo, tal ocasião foi motivo de reflexão: “Mais sábio do que esse homem eu sou; é bem provável que nenhum de nós saiba nada de bom, mas ele supõe saber alguma coisa e não sabe, enquanto eu, se não sei, tampouco suponho saber. Parece que sou um nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei.” (21e). Ora, pelo menos de posse de um saber estava Sócrates que faltava naqueles políticos, o saber de saber que nada se sabe.

O mesmo método foi repetido com outros que julgavam a si mesmo como sábios e o fim também se mostrou o mesmo. A mesma impressão de ódio por um orgulho ferido foi deixada nos que julgavam a si mesmo sábios e a mesma impressão de estar de posse de um saber que lhes faltava, o saber do próprio não-saber, foi deixada em Sócrates. Tudo isso gerava inimigos a Sócrates, tais atitudes deixavam mágoas pelo caminho e incitava calúnias e oposições. Mas como deve agir o homem de posse de uma missão divina quando a oposição se lhe apresenta? O homem incumbido de um dever ético, por maior razão por uma missão divina, precisa estar disposto a atender a tal dever e missão não importa as consequências negativas que isso gere. O serviço dos deuses possui importância máxima e não se pode recuar ainda que tal serviço faça do fiel servo de sua missão o mais odiado entre os homens.

Após os políticos, Sócrates foi ao encontro dos poetas. Poderiam aqueles que eram autores de tão belas tragédias e épicas narrativas serem inferiores a Sócrates em sabedoria? Para averiguar tal questão, nosso filósofo empenhou-se a fazer aos poetas uma série de questões, desse modo poderia ver, pelas respostas, se eles realmente tinham razões sólidas para dizer o que diziam ou se sua incapacidade de fornecer boas respostas revelaria sua inferioridade cultural. A verdade é que os poetas pareciam não saber falar do que haviam escrito. Era como se desconhecessem as próprias verdades sobre as quais haviam composto e era possível encontrar em seus leitores uma maior compreensão dessas verdades do que nos poetas. Ora, o que poderia explicar o fato de um poeta nada saber sobre a própria sabedoria expressa em sua poesia?

Pareceu a Sócrates que a explicação estava em que os poetas escreviam por dom ou inspiração divina do mesmo modo que o faziam os profetas ou adivinhos. Se uma pessoa escreve algo que revela profunda sabedoria, só poderá dizer que possui mérito caso isso seja resultado do empenho do seu pensamento, do esforço de suas capacidades de raciocínios. Mas se tal pessoa desconhece a sabedoria de sua obra, se não pode explicar por seu empenho o significado de suas composições e se elas são resultado de um dom natural ou de uma revelação sobrenatural, então não é a essa pessoa que pertence o mérito. Não se pode atribuir aos poetas, pois, a sabedoria expressa em suas composições.

Ademais, Sócrates verificou que os poetas, por produzirem sábias poesias, achavam-se sábios em outras áreas, quando na verdade não o eram. Isso lembra, por exemplo, hoje, quando um estudante de alguma especialização, acreditando ser muito inteligente por seus conhecimentos nessa área, crê ser inteligente também para opinar sobre todo e qualquer assunto, assuntos nos quais não é especialista. Ou até mesmo, podemos pensar naqueles que por terem tido um contato inicial com algum conhecimento novo creem estar de posse de um saber que todos os demais desconhecem e passa, então, a pensar a si mesmo como um grande intelectual a quem cabe iluminar os ignorantes. É curioso, pois, perceber, como ainda hoje acreditam ser sábios aqueles que não o são.

Após ter com os filósofos, Sócrates foi ter com os artífices. Não houve dúvidas de que eles conheciam bem suas artes, mas caíam no mesmo erro dos poetas. Por entenderem sua arte, julgavam saber sobre outros campos que desconheciam. Em toda essa busca, Sócrates constatou que havia pessoas que, em certos assuntos, sabiam mais do que ele. Nesses temas específicos, eram mais sábios do que Sócrates. Todavia, caso se perguntasse se tais pessoas estavam de posse do conhecimento da própria ignorância, tal conhecimento faltava a tais homens que julgavam a si mesmo sábios e, portanto, nesse ponto, Sócrates se mostrava mais sábio do que eles.

Parece, claro, aqui, algumas conclusões a que nos levam essa “investigação das razões das calúnias a Sócrates”. Caso olhemos para elas, vemos muitas coisas interessantes. Primeiro, que se pode explicar a origem dos falatórios no orgulho ferido dos poetas, políticos e artífices ou de todos aqueles que julgam a si mesmo como sábios. Em segundo lugar, tal investigação revela a fidelidade de Sócrates ao dever, à ética e à verdade na medida em que ele se entregou incondicionalmente à missão divina e confiou que ao oráculo era impossível mentir. Terceiro, essa investigação revelou qual é a verdadeira sabedoria, essa consiste, não em estar de posse de certos saberes que permita ocupar cargos ou certos ofícios, antes a sabedoria encontra-se na humildade intelectual.



III. RESPOSTAS ÀS ACUSAÇÕES DE MELETO



Após esclarecer a origem das calúnias a ele dirigidas, Sócrates passa a responder a duas acusações feitas por Meleto. Podemos considerar as seguintes acusações e suas respectivas respostas:



Primeira acusação: Sócrates é réu de corromper a mocidade.

Resposta: Sócrates responde mostrando que, para Meleto, todos na sociedade ateniense pareciam educar os jovens enquanto Sócrates era o único a pervertê-los. Ora, mas se isso é assim, parece que não há o que se preocupar. Se a mocidade está cercada de várias boas influências, e apenas uma má, então parece natural que prevaleçam as boas influências. Outra questão é que mesmo que Sócrates corrompesse os jovens não se podia dizer que o fazia voluntariamente, pois não faria sentido que fizesse mal aos de seu convívio por querer, se o fizesse estaria se arriscando a deles receber dano. Mas se o mal praticado por Sócrates é um erro involuntário, não faz sentido que ele seja condenado, bastaria que ele recebesse uma advertência que o tornasse consciente desse erro.



Segunda acusação: Sócrates é réu de não crer nos deuses do povo.

Resposta: Essa acusação consiste em dizer que Sócrates negava os deuses da sociedade, propondo divindades novas em seu lugar. No entanto, ela carrega uma ambiguidade. De um lado, ela poderia ser lida no sentido de que Sócrates é um ateu, de outro que ele cria em divindades diferentes daquelas do povo. Talvez os acusadores misturassem as duas calúnias a fim de criar boatos que pintassem uma imagem negativa de Sócrates como opositor da religião da sociedade. Meleto curiosamente insiste na tese de que Sócrates era completamente ateu. É como se pudesse escolher a forma mais escandalosa de calúnia, aquela que gera a maior polêmica e que afeta os ânimos do povo. Essa calúnia, no entanto, se mostrava evidentemente falsa. Sócrates viveu por uma missão divina conferida pelo oráculo. Ademais, o próprio Meleto sabia da crença de Sócrates nos “daimons”, espíritos tidos como filhos dos deuses. Ora, se alguém crê em seres que são filhos dos deuses, como pode não crer em deuses?



IV. A SERENIDADE DE SÓCRATES DIANTE DA MORTE



No entanto, se a condenação de Sócrates é resultado de difamações feitas por pessoas com o orgulho ferido, por que o filósofo se entrega à morte, por que aceita o julgamento da cidade, por que não foge? Sócrates foi um homem de princípios, entendia que sua vida poderia ser sacrificada em defesa da verdade, estava disposto a entregar-se à morte como um mártir. Ademais, ele não temia a morte porque sabia que as almas justas se unem ao divino no pós-morte. Isso é algo que aparece no Fédon. Embora possa parecer, por um recurso argumentativo, que Sócrates lida com a possibilidade de não haver uma vida no pós-morte, ele o faz para fins retóricos. É como alguém que admite uma possibilidade adotada por parte de seus ouvintes para mostrar que mesmo assumindo tais suposições pode se chegar às conclusões que se pretende argumentar a favor.

No Fédon, Sócrates deixa claro que entende a vida do filósofo como um exercício de preparação para a morte, quando, por fim, a alma poderá se unir aquilo em relação ao qual mais se assemelha. Desse modo, o sábio busca as verdades eternas, seu fim é contemplar as ideias perfeitas, é exercitar a parte racional de sua alma a fim de transcender os instintos e apetites. Portanto, a morte é para o filósofo uma libertação, quando sua alma pode se unir ao divino. O justo não precisa, pois, temer a morte pois a acolhe como uma amiga. Eis, porque, o filósofo encara a morte com serenidade, não busca fugir dela, pois sabe que um destino feliz o espera no porvir. Desse modo, é com alegria, e não com lamento, que Sócrates se encontra perante a morte.

Sócrates está velho, o exílio só significaria mais canseira, a vida feliz que o aguarda do outro lado é a melhor escolha. Mas se o justo pode se alegrar diante da morte, aqueles que matam o justo devem temer. A justiça nunca falha, triste há de ser o fim daqueles que matam um homem por ter sido sempre fiel a uma missão divina. Na verdade, o filósofo é funcionário da sociedade, Sócrates propõe que alguém como ele, deveria era ser sustentado pelo povo. Com grande ingratidão os atenienses retribuem a Sócrates o seu serviço de guiá-los à verdade. Se retribuem o mal com bem devem estar cientes que a retribuição divina aos seus atos virá: “Agora, vamos partir; eu, condenado por vós à morte; eles, condenados pela verdade a seu pecado e a seu crime. Eu aceito a pena imposta; eles igualmente.” (39b) “Eu vos afianço, homens que me mandais matar, que o castigo vos alcançará logo após a minha morte e será, por Zeus, muito mais duro que a pena capital que me impusestes.” (39d).



CONSIDERAÇÕES FINAIS



A aristocracia da Pólis cometeu uma grande injustiça, condenou à morte um homem que lhes ensinou a pensar. Sócrates não saía por aí ensinando um conjunto de verdades, sua atividade, ao contrário, consistia em fazer perguntas para que o próprio interlocutor encontrasse dentro de si as verdades interiores que toda alma carrega consigo. Ensinou que a humildade intelectual é a verdadeira sabedoria. Foi fiel por toda vida aos deveres éticos e nunca renunciou à sua missão divina. Manteve-se firme até a morte e morreu por aquilo que acreditava. Desafiou com coragem aqueles que se julgavam sábios, mas não o eram. E quando uma classe de políticos, poetas e artífices o condenou à morte, não fugiu à sua sina. Revelou a mentira das acusações, exaltou o dever do homem de ser fiel à sua missão, defendeu a atividade filosófica e mostrou, não só por palavras, mas por sua vida inteira, o que significa ser um verdadeiro filósofo.

Quando todos esperavam que ele demonstrasse vergonha, que ele fugisse à morte, que ele renunciasse às suas ideias, mostrou que a coragem é uma virtude que não pode faltar ao filósofo. Assim, ele deixou um exemplo para todos nós. Aprendemos com ele a importância da humildade, da fidelidade à verdade, do compromisso com a ética e do papel do filósofo em não abrir mão de seus princípios quando aqueles que estão no poder se levantam contra ele. Também aprendemos com ele a ver a morte como uma amiga, a encarar o morrer, não com medo, mas com serenidade. Ainda que não precisemos compartilhar da crença socrática de uma vida após a morte, podemos saber que encerraremos o ciclo da existência conscientes de termos vivido de forma justa e em busca da verdade.

site: http://brunosunkey.blogspot.com/2022/02/apologia-de-socrates-resenha_26.html
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spoiler visualizar
Ray of Light 17/02/2022minha estante
Acabei ficando curioso, acho que vou ler


Victor.Oliveira 17/02/2022minha estante
Vale muito a pena, eu adoro a leitura




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