Gabrieli Gudniak 29/09/2018Melhor que os anteriores, mesmos erros.Com os trolls livres de sua maldição, Cécile e Tristan devem se preparar para uma guerra em duas frentes, enquanto os Fey imortais estão novamente livres para andarem e se comunicarem com seu mundo. Cécile deve um favor ao Rei do Verão, Tristan devem um a Rainha do Inverno; enquanto tentam descobrir seus papéis na luta sem fim dos imortais, os dois devem encontrar uma forma de manter a humanidade livre e salva, encontrar uma forma de trazer justiça aos meio-sangue e impedir que os puro-sangue continuem a perpetuar sua barbárie.
Mais uma vez, nossos protagonistas estão na pior situação possível, saber que completaram sua tarefa de libertar o povo de Trollus apenas trás mais questionamentos sobre ser ou não possível que os dois povos convivam em harmonia, ou se o poder dos trolls mais uma vez condenará a humanidade à escravidão.
Assim como eu havia imaginado, os fey desempenham um papel importante na trama, talvez até importante demais para criaturas que pouco vimos, mas isso não chegou a me incomodar. Não gostei da dicotomia entre inverno e verão, pois é muito maniqueísta para um livro que havia se proposto a discutir sobre o que era bom ou ruim. Sem falar que coloca inverno como ruim e verão como bom, temos mais uma vez uma mulher como vilã. Entre os mortais, a situação estava balanceada até certo ponto, mas a Rainha do Inverno é o típico arquétipo de vilã força da natureza. Ela é simplesmente má, não tem personalidade alguma, e isso é cansativo para quem já tem experiência em obras de fantasia.
Os dois personagens principais estão bons, mas seguem o mesmo roteiro do livro anterior. Estão separados, fazem de tudo para se encontrar e, quando se encontram, a primeira coisa que fazem é se separarem de novo. Ver a Cécile dizendo que ela era necessária para capturar Roland, o irmão de oito anos do Tristan, quando qualquer outra bruxa poderia fazer o papel dela, foi risível. Para vencerem a guerra, Tristan precisa estar vivo, para isso, Cécile precisa estar viva também, não faz sentido deixá-la exposta a perigos desnecessários. Se a autora gostaria que ela parecesse mais poderosa, deveria ter lhe dado feitiços mais práticos. Ela acabou parecendo desesperada e infantil em muitos pontos. Tristan está como no livro anterior, com seus planos e subtramas, o desenvolvimento com as sementes foi interessante. É bom vê-lo se tornar mais sombrio conforme o peso de suas ações e do que ele vai ter que fazer cresce.
Mas vamos falar sobre os verdadeiros heróis aqui, os gêmeos, Victoria e Vincent, e Marc. É incrível que três personagens principais tenham uma evolução maior que os protagonistas, além de carregarem uma carga emocional muito maior. Os gêmeos falam sobre lealdade e amor fraternal, mas, acima de tudo, sobre as responsabilidades e a descoberta do que realmente é uma guerra, de perdas e sacrifícios, de coisas que nos são tiradas. Marc parece muito mais decidido nesse livro, ele é quem lidera o grupo de Cécile na investida contra Roland, e, depois, quem toma conta de Trianon enquanto Tristan está sob o efeito das sementes, o que quer dizer que ele toma conta da cidade até a batalha final. Além de administrar toda a cidade, ele também faz a barganha com a Rainha do Inverno.
O que nos leva ao que menos gostei no livro, a morte dele. Ela soou não só desnecessária, mas incongruente. Ele estava cuidando de tudo, ao mesmo tempo que começava um relacionamento com Sabine que, se houvesse tido oportunidade, sem dúvida teria levado a um romance. Sabemos a história dele e o quanto ele sofreu ao perder a mulher e o filho, mas estava vivendo, seguindo em frente, tendo momentos de felicidade. Vê-lo escolher não ser curado, escolher a morte, após a queda, faz parecer que nada daquilo valeu a pena, que nada teve significado. Mas ao mesmo tempo, a falta que ele sentia de Pénélope beirava a loucura, e não acredito que algo bom teria vindo se ele houvesse ido para as terras dos imortais como todos os outros. Entretanto, gostaria de tê-lo visto permanecer com os mortais, ainda que não fosse possível dado o favor ao Rei do Verão, gostaria de vê-lo descobrir o amor e a felicidade de novo, mostrar ao leitor que há sim vida após o luto. A morte dele foi um golpe duro e inesperado, que eu deveria ter visto chegar dada as inclinações da autora.
E mais uma vez, temos o problema do ritmo. Ou não está acontecendo praticamente nada, ou então são tantas coisas que você não consegue nem acompanhar. Como menor livro da série, eu esperava que isso houvesse sido melhorado, mas não foi o que aconteceu. Haviam coisas suficiente acontecendo, mas a autora não soube balanceá-las. Ainda falando sobre a autora, a escrita é mais fluída e agradável, mas ela se perde em longas narrações que se passam apenas na cabeça dos personagens, não ajudando nada no desenvolvimento da trama e quebrando o fluxo dos acontecimentos, e tem certos... Vícios. Eu desisti de contar quantas vezes ela escreveu que um personagem havia feito um "noncommital noise". Isso se repete na trilogia toda e nas duas prequels.
O duque Angoulême era ameaçador, mas não tinha camadas suficientes para ser um bom vilão, mesmo que a autora tenha tentado fazer isso. Novamente, faltou sutileza no trabalho, Thibault, o rei cujo nome posso finalmente escrever por causa do guia de personagens, foi muito mais bem feito, gostei dos desdobramentos o envolvendo. Apenas uma questão me incomodou, foi dito que ele tinha os mesmos ideais que Tristan, mas que matou o pai e a amante meio-sangue quando descobriu que não só havia sido traído por ela, mas que os dois também eram amantes. Após isso, abandonou seus planos e se tornou um tirano, criando o filho mais velho para se tornar o libertador de seu povo. Mas então por que, ao invés de tudo isso, ele não libertou os meio-sangue da escravidão. Ele tinha apoiadores, poder suficiente e agora era rei. O que exatamente o impedia? Ter matado o pai? Porque o pai dele foi colocado como alguém mil vezes pior, então não vejo como o povo poderia se ressentir de ter sido livrado das mãos de um tirano. E sobre a rainha Matilde? Como a loucura dela se instalou? Como foi o começo da relação dela com o rei?
A subtrama com Roland, o fato de ele ser uma criança louca e poderosa, na qual Angoulême tinha todo controle, foi interessante e horrível, servindo para nos mostrar até onde o duque iria ao mandar uma criança matar a própria família. Gostaria que ele tivesse um arco de redenção, mas não nos é dito mais nada depois que ele vai para Arcadia, infelizmente.
Apesar de ter desagradado a muitos, eu adorei o final. Ele foi previsível desde que o Rei do Verão cobrou seu favor, mas isso não atrapalhou em nada. A última visita a Trollus foi nostálgica e dolorosa, ela foi uma prisão para os trolls por séculos, assim como foi sua casa, onde milhares viveram suas vidas, com suas dores e amores. Eu fiquei surpresa ao me sentir dessa forma e feliz pela autora não ter acabado o livro no fim da guerra, revisitar a cidade e lembrar de tudo o que aconteceu lá foi maravilhoso, uma despedida digna à série. O fim agridoce dos mocinhos foi ainda melhor, assim como descobrir qual foi o destino do povo humano que lutaram tanto para proteger, ver os personagens que acompanhamos envelhecendo e tendo suas próprias vidas. Confesso que gostaria de ter visto Cécile e Tristan reinando, mas bastou saber que o filho deles logo reinaria. Os dois terem acabado nas terras imortais levou a duas questões. É dito que, por certo, existem almas, já que é a alma de Cécile que vai para Arcadia, logo, essas almas não desaparecem quando o corpo morre, então para onde elas vão? Tristan diz que Cécile não precisa ficar em Arcadia, que pode ir para esse lugar, mas ele pode ir com ela, sendo um fey agora, ou isso é algo apenas para humanos e trolls, com sua natureza distorcida? Afinal, é repetido várias vezes que os fey são imortais no sentido mais literal da palavra. E uma eternidade é um longo tempo.
Warrior Witch tem seus erros, mas é uma conclusão digna e emocionante.