Lethycia Dias 06/08/2022Decepção em forma de releituraEu me lembrava de ter gostado bastante desse livro quando li pela primeira vez, quase 10 anos atrás. Quando consegui este exemplar, decidi reler para ver como ficava minha opinião depois de tanto tempo, e agora, estou pensando se ainda vale a pena revisitar essas leituras tão antigas.
"O Mulato" é a história de amor trágico e proibido entre Raimundo, homem negro de pele clara que não conhece as próprias origens, e Ana Rosa, filha de um comerciante maranhense e também sua prima. Quando visita o Maranhão para conhecer e vender as propriedades do pai que nunca conheceu, Raimundo se apaixona pela prima e se depara com as barreiras de uma sociedade que não deseja ver pessoas negras em outro lugar que não seja o da escravidão e da subalternidade, pois não importa que ele seja rico, educado na Europa e que tenha parentesco com uma família branca importante, pois ser um "mulato" o torna mal-visto em todos os lugares.
Meu primeiro problema com essa história foi não conseguir acreditar na ingenuidade desses personagens. Desde o início somos apresentados à história do nascimento e da infância de Raimundo e entendemos a circunstâncias pelas quais ele desconhece sua origem. Mas Raimundo chama atenção onde vai pela cor de sua pele e, mesmo quando é inserido numa sociedade escravista, sabendo que é filho de um homem branco, sequer suspeita que sua mãe foi mulher negra escravizada. E da mesma forma, Ana Rosa, que viveu toda a vida nessa sociedade e numa família que faz questão de manter a branquitude a todo custo, também não suspeita em momento algum da origem de seu primo "amulatado".
Outra questão importante tem a ver com a construção de Ana Rosa, que foi incentivada pela mãe a só aceitar se casar por amor, e é a primeira a insistir num relacionamento com Raimundo. Toda a história prévia da mãe de Ana Rosa também é apresentada no inicio, dando a entender que Ana Rosa só se interessou por um homem negro porque não teve a educação "adequada" para um jovem branca e rica de sua época. Essa educação "errada" é o que provoca toda a tragédia da história e o que deixa Ana Rosa à beira da histeria nos acontecimentos finais.
Além do casal principal nada convincente, é uma história que se arrasta com poucos pontos de tensão. Boa parte do enredo consiste em visitas de parentes ou conhecidos da família de Ana Rosa e contém diálogos inúteis que se estendem por páginas e mais páginas. Em certo momento, cheguei mesmo a pular um desses trechos.
Minha conclusão, por fim, é de que o livro tenta denunciar as barreiras de uma sociedade escravista mas faz isso reproduzindo de forma violenta outras facetas da visão de mundo que critica.