gigi 25/06/2021De fato, o universo inteiro em minhas mãos"[...] Considerando a situação, você se sente extraordinariamente normal.
Você não é etéreo, não está transparente, e os braços, as pernas e tudo de seu corpo respondem positivamente quando ordenados a se movimentar. Você é carne, ossos e sangue, e seu coração bate da maneira usual. Uma leve dor no pescoço sela isso: você se sente exatamente como na Terra. No entanto, está no espaço sideral. Seu guia robô, completo, incluindo sua cobertura metálica amarela e seu tubo de lançamento de partículas, está ao seu lado, tão tangível e real quanto você.
Você olha ao redor."
Sendo de uma geração pós-Carl Sagan, é difícil andar meio metro sem ouvir sobre algum nome novo da ciência que tem potencial para substitui-lo. A substituição não é ruim, muito pelo contrário: o mundo — e, claro, a academia — seria um lugar infinitamente melhor se todos os cientistas fossem tão bons em divulgação científica quanto ele foi. Mas não é bem isso o que acontece.
No entanto, é de conhecimento geral que muitos dos cientistas que se aventuram pelos diversos meios atuais, desde youtube até livros e passando por podcasts, gostariam de ser um pouco como Carl Sagan.
Falando sem a menor predileção, Christophe Galfard (1976) seria um forte candidato a esse título. Linguagem acessível e até leve em certos momentos — ou tão leve quanto se pode ser enquanto se falar de física teórica —, humor ligeiramente bruto e um passado incrível são alguns dos marcos que me convenceram a ler essa obra. Doutor em Cambridge com orientação de ninguém menos que Stephen Hawking (1942-2018), ele traz um livro com a proposta de desmistificar cada pormenor do Universo: desde as coisas mais simples, como as constelações que se formam diante de nós no céu noturno, até teorias ainda pouco exploradas pelos cientistas.
O Universo em suas mãos (2016) é um exercício mental do começo ao fim. Com a proposta de ser uma experiência imersiva, como diversos filósofos já faziam em tempos mais remotos, o livro projeta o leitor em situações não muito familiares para tentar desvendar o que realmente falam as leis da física. Jogue fora o formulismo generalizado que vemos durante o ensino básico, ler esse livro é como mergulhar nas profundezas dos cientistas mais brilhantes e aclamados de todos os tempos. Sua companhia é um robô não muito sensível (o que, de certa forma, é o esperado para um robô) que te coloca em situações no mínimo problemáticas e aos poucos quebra o que você acha que sabe sobre o funcionamento da natureza.
O maior atrativo no livro é a sensibilidade em descrever cada detalhe, por mais óbvio que ele seja. Galfard não poupa palavras, isso é fato. O livro é dividido em sete partes — que, sinceramente, vão endurecendo em termos de teoria — que vão, em um ritmo alucinante, adentrando as profundezas das descobertas científicas ao longo dos anos. Certamente é uma leitura muito interessante para quem cursa física e para o público geral. Foi uma leitura que me garantiu boas risadas e alguns sustos, porque mesmo o que parece óbvio vira uma surpresa quando não se percebe o mundo ao seu redor da maneira que Galfard propõe no livro.
Deixo abaixo a melhor sequência de citações do livro inteiro:
"Acho que posso afirmar com segurança que ninguém entende a mecânica quântica."
Richard Feynman.
"Deus é sutil, mas não é malicioso."
Albert Einstein, sobre Mecânica Quântica.
"Nenhuma linguagem que se presta à visualização pode descrever os saltos quânticos."
Max Born.
"Aqueles que não ficam chocados quando se deparam com a teoria quântica talvez possam não tê-la entendido."
Niels Bohr.
"Mudei de ideia. Talvez Deus seja malicioso."
Albert Einstein, ainda sobre Mecânica Quântica.