jmrainho 23/07/2015
Rubaiyat
Edição da Ediouro traduzido por Manuel Bandeira a partir da tradução francesa de Franz Toussaiunt.
Rubaiyat de Omar Khayyam foi o título dado pelo inglês Edward Fitzgerald para na tradução de uma seleção de poemas, originalmente escritos em persa e atribuídos a Omar Khayyam (1050 - 1123), um poeta, matemático e astrônomo da Pérsia. Wikipédia
Existe outra edição, comentada por Paramahansa Yogananda que diz ser o autor um dos grandes místicos de nossos tempos, e explica o mistério por trás do famoso poema de Omar.
Omar contesta as religiões e a fé cega. Prega a liberdade, a alegria e a felicidade curtindo o hoje... com vinho e mulheres...Mas também questiona o destino, o conhecimento a a pequeneza da vida dedicada apenas às coisas supérfluas...já que... todos morreremos.
TRECHOS:
(1)
Sabem todos que nunca
Murmurei uma prece.
Sabem todos que nunca
Escondi meus pecados.
Ignoro se realmente Existe uma Justiça
E uma Misericórdia.
Nada temo no entanto.
Nada temo. Antes nelas,
Se é que existem, confia
Minh'alma, porque sempre
Fui um homem sincero.
(4)
Procede sempre de maneira
Que de tua sabedoria
Nunca sofra o teu semelhante.
Domina-te Jamais te entregues
À ira. Se queres chegar
Um dia à paz definitiva,
Sorri dos golpes do Destino,
E nunca batas em ninguém.
(8)
Satisfaze-te neste mundo
Com poucos amigos. Não busques
Tornar durável a amizade
Que possas sentir por alguém.
Antes de apartares na tua
A mão que te estendem, pergunta
A ti mesmo s ela algum dia
Não se erguerá para feri-te.
(12)
Nenhum poder sobre o destino
Te foi dado, sabes. Portanto
Que adianta a ansiedade em que ficas
Pela incerteza do amanhã?
Então, se és um sábio, procura
Tirar do momento presente
O maior proveio possível.
O futuro o que tu te trará?
(13)
Chegada é a estação inefável,
A estação da esperança, quando,
Impacientes por expandir-se,
Buscam as almas a aromada
Solidão. Cada flor que cheira
Será a branca mão de Moisés?
Será cada brisa que sobra
O doce hálito de Jesus?
(15)
Além da Terra e do Infinito
Eu procurava o Céu e o Inferno.
Mas uma voz solene disse-me:
- "Procura-os dentro de ti mesmo."
(20)
Mais rápido que a água do rio,
Que o vento do deserto, escoam-se
Os dias. Dois não me interessam:
São o de ontem e o de amanhã.
(24)
Nos conventos, nas sinagogas
E nas mesquitas é costume
Irem refugiar-se os fracos
Que a ideia do Inferno apavora.
O homem que conhece a grandeza
De Deus não acolhe em sua alma
As sementes más do terror
E da imploração lamentosa.
(27)
Admitamos que tenhas
Resolvido o difícil
Enigma da Criação.
Qual será o teu destino?
Admitamos que tenhas
Conseguido afinal
Desvendar a Verdade.
Qual será o teu destino?
Admitamos que tenhas
Sido feliz cem anos,
E outros cem ainda o desejas.
Qual será o teu destino?
(28)
Convence-te disto:
Um dia tua alma
Deixará o corpo
E serás lançado
Para trás do véu
Que há flutuando sempre
Entre este Universo
E o desconhecido.
Enquanto esse dia
Não chega, procura Ser feliz.Esquece
Todo outro cuidado.
Pois não sabes de onde
Vens, tampouco sabes
Para onde irás
Depois de tua morte.
(29)
Os doutores e os sábios mais ilustres
Caminharam nas trevas da ignorância.
O que não impediu que em vida fossem
Tidos por luminares do seu tempo.
Que fizeram? Pronunciaram
algumas frases confusas
E depois adormeceram
Para toda a eternidade.
(30)
Pediu-me o coração: "Quero saber,
Quero instruir-me! Ensina-me Khayyam,
Tu que durante a tua vida inteira
Tanto tens estudado e trabalhado"
Disse a primeira letra do alfabeto,
E logo, pressuroso, o coração
Secundou: "Sei agora, um é o primeiro
Algarismo de um número sem fim".
(31)
Ninguém pode compreender
O que é mistério,ninguém
Pode ver o que se esconde
Debaixo das aparências.
Nossas casas, salvo a última
- A terra, são provisórias.
Amigo, bebe o teu vinho!
Trégua às palavras supérfluas!
(33)
Nesta feira que tu atravessas
Nunca tentes fazer amigo,
Nem busques abrigo seguro.
Acolhe a dor sem procurares
Remédio: não o encontrarias.
Sorri em face do infortúnio.
Não esperes que te sorriam,
Pois seria tempo perdido.
(34)
A Roda gira, descuidosa
Dos árduos cálculos dos sábios.
Renuncia aos teus esforços
De seguir o curso dos astros.
Mais sábio é meditares sobre
Esta certeza: morrerás
E não sonharás mais, e os vermes
Ou os cães, comerão teu cadáver.
(38)
Sono sobre a terra
Sono sob a terra.
Sobre e sob a terra
Corpos estendidos.
Nada em toda a parte.
Deserto do nada.
Homem vêm chegando.
Outros vão partindo.
(41)
Ontem devias ser recompensado e não o foste.
Mas não deplores nada, nem esperes coisa alguma.
O que te deve acontecer está escrito no Livro
Que ao acaso vai folheando o vento da Eternidade.
(45)
Em voz baixa dizia a argila
Ao oleiro que a modelava:
"Já fui como tu, não te esqueças...
Portanto não me brutalizes!"
(52)
Disputam o bem e o mal
A primazia da Terra.
O Céu não é o responsável
Pelas voltas do destino.
Não agradeças portanto
Ao Céu, nem tampouco o acuses...
O Céu é indiferente
A tuas dores e alegrias.
(52)
Se em teu coração
Enxertaste a rosa
Do amor, tua vida
Não passou inútil.
Quer a voz de Deus
Ouvir procurasses,
Ou a taça brandisses
Sorrindo ao prazer.
(63)
Ah, não procures a felicidade!
A vida dura o tempo de um suspiro.
Dhemchid e Kai-Kobad hoje são poeira.
A vida é um sonho; o mundo, uma miragem.
(67)
Não temo a morte. Prefiro,
Irmãos, esse inelutável
Ao outro imposto ao nascermos.
O que é a vida afinal?
Um bem que me foi confiado
Sem o meu consentimento
E que eu com indiferença
Restituirei um dia.
(72)
Um pedaço de pão, um pouco de água
Fresca, a sombra de uma árvore e os teus olhos!
Nenhum sultão é mais feliz do que eu.
Nem mendigo nenhum mais melancólico.
(76)
Falam de um Criador...Terá fomrado
Então os seres só para destruí-los?
Por que são feios? Quem é o responsável?
Por que são belos? Não compreendo nada.
(90)
Que possuo de verdade?
Que restará de mim
Depois de morto? É a vida
Breve como um incêndio.
Chamas que o transeunte
Não tardará a esquecer,
Cinzas que o vento espalha,
Varre: um homem viveu.
(91)
Convicção e dúvida,
Verdade e erro são
Palavras vazias
Como a bolha de ar.
Irisada ou baça,
Essa bolha oca
É a imagem mesma
Da existência humana.
(111)
Aprendes o que amanhã
Pode acontecer-te? Confia,
Senão não deixará a sorte
De justificar teus receios
Nada merece o teu esforço,
Não te prendas a nada, não
Questiones livros nem pessoas,
Pois nosso destino é insondável!.
(116)
"Eu sou a maravilha
Do mundo", a rosa disse.
"Que perfumista ousara
Expor-me ao sofrimento?"
Um rouxinol cantou:
"Um dia de ventura
Pode ser que prepare
Todo um ano de lágrimas."
(119)
O amor que n'ao devasta
Não é amor. A brasa
Pode espalhar acaso
Um calor de fogueira
Noite e Dia, durante
Toda a sua vida, o amante
Verdadeiro consome-se
De dor e de alegria.
(146)
Servidores, não tragam lampadas:
Meus convivas, extenuados,
Adormeceram. Vejo bem
Como estão imóveis e pálidos.
E hirtos e frios como estão,
Jazerão na noite do túmulo.
Não tragam lâmpadas, não há
Aurora na mansão dos mortos.
(147)
Ao cambaleares sob o peso
Da dor, ao secarem-tem as lágrimas,
Pensa nas folhinhas da relva
Que cintilam depois da chuva.
Quanto te exaspera o esplendor
Do dia e desejas que a noite
Baixe definitiva, pensa
No despertar de uma criança.
(149)
Mil armadilhas colocaste,
Senhor, na estrada que trilhamos,
E depois disseste: "Ai daqueles
Que não souberam evitá-las!^
Tudo vês e sabes. Sem tua
Permissão nada ocorre. Somos
Responsáveis por nossos erros?
Podes censurar-me a revolta?
(150)
Aprendi muito, esqueci muito
Também, e por vontade própria.
Em minha mente cada coisa
Estava sempre em seu lugar.
Não cheguei à paz senão quando
Tudo rejeitei com desprezo.
Compreendera enfim que é impossível
Tanto afirmar como negar.
(151)
Estudei muito quando moço.
Tive muito mestre eminente.
Orgulhei-me, regozijei-me
De meus progressos e triunfos.
Quando evoco o sábio que eu era,
Comparo-o à água, que se amolda
À forma do vaso, e à fumaça,
Que é dissipada pelo vento.
(152)
A tristeza e a alegria, o bem e o mal
São parecidos aos olhos do sábio.
Para o sábio tudo o que principiou
Deve acabar. E se assim, pergunta
A ti mesmo, se tens, irmão, motivo
De porventura te regozijares
De uma felicidade que te chega,
Te afliges com o mal que não esperavas?
(157)
Olha em torno de ti. Verás somente
Angústias, aflições e desesperos.
Teus melhores amigos já morreram,
Tens por só companhia, hoje, a tristeza.
Mas levanta a cabeça! Abre os dois punhos!
Agarra firmemente, caso o avistes
À mão, o que desejas. O passado
É um cadáver que deves enterrar.
(162)
Não vês mais que as aparências
Das coisas e das criaturas.
Percebes tua ignorância,
Mas não abdicas do amor.
Aprende que Deus nos deu
O amor com a mesma intenção
Com que fez na natureza
Certas plantas venenosas.
(164)
Pobre homem, nunca saberás
Nada; jamais explicarás
Um só dos mistérios do mundo.
E já que as religiões prometem
Depois da morte o Paraíso,
Busca tua mesmo criar um
Para teu gozo aqui na Terra,
Pois o outro talvez não exista.
(165)
Lâmpadas que se apagam, esperanças
Que se acendem: aurora.
Lâmpadas que se acedem, esperanças
Que se apagam: noite.