filipetv 12/06/2024
Sempre achei que a arte não precisa ser hermética pra ser genial. É possível ser claro e direto e ainda assim ser notável. Em "As Ondas", Virginia Woolf faz exatamente o contrário do que acabei de dizer, ao compor uma obra eterna, mas de difícil acesso, sendo importante, inclusive, uma segunda leitura para que se alcancem mais algumas camadas de significado.
Além de escrever ficção, a autora britânica também era ensaísta e teorizou sobre a literatura, principalmente a respeito do Modernismo, no início do século 20. Para ela, a narrativa tradicional, a prosa linear seriam superadas, abrindo as portas para experimentalismos, que é exatamente o que ela faz em "As Ondas", de 1931.
Originalmente, o livro se chamaria "As Mariposas", e teria como protagonistas seis personagens refletindo sobre a vida, como mariposas em torno de uma lâmpada. O título foi descartado, porém a ideia geral permaneceu a mesma. E como acompanhamos esses seis personagens - Jinny, Neville, Rhoda, Susan, Bernard e Louis - ao longo de sua vida, ponderando sobre a amizade, o amor, a velhice, entre outros temas, o título escolhido acaba se casando perfeitamente com os movimentos que a vida promove, "num indo e vindo infinito", como diria a canção.
No entanto, não procure lineridade temporal ou espaços definidos. Como a espuma das ondas e a própria água que as compõe, tudo nesse romance é fluido, muito mais sugerido do que dito, e talvez venha daí a maior dificuldade de sua leitura, afinal quando pensamos no gênero romance, nos preparamos para começo, meio e fim bem claros.
Introduzindo cada "capítulo" (aspas porque a teoria diverge sobre essa classificação), há um breve texto, em itálico, que narra o percurso do sol e os efeitos da passagem do tempo nas pessoas, desde a alvorada até o crepúsculo, colocando em perspectiva o transcorrer de um dia, a vida inteira de um ser humano e a própria eternidade.
Essas são apenas algumas camadas desse fenômeno literário, criado por uma das maiores autoras que já existiram. Mesmo que no começo a leitura seja meio truncada e você fique perdido, vale muito a pena perseverar e saborear essa dança que Virginia Woolf nos proporciona.