Duda 27/04/2021
"Como grãos de areia em um deserto, os segundos eram contados.
Amontoavam-se uns sobre os outros, unidos em uma unidade que parecia indivisível a não ser que se olhasse de muito longe. Em meus dedos, os grãos de areia escorriam como veias do meu corpo, carregando o mesmo sangue que meu coração bombeava aos solavancos.
Derretiam-se pela minha pele, sem parar, sem sequer uma fração de dúvida não mecânica. O que havia ido, não mais voltaria. O que havia sido, outra vez jamais seria. E novos grãos de areia se arrastarão por entre o que somos e nos impulsionarão para frente.
Em minhas mãos, estava o tempo.
A ampulheta girava e o futuro e o passado se separavam como entidades diferentes. O futuro nada mais é do que grãos de areia que ainda não caíram, enquanto o passado são dunas inteiras, cheias de memórias verdadeiras e falsas. Mas, se tudo acontece no momento certo, quem é o responsável por determinar?
Eu nunca acreditei em coincidências. Eu acredito em oportunidades.
E então, assim, aprendi a manipular o tempo.
Por todos os grãos de areia que se esparramaram sobre mim, e me tornaram o que sou hoje e me levaram a lugares inimagináveis. Sou eu quem os determina? Sou eu, certamente, quem os aceita ou os deixa partir para desenhar o futuro de outro alguém.
Mas será que existe em mim alguma maneira de recusar o que já está escrito? Se é que algo se escreve antes mesmo de acontecer.
O tempo voa invisível e traz todas as respostas que existem, porém nem todas as perguntas têm uma resolução.
Ainda.
Quais serão os próximos grãos de areia reservados para mim? Ah, se eu pudesse vê-los! Será que mudaria alguma coisa? Será que eu tomaria um novo rumo e, ao fazer isso, transformaria toda a minha vida em algo que não era meu, que não era pra ser?"