Miguel Freire 08/04/2024
Uma salada à lá Chesterton
O Homem que era Quinta-Feira (um Pesadelo) é um romance de difícil classificação escrito por G.K. Chesterton e publicado em 1908.
Digo “difícil classificação” porque ele está mais para uma mistura de vários estilos literários diferentes, do que restringido a apenas uma forma.
Há quem diga que é um romance policial (do qual Chesterton é um verdadeiro entusiasta): afinal, o protagonista é um detetive que se infiltra numa sociedade secreta de anarquistas, que tem por objetivo destruir toda a humanidade. Pode ser também chamado de alegoria à decadência do mundo moderno e uma exaltação ao “heroísmo” do homem comum, apesar de eu achar que chamar um texto como esse de “alegoria” seria colocar restrições demais à sua criatividade. Já o vi ser chamado também de surrealista e eu iria ainda mais longe e diria que chega à beira do “nonsense” (reparem bem no subtítulo do romance).
Enfim, a estrutura do texto realmente é tudo isso misturado: uma história de detetives cheia de reviravoltas, uma fábula, um nonsense e sabe-se lá o que mais podemos encontrar aqui. Porém, isso não é o foco principal. O que realmente importa é que estamos diante de mais um fruto da genialidade fresca, revigorante e bem-humorada do Chesterton. Sua escrita é de uma clareza e ao mesmo tempo de uma profundidade muito grandes. Ele faz com que discussões filosóficas, muitas vezes as partes mais difíceis ou taxadas como mais desinteressantes em outras leituras, sejam tão deliciosas e instigantes quanto à história em si. Seu senso de humor agradável e irônico arrancou de mim muitas boas risadas.
Sim, apesar de não ser totalmente alegórico, o livro faz sim uma referência à decadência do mundo moderno e à importância crucial do homem comum. A anarquia é a principal antagonista do livro, justamente para mostrar a rebeldia destrutiva que a sociedade atual tende a seguir: rebelar-se contra as tradições, contra Deus e, por consequência, destruir tudo o que há de humano no homem. Com essa rebeldia, Chesterton acaba recaindo no tema da liberdade e no paradoxo de que, querendo ou não, a liberdade só é real se exercida dentro de determinados limites. Fora deles, ela se torna somente caos e desordem.
Como todo grande livro ele possui muitas camadas e com certeza não peguei todas já na primeira leitura. Desejo retornar à ele várias vezes ainda para reencontrar o fascinante policial-poeta Gabriel Syme, o anarquista entusiasta Lucian Gregory e o sombrio Conselho dos Dias liderado pelo malévolo Domingo.
Como todo grande livro ele possui camadas e com certeza não peguei todas já na primeira leitura. Desejo retornar à ele várias vezes ainda para reencontrar o fascinante policial-poeta Gabriel Syme, o anarquista entusiasta Lucian Gregory e o sombrio Conselho dos Dias liderado pelo malévolo Domingo.