Ju Zanotti 24/05/2017E bota sofrência nisso! Sabe quando você escolhe uma leitura simplesmente pelo título da história? Sou dessas que primeiramente repara na apresentação de um livro, capa, diagramação, título e raramente leio a sinopse, ou seja, vou pela estética antes do conteúdo. Na maioria das vezes isso não é um problema, mas algumas vezes obviamente eu meio que me arrependo. Pensei que com A Busca sofrida de Martha Perdida eu iria me arrepender, principalmente no início, mas com o decorrer da narrativa algo essencial muda e a leitura fica muito mais confortável.
Martha Perdida é um achado. Abandonada por alguém na estação Lime Street quando era apenas um bebê a garota de 16 anos não sabe nada sobre sua origem. Tendo sido criada pela senhora responsável pelo Achados e Perdidos do local, uma velha religiosa e rígida, Martha cresceu ingênua e iludida. Acredita verdadeiramente que se um dia chegar a colocar os pés fora da estação toda Lime Street pode desmoronar. Porém, apesar da sutil vontade de conhecer tudo o mais a adolescente se contenta com o que tem. Até que se vê sozinha, contando apenas com alguns poucos amigos e uma necessidade de descobrir mais sobre si, mas não é fácil para jovem quebrar a redoma de vidro em que foi criada. Enfrentar o mundo, descobrir como quebrar a terrível maldição que acredita estar sobre sua responsabilidade, tudo isso é um peso que Martha precisa encarar.
Ingenuidade e ilusão excessiva são características que não suporto em personagens principais. No caso de Martha Perdida estes dois elementos são mais do que excessivos, acredito que no intuito de criar uma personagem sensível e poética a autora acabou pecando terrivelmente. As coisas em que Martha acredita, a forma como o sua mente funciona pareceram artificiais para mim, a única coisa que conseguia pensar é que ela era uma tremenda idiota e que provavelmente tinha algum problema cerebral. No entanto, e talvez sendo contraditória, devo dizer que é muito fácil sentir empatia pela protagonista, no sentido de se colocar em seu lugar. Se compreendemos a forma como ela foi criada, ser limitada como Martha parece ser é possivelmente crível. Mas não deixa de ser irritante. A narrativa salienta por diversos momentos que a personagem é uma alma velha em um corpo jovem, mas eu não consegui absorver isso. Apresentar diálogos introspectivos e filosófico não faz de um personagem uma pessoa sábia, principalmente quando tudo não parece fazer sentido de verdade. Martha é despida de convenções, ela é livre para ser o que quer em seu mundinho, não se importa com a sociedade que rodeia, não tem vergonha que riam dela, é o que muitos chamam de bobo alegre.
Para mim tudo ficou ainda mais absurdo quando um determinado personagem, que de cara notamos que não vale nada, entra na vida da protagonista. Martha que foi criada sem carinho e a atenção e oprimida pela senhora que a acolheu, anseia por amor, e o aceita muito facilmente. O envolvimento dela com alguém que a usa apenas para alcançar determinados objetivos só fizeram eu me irritar ainda mais. O abuso é claro, as mentiras estão ali, os amigos tentam alertá-la, mas a idiota, mesmo estando claro que não sente nada especial pelo tal personagem, precisa acreditar que ele a ama de verdade. Foi nojento, opressivo, ultrajante! O que realmente salva o livro são os personagens secundários, e o fato de que a protagonista parece amadurecer um pouco com o decorrer da narrativa, sem mudar sua essencial.
"- As pessoas estão sempre com pressa - falo, e Elisabeth assente. - Elas só percebem o valor de algo depois que perdem - concluo."
Outro ponto não tão agradável da leitura é a narrativa, a história vendida como um conto de fadas para adultos é narrada exatamente como um conto de fadas. É como se a protagonista estivesse contando uma história para alguém, falando assim me parece confuso, já que todo livro conta uma história e acredito que vocês só irão compreender o que quero dizer se derem uma chance a esta história. Mas lembre-se de quando você era criança, alguém algum dia deve ter narrado um conto de fadas para você, certo? Se você se lembra como é, talvez compreenda o que quero dizer. Bom, essa forma de contar não funcionou comigo.
Agora, depois de tudo isso, você deve estar achando que eu detestei o livro, mas tenho que dizer que isso não é verdade. Há algo que compensa tudo o que já disse, e é essencial para que um livro seja bom: a trama. Se excluirmos a personalidade da protagonista temos uma história bem gostosa, uma trama envolvente que nos leva até o final da história. A busca de Martha pela verdade e como ela ocorre é onde a verdadeira poesia está. E com certeza foi isso que fez com que eu não odiasse o livro. Então sim, apesar de tudo eu recomendo esta história.
Enfim, A busca sofrida de Martha Perdida é uma história que peca em diversos pontos, mas que os ganha por trazer um algo a mais que instiga o leitor. A poesia e singeleza contidas no desenvolvimento é o que dita a qualidade da obra, o resto, apesar de irritante, é apenas resto.