jonasbrother16 13/04/2024
« "If there's no meaning in it," said the King, "that saves a world of trouble, you know, as we needn't try to find any..." »
Depois de passar pelo impressionante turbilhão imaginativo desse livro, resta a pergunta: o que tudo isso significa?
É fácil dizer, como o rei, que não há nenhum sentido, e que não é preciso procurar. Este clássico de Lewis Carroll, afinal, é tido como "literatura nonsense", e não é sem motivo. Entretanto, é como se Carroll tivesse elaborado não um quebra-cabeças, mas um enigma, que ele nos desafia a desvendar: "Every thing's got a moral, if only you can find it".
Não é um quebra-cabeças, pois não acho que haja uma solução puramente racional para isto. É mais como um enigma digno da Esfinge, de um tipo que força os limites da nossa percepção simbólica, e que nos devora se não o compreendermos.
Por mais "nonsense" que seja, alguns elementos são claros: primeiro Alice cai pela toca do coelho, chegando a um lugar bem profundo. Alice também está sonhando. Mas não é preciso que Carroll tenha estudado as teorias psicológicas do subconsciente que começavam a surgir em sua época para que tudo isso tenha uma relação. Ora, se o subconsciente existe mesmo, ele existe antes de ser descoberto pela ciência psicológica, e portanto era algo acessível como experiência para Carroll, e para qualquer um que lesse o seu livro.
A ideia de um lugar no qual as regras costumeiras parecem não valer é conhecida por todos. Seja o já citado subconsciente, seja a exploração de um novo campo da ciência (física quântica!?), seja uma experiência qualquer de contato com uma outra cultura, ou ainda (e mais quente) a experiência de uma criança que vai crescendo e descobrindo o mundo, tudo isto tem em comum a ruptura com o conhecido, e a introdução de novos elementos diante de nós. Eis um ponto onde a história de Alice é bem real, e não surreal.
Outro elemento de realidade da obra, é que não se trata de pura surrealidade. Se o livro fosse completamente surreal, ele não faria sentido algum, e seria portanto incompreensível, ininteligível, impossível de se comentar ou recomendar, e portanto não teria tido sucesso algum e nenhum de nós o leríamos hoje. Alice, por exemplo, não pode pegar as chaves da mesa pois é muito pequena, e depois não consegue sair da casa do coelho pois é muito grande, e etc e etc., são muitos os momentos onde existem regras razoáveis. O que causa a sensação de "puro nonsense" é que algumas regras são suspensas em certos momentos, causando surpresa e estranhamento. É aqui que aparece uma coisa muito presente hoje no nosso senso de humor, com os nossos memes malucos, que aceitam parcialmente a realidade, e causam o riso pelo absurdo.
Enfim, eu poderia ficar falando horas sobre esse livro, pois é interminável o número de coisas que ele contém, cada cena merecendo uma apreciação própria. É um excelente livro, mas perde-se muito lendo em português, tive que pegar o texto original. É também o livro mais engraçado que eu já li desde as coletâneas de piadas que eu gostava de ler quando criança.
O que dizer? É um clássico, e merece o título.