spoiler visualizarMarcos 22/08/2019
"Serão grandes... serão gloriosos... coisas futuras!"
A obra traz um tema interessantíssimo, desenvolve-se numa linguagem agradável, rica em ironia e metáforas. A narração consegue manter, em diversos capítulos, um tom de humor, proporcionando uma leitura fluída e prazerosa. Os diálogos narrador/leitor prendem a atenção do leitor, que se sente acompanhado ao ir conhecendo mais sobre a história narrada.
Esaú e Jacó é um livro do final do Realismo (1904), estando fora da fase de ouro do Realismo brasileiro e da ficção machadiana (1880-1900). Isso quer dizer que se torna difícil ajustar o romance nos moldes realistas, como quer a crítica, ao situá-lo na segunda fase de Machado de Assis. O livro resgata o lirismo e a melancolia da sua primeira fase de produção, apesar de possuir tendencialmente traços realistas, como a objetividade e constante na descrição de situações e personagens.
Pode-se perceber aspectos simbolistas no romance, desde o título que faz referências bíblicas e ainda carrega um peso significativo e basal, justificando e alicerçando a temática da narrativa. Pode-se ainda, lembrar que os dois namorados levaram grinaldas à sepultura da amada Flora. Uma é de perpétuas, de simbolismo muito evidente, e a outra, mais obscura, de miosótis, o “forget-me-not” (tradução: não-me-esqueças) dos ingleses; mas ambas as flores trazem significados representativos aos sentimentos dos gêmeos. A Flora, em si, também é exemplo de traços simbolistas, pois tem muito das virgens vaporosas que povoam a literatura simbolista e se aproximam das esferas celestes e etéreas. Durante seus momentos de vislumbres, ela consegue carregar o eleitor para outra atmosfera, um universo onírico, onde chega a se encontrar com o homem ideal, a junção dos gêmeos. Por estas e outras percepções, que se constata a presença do Simbolismo no romance.
Portanto, devido a essas oscilações entre situações realistas, verossímeis, plausíveis, e situações artificiais, inverossímeis, fica complicado determinar que o romance se trate de uma obra puramente realista.
O romance ironiza e faz críticas a sociedade do Rio do século XIX, especialmente, no período da transição política. Pode-se citar o episódio da “tabuleta de Custódio”, em que o confeiteiro e também vizinho de Aires, busca-o para pedir conselho sobre o nome na nova tabuleta do seu comércio, isso ocorre, por ele ter se informado tardiamente sobre a Proclamação da República e por ficar na dúvida se o novo governo vingaria, Custódio pede solução acerca do nome de sua confeitaria. O episódio, além de engraçado, critica as pessoas que sabiam sobre a revolução política, ou nem buscavam saber, porque o que realmente interessava eram as coisas cotidianas, de interesse próprio, de uma trivialidade ignorante. Dessa forma, demonstrando a existência de um desinteresse para com o novo regime político, e reforçando ainda certa alienação da sociedade.
Nesta obra, a narrativa está repleta de episódios que não fazem parte propriamente da história, o que retarda o desfecho, tornando então, o processo lento e minucioso (estilo machadiano).
Além de ser considerado um romance realista, Esaú e Jacó transitam entre duas modalidades: romance histórico e romance político, sendo mais tendencioso ao último. Visto que, o romance é centrado exatamente nesse conflito: República X Império; conflito do qual os gêmeos seriam simbolicamente a personificação. Natividade e o Conselheiro Aires seriam, respectivamente, as representações da esperança e da inteligência (ou um interventor sagaz) nesse impasse político. Já a Flora pode ser entendida como a metonímia do Brasil, sem esperança entre os jogos de interesse políticos.
Em linhas gerais, temos um ótimo romance, com uma narrativa consciente e apurada, congregando perfeitamente o tom irônico e despretensioso à análise da fatalidade da condição humana. Não é o melhor da obra machadiana, mas entretém, é possível dar várias risadas em alguns capítulos e refletir acerca do período sociopolítico brasileiro. Com maestria, o autor examina as transformações políticas e sociais de modo mais denso. Neste romance, Machado desenvolve uma síntese do Brasil às vésperas da Proclamação da República, um consistente retrato do espírito da época. Consequentemente, constituído com teor moralista, o narrador arremata a história trazendo ao leitor a ideia de que a oriunda inimizade dos irmãos gêmeos seria algo eterno, um caso sem solução. Figurativamente, o leitor pode entender a desunião dos protagonistas como sendo aquele movimento político, ou propriamente, a política.