Agonia do Eros

Agonia do Eros Han B.C.
Byung-Chul Han




Resenhas -


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mpettrus 26/09/2024

A Implacável Crítica ao Amor Sem Eros do Neoliberalismo
?A amizade é uma conclusão. O amor é uma conclusão absoluta?

? O amor, no verdadeiro sentido da palavra, se rebela contra todas as normas do mundo moderno, o mundo do capitalismo secular.

Isto ocorre porque o amor não é de forma alguma um contrato que visa a coabitação agradável entre dois ou mais indivíduos, mas uma experiência fundamental da existência do outro, e talvez nenhuma experiência desse tipo possa ser encontrada além do amor em si mesmo.

? Byung-Chul Han combina nesse pequeno livro notável uma espécie de fenomenologia do amor verdadeiro, incluindo o amor sexual, com uma investigação diversificada sobre as forças reais que ameaçam o amor na nossa contemporaneidade.

? Ler esse notável ensaio foi-me uma experiência altamente intelectual, permitindo envolver-me com clareza numa das lutas mais desesperadamente necessárias da atualidade.

É uma luta para defender o amor ou para, no mínimo, reinventá-lo, para ajudá-lo a escapar do capitalismo. Porque o capitalismo elimina a heterogeneidade em todos os lugares para fazer de tudo, inclusive do amor, um objeto de consumo.

? Para além dessa problemática, o autor levanta outra, a meu ver, muito mais séria: o narcisismo. Ele afirma que o narcisismo do outro provoca o desaparecimento de Eros, salientando que, para aqueles de nós que foram reduzidos a máquinas de desempenho na sociedade capitalista, o amor vai desaparecendo e apenas as tendências narcisistas vão se fortalecendo.

? O autor retrata de forma assustadora a sociedade narcisista de hoje, onde as oportunidades de encontrar outras pessoas (desconhecidas ou não) são reduzidas por conta do neoliberalismo e as pessoas só podem viver com aquilo a que estão acostumadas.

Sartre disse: ?O inferno são os outros?, mas hoje a mesma coisa é o inferno. Este inferno é governado de uma maneira diferente do quê aquela que foi no passado.

No passado, a opressão, a proibição e a negação eram usadas para explorar os humanos, mas agora a liberdade, a permissão e a positividade levam os humanos à auto exploração.

No passado, a sociedade ainda vislumbrava uma heterogeneidade de comportamentos agora, porém, a homogeneização tem sido o motor desse comportamento. O ser humano padronizado como um mesmo ser fica preso dentro de si, incapaz de se reconhecer verdadeiramente, perdendo a capacidade de refletir sobre si mesmo e sobre o mundo.

? Tornar invisível a própria opressão sistemática e embalá-la como liberdade e crescimento é a lógica enganosa do neoliberalismo.

Segundo o autor, ?Essa liberdade percebida é fatal porque torna impossível toda resistência e toda revolução?. O que há para resistir quando não há mais outros que resistam a essa a opressão? E quem são os outros a que se refere a pergunta anterior?

?E é exatamente aqui que entra a minha grande reflexão: os outros é o Eros? O Eros que sofre de uma agonia referida no título desse livro? Porque se assim estiver correto meu raciocínio, muita coisa passa a fazer sentido para mim a partir dos escritos do autor.

? Ele define ?Eros' como sendo direcionado para o outro num sentido de resistência, ou seja, o outro que não está incluído no domínio de dominação do neoliberalismo. O outro é o que abala a linguagem, as propagandas, o que salva o ser humano da exploração de si mesmo e é impossível controlá-lo.

? Contudo, o amor pelos outros e o verdadeiro Eros não são tolerados na moderna sociedade de consumo. É por isso que o amor hoje é narcisista. O narcisismo, neste caso, não é amor próprio. Um sujeito narcisista sabe traçar limites que excluem os outros por si mesmos.

Tal pessoa não sabe reconhecer e admitir a alteridade dos outros, mas apenas usá-los como espelho do ego do sujeito. Eros é algo que permite vivenciar o outro como o outro. Em outras palavras, pode-se dizer que o verdadeiro Eros é uma dádiva de outros, e não as próprias realizações do sujeito. Perceberam a agonia de Eros?

Existe outro conceito importante: ?Não posso?. Uma sociedade orientada para o desempenho regressa ao domínio da afirmação do ?você consegue?, em vez de mobilizar a justificação de ?você tem que fazer?. Para a exploração, é mais eficaz apelar à motivação, à espontaneidade e a projetos autodirigidos (explica-se o ?boom? de empreendedores no mundo atual sem as devidas condições necessárias).

? Os anseios dentro do ser humano hoje podem estar livres de comandos. Contudo, porque alguém se explora voluntariamente, é fundamentalmente o mesmo que ser explorado sem dominação.

O slogan ?Você consegue? cria uma tremenda coerção, mas também faz com que não reconheçamos a coerção como coerção. Em última análise, os contratempos são culpa sua e você não deve culpar ninguém por seus fracassos, a não ser você mesmo.

? Nesta época saturada de narcisistas, é quase um milagre poder mergulhar adequadamente no outro. O amor não é um contrato agradável para casar com a minha fantasia. É uma experiência existencial e fundamental sobre os outros, e é também uma experiência única que não pode ser vivida de outra forma.

? Depois de ler o livro, sinto como se estivesse flutuando sozinho no vasto oceano. Sentindo-me absurdamente solitário e com a alma pesada. A exploração intelectual avançada que esse livro me provocou é a única forma de reconhecer o mundo de si mesmo e dos outros e de deixá-los seguirem livremente.

A escrita de Byung-chul Han observa atentamente aspectos críticos de nossos tempos que muitas vezes ignoramos ou dos quais não temos consciência e investiga suas raízes por meio de frases provocativas que são curtas e concisas como aforismos, mas que atingem o âmago das nossas reflexões.

? É um livro difícil como uma adaga que perfura a lâmina do pensamento com uma prosa afiada. O que foi escrito aqui é profundo com um estilo de escrita gritantemente inacessível, mas não impossível de ser compreendido.

? É um pequeno livro filosófico, cheio de significados profundos que lida com as consequências da modernidade sobre o amor, sua representação e sua simplificação em uma forma sexual ?pornográfica?, e a eliminação do significado moral na ótica do amor para se tornar significado material (consumismo), limitado às relações sexuais.

? Estamos essencialmente desumanizando e consumindo uns aos outros por meio de um comportamento hedonístico. Objetificação dos outros como objetos sexuais tal qual a pornografia (um antagonismo do Eros e da desritualização do amor), nos revela quais os meios modernos de comunicação que não estão dando espaço para a imaginação.

? Sua densidade informacional, especialmente visual, leva ao oposto disso, ou seja, a sufoca. A super-realidade nunca é propícia à imaginação como tal, a pornografia, que maximiza a informação visual, destrói a imaginação erótica.

? O texto é ágil, nos tentando explicar em termos lógicos um argumento tão complexo sobre o amor moderno; nem acho que seja possível e, mesmo o autor às vezes, se rende diante de seu mistério.

???????????????????
Robremir 27/09/2024minha estante
As filosofias contemporâneas sobre o amor são muito interessantes. Byung-Chul Han escreveu sobre praticamente todos os aspectos da sociedade, e ele é bem certeiro, mas um pouco negativista.Acho o Alain de Botton mais leve e positivo.


Craotchky 27/09/2024minha estante
Seu texto, Pettrus, além de ser uma bela resenha, é sobretudo uma grande reflexão sobre o tema, apresentando ideias que provocam e questionam. Como sempre, seu texto está fantástico!


mpettrus 27/09/2024minha estante
Esse foi o primeiro ensaio do Byung-Chul Han que li, Robson.

Pretendo ler sim os outros que ele já escreveu.

Ainda não li nada escrito pelo Alain de Botton. Agora fiquei curioso para ler as teorias filosóficas desse escritor.
Obrigado pela interação ??


mpettrus 27/09/2024minha estante
Filipe, meu querido skoober, muitíssimo obrigado pelo seu feedback.

??????




Dyllan.Johnny 29/07/2024

A percepção só pode ser concluída num repouso contemplativo
De maneira geral, achei o livro bom. Uma das partes que mais me chamou a atenção foi a explicação sobre como, nessa sociedade acelerada, o indivíduo obcecado por desempenho acaba sendo mestre e escravo de si mesmo - ?O apelo à motivação é mais eficaz do que o próprio chicote que escraviza.?

Outro ponto interessante é a discussão sobre como o excesso de informação faz com que as fantasias sejam extintas. Por estarmos sempre avaliando nossas relações, nunca nos permitimos sentir verdadeiramente.

No entanto, algumas coisas me incomodaram. O excesso de citações de outros autores é uma delas. Embora compreenda a intenção, achei que isso tornou a leitura um pouco cansativa. Além disso, tive dificuldade em entender o autor em certos momentos, e várias partes do livro ficaram confusas. Isso me fez sentir que o livro se assemelha mais a um texto acadêmico do que a um livro informativo e para entreter.
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Ana 30/04/2020

Aviso de antemão que esse livro é de compreensão difícil e exige muito do esforço do leitor. A linguagem é extremamente formal, técnica e o conteúdo é embasado em pensadores como Nietzsche, Hegel, Bataille, Baudrillard e alguns outros. Não é um livro para quem está em cima do muro, e muito menos para iniciantes. A escrita faz o cérebro se contorcer como um pano de chão.

Nesta obra, Byung-Chul Han traz à tona o olhar ao outro.
O outro, segundo Han, é um atopo, ou seja, uma criatura sem lugar que se torna alvo da nossa mania de comparação entre tudo e todos. Para ele, a "negatividade do outro atópico" é retraída, anulada frente ao consumismo massivo que temos hoje. Com isso, entende-se que nós consumimos o outro indivíduo como se este fosse um alimento para o nosso narcisismo. Para o autor, o problema em fazer isso é que paramos de enxergar o outro e toda alteridade, todo o conteúdo que ele carrega. As identificações, o famoso "match" entre as pessoas para de acontecer, e isso torna as relações cada vez mais superficiais, visto que, só enxergamos no outro aquilo que temos em si. Logo, relacionamentos da modernidade líquida não fazem mais tanto sentido.

É interessante comentar, também, que Byung-Chul vê a depressão como uma crise narcísica, pois, o indivíduo está tão mergulhado em si, nos próprios problemas e na própria falta de controle sobre a vida, que vira uma espécie de depressivo-narcisista. Assim fica esgotado, cansado de si mesmo, e essa mesma ausência de amor próprio faz com que as outras pessoas não queiram dar abrigo a esse enfermo. Nisso, quando se ama alguém nesse estado, o Eros se sobrepõe e vence a depressão, justamente porque "o Eros arranca o sujeito de si mesmo e o direciona para o outro".

Noutro ponto, o autor comenta acerca da depressão do sucesso que, voltada para a produtividade, força o sujeito a se colocar no ponto mais intenso do próprio desempenho. É assim que surge o pensamento envolta da exploração e da autoexploração. Han, aqui, é super inovador ao reparar que a autoexploração é a nova forma de exploração do século XXI. Na Era dos Coachs, a motivação é o combustível que alimenta o movimento do mundo e, enfim, a globalização. Neste sentido, ele cita Foucault e o pensamento neoliberal que transforma o sujeito num "empreendedor da liberdade" dentro do sistema de Estado mínimo. Isso justifica o que leva os novos empreendedores a trabalharem 16h/dia, sem dó de se autoexplorar. Porque o indivíduo sente o gosto da falsa liberdade: faz o próprio horário, trabalha quando quer e aonde quer. Só não consegue perceber com clareza que não consegue resistir a tamanha autocoerção, o que, ao fim, é pior que se fosse explorado pelo outro. Não há nenhuma forma de resistência com essa pressão que vem de dentro.

Dessa forma, Han culpa o Capitalismo por tais acontecimentos, pois este age como um agente inculpador. Alguém em que não se pode colocar a culpa e que não pode livrar o outro da sua própria culpa. Toda essa agonia do Eros vem com apenas um objetivo: aumentar o consumismo. Por isso Byung fala, ainda, do consumo dos sentimentos, emoções, corpos, fazendo alusão às artes e à pornografia - que substitui o Eros por sexualidade.

Em suma, o livro trata do Eros - Deus da paixão, amor e erotismo na mitologia grega - em relacionamentos atuais sob a ótica do consumismo, que oriunda inicialmente do capitalismo e caminha através do neoliberalismo. Entende-se que o enxame de informações tira a nossa atenção ao que realmente é necessário: o ato de amar o outro. É neste ponto que o nome do livro "A Agonia do Eros" faz morada. É um ótimo livro. A leitura é essencial.

Abaixo, os grifos que achei interessante destacar:

1. Sócrates enquanto amante, chama-a de atopos. O outro que eu desejo (begehre) e me fascina é sem-lugar. Ele se retrai à linguagem do igual: “Enquanto atopos, o outro abala a linguagem: não se pode falar dele, sobre ele; todo e qualquer atributo é falso, doloroso, insensível, constrangedor [...]". (p. 6)

2. A cultura atual da comparação constante não admite a negatividade do atopos. Estamos constantemente comparando tudo com tudo, e com isso nivelamos tudo ao igual, porque perdemos de vista justamente a experiência da atopia do outro. (p. 6)

3. A negatividade do outro atópico se retrai frente ao consumismo. (p. 6)

4. O narcisismo não é um amor próprio. O sujeito do amor próprio estabelece uma delimitação negativa frente ao outro em benefício de si mesmo [...] Ele não consegue perceber o outro em sua alteridade e reconhecer essa alteridade. Ele só encontra significação ali onde consegue reconhecer de algum modo a si mesmo. (p. 7)

5. A depressão é uma enfermidade narcísica. O que leva à depressão é uma relação consigo mesmo exageradamente sobrecarregada e pautada num controle exagerado e doentio. (p. 7)

6. O sujeito depressivo-narcisista está esgotado e fatigado de si mesmo. Não tem mundo e é abandonado pelo outro. Eros e depressão se contrapõem mutuamente. O eros arranca o sujeito de si mesmo e direciona-o para o outro. A depressão, ao contrário, mergulha em si mesma. (p. 7)

7. O sujeito de hoje, voltado narcisicamente ao desempenho, está à busca de sucesso. Sucesso e bons resultados trazem consigo uma confirmação de um pelo outro. Ali, o outro, que é privado de sua alteridade, degrada-se em espelho do um, que confirma a esse em seu ego. Essa lógica de reconhecimento enreda o sujeito narcisista do desempenho de forma ainda mais profunda em seu ego. Com isso, vai se criando uma depressão do sucesso. (p. 7)

8. O eros, ao contrário, possibilita uma experiência do outro em sua alteridade, que o resgata de seu inferno narcisista. Ele dá curso a uma denegação espontânea do si mesmo, um esvaziamento voluntário do si mesmo. (p. 7)

9. O eros vence a depressão. (p. 8)

10. A depressão se apresenta como impossibilidade do amor. Ou o amor impossível leva à depressão. (p. 8)

11. A partir de um determinado ponto da produtividade, o dever se choca rapidamente com seus limites. É substituído pelo verbo poder para a elevação da produtividade. (p. 12)

12. O apelo à motivação, à iniciativa e ao projeto é muito mais efetivo para a exploração do que o chicote ou as ordens. (p. 12)

13. A autoexploração é muito mais eficiente do que a exploração alheia, pois caminha de mãos dadas com o sentimento de liberdade. É possível, assim, haver exploração, mesmo sem dominação. (p. 12)

14. Foucault refere-se ao neoliberalismo afirmativamente. De forma acrítica, ele admite que o regime neoliberal, enquanto “sistema do estado mínimo”, possibilita a liberdade do cidadão enquanto “empreendedor da liberdade”[6]. (p. 12)

15. É bem verdade que a Ética do si-mesmo de Foucault se opõe ao poder político repressivo, contra a exploração alheia, mas torna-se cego para ver aquela violência da liberdade que está na base da autoexploração. (p. 13)

16. O tu podes exerce inclusive mais coerção do que o tu deves. (p. 13)

17. A autocoerção é muito mais fatal do que a coerção alheia, pois não é possível haver nenhuma resistência contra ela. Por trás da aparente liberdade do indivíduo singular, o regime neoliberal escode uma estrutura coercitiva; a partir daí o indivíduo passa a não mais compreender a si mesmo como sujeito submisso (subject to) mas como projeto lançado. É nisso que está sua astúcia. Quem fracassa, além do mais, acaba sendo culpado por seu fracasso. Não há ninguém que possa ser responsabilizado por seu fracasso. Tampouco existe qualquer possibilidade de desculpas ou de expiação. Com isso não surgem apenas as crises de culpa mas também as crises de gratificação. (p. 13)

18. O capitalismo não é uma religião, pois cada religião opera com culpa e desculpa. O capitalismo só é inculpador. Não dispõe qualquer possibilidade de expiação, que pudesse livrar os culpados de sua culpa. (p. 13)

19. A depressão representa um fracasso sem salvação e insanável no poder, isto é, uma insolvência psíquica. Insolvência significa, literalmente, a impossibilidade de liquidar a dívida e a culpa (solvere). (p. 13)

20. Se fosse possível possuir, apreender e reconhecer o outro, o outro não seria o outro. Possuir, reconhecer e apreender são sinônimos de poder”. (p. 14)

21. O corpo, com seu valor expositivo equipara-se a uma mercadoria. O outro é sexualizado como objeto de excitação. Não se pode amar o outro, a quem se privou de sua alteridade; só se poderá consumi-lo. (p. 14)

22. Hoje está se perdendo cada vez mais o decoro, a respeitabilidade, a distância, isto é, a capacidade de experimentar o outro em sua alteridade. (p. 14)

23. A proximidade é uma negatividade no sentido de que nela está inscrita uma distância. (p. 15)

24. Hoje em dia, o amor é positivado numa fórmula de fruição. Ele precisa gerar sentimentos agradáveis. Ele não é uma ação, uma narração, nem sequer é mais um drama; antes, não passa de emoção ou excitação inconsequente. (p. 15)

25. A sociedade do desempenho, dominada pelo poder, onde tudo é possível, onde tudo é iniciativa e projeto, não tem acesso ao amor enquanto vulneração e paixão. (p. 15)

26. O princípio do desempenho não se coaduna com a negatividade do excesso e o exagero. Assim, dentre as “convenções” a que se submete o sujeito da submissão, sub-estão: praticar muito esporte, alimentos sadios, dormir suficientemente. É proibido inclusive comer entre as refeições alguma outra coisa que não sejam frutas. O sub precisa inclusive deixar de lado o consumo exagerado de álcool e não pode fumar nem consumir drogas. A própria sexualidade precisa submeter-se a um mandamento da saúde. Fica proibida qualquer forma de negatividade. Fazem parte igualmente da lista das proibições o uso de excrementos. Elimina-se também a negatividade da sujeira simbólica ou real. Assim, o protagonista se comprometa a “ser por todos os tempos limpinho, depilado e lisinho”. (p. 15)

27. Nesse mundo da positividade só são admitidas coisas que são consumidas. A própria dor precisa ser consumível. (p. 16)

28. A memória não é um mero órgão de mera recomposição, com o qual presentifica-se o que já passou. Na memória, o passado se modifica constantemente. É um processo progressivo, vivo, narrativo. (p. 16)

29. A alteridade não é uma diferença consumível. O capitalismo vai eliminando por toda parte a alteridade a fim de submeter tudo ao consumo. (p. 17)

30. O eros é uma relação assimétrica com o outro. Assim, ele interrompe a relação de troca. (p. 17)

31. Segundo Vicino, o amor é a “pior das epidemias”. Ele é uma “transformação”. Ele “desapropria as pessoas de sua própria natureza e as transfere para uma natureza estranha”[20]. Essa transformação e vulneração perfaz sua negatividade. (p. 19)

32. Em seu estudo Konsum der Romantik [Consumo do romantismo], Eva Illouz constata que na atualidade o amor se “feminilizou”. Os adjetivos do tipo “gentil”, “íntimo”, “calmo”, “confortável”, “doce” ou “suave”, com os quais se costumam descrever cenas de amor romântico, são plenamente “femininos”. (p. 20)

33. Onde se santifica o mero viver, a teologia dá lugar à terapia. Ou então a terapia torna-se teológica. (p. 21)

34. O sujeito da autoexploração não é livre do mesmo modo que o sujeito da exploração alheia não é livre. (p. 21)

35. O capitalismo absolutiza o mero viver. O bem viver não é seu telos. Sua gana por acumulação e crescimento se volta contra a morte, que se lhe afigura como perda absoluta. (p. 21)

36. Para Aristóteles, a pura aquisição de capital é perniciosa porque não é uma busca pelo bem viver, mas apenas uma busca do mero viver: “Por isso, muitas pessoas imaginam que esta seria a tarefa da economia ou administração da casa, e defendem reiteradamente a ideia de que se deve acumular bens monetários ou multiplicá-los infinitamente. A razão para pensarem assim é o esforço laborioso por viver, mas não para bem viver”. (p. 21)

37. O sujeito narcisista-depressivo não é capaz de tirar conclusão [...] Não é por acaso que a indecisibilidade, inconclusividade, a incapacidade para a decisão pertence essencialmente aos sintomas da depressão. (p. 23)

38. Numa sociedade na qual cada um é o empresário de si mesmo vigora uma economia do sobreviver. (p. 24)

39. O neoliberalismo, com seus impulsos do eu e de desempenho desenfreados, é uma ordem social da qual o eros desapareceu totalmente. (p. 24)

40. O que simplesmente sobrevive se parece com um morto-vivo, que é por demais morto para viver e que é por demais vivo para poder morrer. (p. 25)

41. A pornografia tira sua força de atração da “antecipação do sexo morto na sexualidade viva”. (p. 27)

42. O obsceno na pornografia não reside no excesso de sexo, mas no fato de não ter sexo. (p. 27)

43. A musealização e exposição das coisas aniquila precisamente seu valor cultural em favor do valor expositivo. (p. 28)

44. O capitalismo acentua a pornagrifização da sociedade, expondo e exibindo tudo como mercadoria. Ele não conhece nenhum outro uso da sexualidade. Profana o eros em pornografia. (p. 29)

45. ”. A falta de informações levaria a “supervalorizar a alguém”, “atribuir-lhe uma mais-valia” ou a “idealizá-lo”. (p. 31)

46. Responsável pela crescente desilusão na sociedade de hoje não é tanto o aumento da fantasia, mas, supondo haver esse fenômeno, a alta expectativa. (p. 33)

47. Sem a negatividade dos umbrais, sem a experiência do umbral, a fantasia fenece. (p. 35)

48. A crise atual da arte e também da literatura pode ser reduzida à crise da fantasia, ao desaparecimento do outro, ou seja, à agonia do eros. (p. 35)

49. A alma impulsionada por eros produz coisas belas e sobretudo ações belas, que possuem um valor universal. Essa é a doutrina platônica de eros. (p. 37)

50. O neoliberalismo aciona uma despolitização geral da sociedade onde ele, não por último, substitui o eros por sexualidade e pornografia. (p. 37)

51. O pensamento sem eros é meramente repetitivo e aditivo. E o amor, sem eros, sem seu impulso espiritual, degenera em “mera sensorialidade”. Sensorialidade e trabalho pertencem à mesma ordem. Eles não têm espírito nem cupidez. (p. 41)

52. Em virtude da crescente massa de informações e dados, hoje as teorias são muito mais necessárias do que antigamente. Elas impedem que as coisas se misturem e proliferem. Eles reduzem a entropia. (p. 43)

53. A massa de informações de hoje[...] atua de modo deformativo. (p. 43)

54. O pensamento necessita de silêncio. É uma expedição para o silêncio. (p. 43)

55. Em Platão, eros é chamado de philosophos, amigo da verdade. O filósofo é um amigo, um amante. Esse amante não é, porém, uma pessoa exterior, não é uma circunstância empírica, mas “uma presença íntima no pensamento, uma condição de possibilidade do próprio pensar, uma categoria viva, uma vivência transcendental”. (p. 44)
Mindú 31/12/2021minha estante
Nossa, achei super de boa, mesmo eu tendo mto pouco embasamento em filosofia


Lucas Kayzan 03/01/2023minha estante
Muito boa essa resenha.


Ingrid1263 23/03/2023minha estante
Fiquei com vontade de ler. Resenha perfeita!


hulda.barros 26/03/2023minha estante
Perfeito! ??


Maya 04/10/2023minha estante
Resenha maravilhosa!




MatheusPetris 24/01/2023

O autor acredita que a tese de o amor estar acabando pelo fato da nossa quase liberdade absoluta de escolhas — somado ao excesso de opções dos quais, inclusive, somos coagidos por um sistema homogeneizante —, não considera o principal motivo do sufocamento do amor: o desaparecimento do outro, sua total erosão. Ou seja, não se trata da aparente heterogeneidade da oferta do outro, mas de como ele é “visto”.

Nosso narcisismo chegou às raias de procurarmos no outro, exclusivamente, nós mesmos. Como a sociedade vem impondo o nivelamento do igual (sempre por meio de comparações), a homogeneização de todos, essa condição só se intensifica. Com isso, já não nos encontramos mais com a experiência erótica.

Sendo a alteridade o pilar da experiência erótica, ela se realiza com o outro para além dos ditames do desempenho e do poder. Todavia, o amor e o Eros foram raptados pela sociedade do desempenho, que também os instrumentalizou. O outro é coisificado, objeto sexual; o sexo é desempenho, é relação de poder. Isto é, essas relações impedem que o outro seja alguém, ele é apenas um traço desse alguém.

O obsceno, a nudez niquelada, de vitrine, dissipa o mistério e, consequentemente, o Eros. Se para Agamben a profanação é a retirada dos deuses do olimpo, quando aquilo que é sacro se torna terreno, de uso comum, é exatamente isso que faz a profanação com o Eros: o transforma em pornografia. E, como a pornografia profana o erotismo, dissipa e massacra sua força, deixamos de vislumbrar o outro. Já não mais importa o outro, apenas nosso eu narcísico. Em uma sociedade que venera a palavra “alteridade”, poucos vivenciam esse conceito. O outro que procuramos, é aquele exposto nos aplicativos de encontro, deslizamos para o lado: sim e não. Buscamos a nós mesmos. Já não aceitamos o outro negativo, o diferente.

O Eros produz ações belas, de caráter universal. O pressuposto de algo universal é que existe um nós. Ou seja, se o Eros é o aniquilado, o “nós” também o é. Se “o amor é um palco de dois” e “interrompe a perspectiva do um e faz surgir o mundo a partir do ponto de vista do outro ou do diverso”, é por meio dessa transformação, a causada pelo amor, que se propõe uma política do Eros. Enquanto o sujeito sexual, o pornográfico, que só se preocupa consigo mesmo, contribuindo para a “narcisização de si mesmo”, aqueles que buscam um diálogo entre arte e política a encontram no amor, tal como nos disse Breton, “A única arte digna do homem e do espaço, a única capaz de conduzi-lo ainda mais do que as estrelas [...] é o erotismo” (p. 80). Para o surrealismo, o Eros é como um meio de se alcançar “uma revolução poética da linguagem e da existência”.

Partamos deste princípio, ainda há tempo de salvarmos o erotismo. Sem o erotismo, como pensar? Como nos diz Byung-Chul Han: “Sem Eros, o pensamento perde toda e qualquer vitalidade, toda inquietação e se torna repetitivo, reativo”. O pensamento não pode surgir pelo mero acúmulo de dados (informações), ele deve surgir como o bater de asas do Eros.
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Paula.Moreira 28/03/2021

Eros 101
Esse livro tem muitas semelhanças com a "Sociedade do Cansaço". Ao mesmo tempo que achei ele muito interessante, acredito que me falte repertório para uma compreensão mais aprofundada. O proposto é de que existe um desgaste do Eros. Para que o amor exista, é necessário o reconhecimento do outro. A partir do momento que a nossa sociedade caminha para uma dinâmica cada vez mais positivista, os limites de nós mesmos vão sendo apagados. A consequência acaba sendo o desaparecimento do outro, do diferente. A sociedade atual estaria trabalhando uma dinâmica narcisista em que a o outro é apenas uma ramificação de vc mesmo.
Luisa.Castro 28/03/2021minha estante
Boa resenha


Paula.Moreira 29/03/2021minha estante
Obrigada, luli!




Kaique.Furquim 19/12/2023

Agonia do Eros
O autor faz uma boa análise da sociedade, e aborda vários temas necessários que colidem com o cotidiano de jovens imersos no mundo da Internet, no do narcisismo, da pornografia e no falso amor que é vendido. O livro é extremamente necessário, de fácil leitura e muito revelador.
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GuiB. 10/09/2021

"Amar é o esvaziamento do 'eu'"
Agonia do Eros reflete sobre como o amor, o erotismo e as relações são influenciados (e ausentes) na sociedade de desempenho, em que vivemos.

Basicamente, o sujeito de desempenho está tão imerso em si que é incapaz de se interessar verdadeiramente pelo outro, de admirá-lo. Vemos, especialmente em redes sociais, um completo narcisismo e admiração do "eu".
O autor também discorre sobre como o neoliberalismo nos transformou em produtos e quanto influencia essa "vaidade".

É um livro curto, gostei de muitas ideias levantadas. O autor invoca algumas referências durante o livro e argumenta sobre elas, penso que pode ser melhor aproveitado se conhecê-las. No entanto, ainda é perfeitamente entendível sem conhecê-las. O livro conversa muito com Sociedade do Cansaço, também de Byung-Chul Han.
Recomendo a leitura.
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Caroline J. 03/12/2020

Erros de tradução na edição
O livro é fantástico e pertinente, gosto demais deste autor. Porém o que vou constar aqui é o fato de que a edição da Editora Vozes contém vários erros de tradução que dificultam a compreensão. Durante a leitura, notei muitas frases estranhas ou sem sentido, ou cujo sentido parecia contrariar o que havia sido dito até então. Consegui o texto em inglês para comparar, e realmente, há várias incidências de má tradução em que o sentido é trocado ou simplesmente deixa o texto desnecessariamente obscuro. Depois de me deparar com várias dessas situações, acabei decidindo terminar de ler o livro no pdf em inglês mesmo, para ter certeza de que iria apreender o significado correto. Fica aqui o aviso para quem for ler a edição em português.

Vou incluir dois exemplos:

Na tradução em português, na página 48, a frase diz: "(...) É antes o dom do outro, que precede a entrega, a tarefa de mim mesmo".
Na tradução em inglês, a frase é: "(...) Rather it is the gift of the Other — preceded by the surrender, the giving up, of one’s own self."
Na frase em inglês, o "dom do outro" é *precedido* pela entrega de si mesmo; na frase em português, ele *precede* a entrega de si mesmo. A frase em inglês faz sentido, em português não (o que seria "a tarefa de mim mesmo"?).

Na página 69, temos: "Assim, a pornografia destrói a informação visual, e como que maximiza a fantasia erótica". Achei estranho pois essa frase diz exatamente o contrário do que estava sendo dito até então, por isso consultei a versão em inglês e...
"As such, pornography — which maximizes visual information, as it were — destroys erotic fantasy."
Ou seja, o sentido deveria ser que a pornografia *maximiza* a informação visual e assim *destrói* a fantasia erótica. Na tradução em português o sentido está invertido!
GuiB. 10/09/2021minha estante
Ótimas observações, realmente não fez sentido ao ler




Guilherme 16/09/2023

Muito bom
Fico cada vez mais impressionado como a leitura dos livros de Byung-Chul Han fluem. Nesse livro ele "passeia" pela relação do Eros que o mundo moderno nos apresenta por diversas vertentes. Vale muito a leitura.
Lua 17/09/2023minha estante
Quero ler!




Vitor 31/07/2020

Eros é conhecimento
Para Byung Chul o eros vai além do amor romântico, ele se manifesta como motor da criativade humana e também como antagonista da depressão, já que "o eros vence a depressão". O eros é conhecimento pois obriga uma mudança de perspectiva constituída junto ao outro, ele busca um propósito de bem comun. O capitalismo diferentimente do eros não possui um propósito, e com o mercadorização de todos dos setores de nossa vida e a sexualização do eros está gerando uma crise criativa e psicológica.
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Dudah24 11/12/2023

O fim da minha agonia
Gente do céu, não aguentava mais esse livro me encarando pra ler ele logo,pqp ein faculdade. Pedir pra gente ler Percy Jackson ninguém pede -_-

Mas até que ele tinha algumas citações interessantes (quando eu entendia o que ele estava falando)
cachorro chupetão 11/12/2023minha estante
faculdade de q


Dudah24 11/12/2023minha estante
Audiovisual/cinema e afins




Tonton.books 02/05/2024

Agonia de Eros
O livro é curto, direto, cheio de citações e bastante coeso. Vem com temas atuais relacionado com o narcisismo, moldado no contexto neoliberal. O autor reflete sobre o potencial de Eros e da cupidez numa sociedade marcada pelo narcisimo exarcerbado. Narcisismo como repetição de si, que impõe ritmo de produção permanente, seja produção material, seja produção da imagem de si. Faz pensar como esses movimentos produzem uma sociedade que tem muitas dificuldades em reconhecer a alteridade, ou a retração necessária - espaço - para a existencia do outro, condição igualmente necessária nas relações amorosas, por exemplo. Por isso mesmo esse trabalho de reflexão é pontente para (re)pensar não só nossa relação com a sociedade, mas também num nível mais pessoal e intimo.
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kathrein.oliveira 01/04/2021

Reflexivo e complexo
A escrita do autor desses livros é o que mais me desafia, acredito que é por não estar acostumada a ler filosofia.

Nesse livro o autor fala muito sobre amor e erorismo e trouxe muitas reflexões, principalmente ligadas a cultura pop, o que me surpreendeu muito.

Em termos de preferência, prefiro o primeiro livro do autor, sociedade do cansaço, que pra mim teve uma linguagem mais fluída, mas esse também é muito interessante.
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Patricia 16/08/2021

Narciso acha feio o que não é espelho
Divagações pós leitura:
Eros seria aquele elemento essencial de cada pessoa que se aplica à outra e não pode ser inteiramente contido pelo "eu".
Em um mundo narcisista, pelo qual só reconhecemos quem nos serve de espelho, já não mais nos encontramos.
E se não reconhecemos a outra pessoa como sendo outra, nos tornamos alheios ao amor.
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